Valor econômico, v. 19, n. 4617, 25/10/2018. Brasil, p. A9

 

Governo vence disputa sobre MP do Rota 2030

Raphael Di Cunto

25/10/2018

 

 

Numa vitória do governo Michel Temer, a comissão do Congresso que analisa a medida provisória (MP) do Rota 2030 (nova política de incentivo à indústria automotiva) aprovou ontem a proposta em sua versão original, sem as alterações defendidas por montadoras e pelo relator, o deputado Alfredo Kaefer (PP-PR). A única concessão, que contraria a posição da equipe econômica, é a prorrogação dos regimes automotivos de Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

Kaefer tentou, a pedido das montadoras, ampliar os incentivos para pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos produtos e tecnologias, com aumento no valor dos créditos gerados e a possibilidade de abatimento de todos os impostos, mas acabou convencido pelo governo de que isso colocaria em risco todo o programa.

As empresas queriam um benefício maior, mas, diante do risco de ficarem sem nada, aceitaram os termos do Executivo. "Na nossa visão, o incentivo poderia ser um pouco maior sem comprometer o Orçamento, mas foi decisão do governo de que não haveria espaço fiscal para isso", lamentou o presidente da Associação Nacional dos. Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale.

O Rota 2030 substitui o Inovar-Auto, antigo regime automotivo brasileiro condenado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) no ano passado, e define as regras para fabricação de veículos no país pelos próximos 15 anos, como metas de eficiência energética e itens de segurança. O programa ainda concede créditos tributários para quem investir em P&D e reduz impostos de importação, o que fará o governo federal deixar de arrecadar cerca de R$ 2,1 bilhões por ano.

Além de aumentar os incentivos fiscais, o relator pretendia tornar obrigatória uma inspeção anual e desonerar o IPI para carros híbridos, com motor a etanol e elétrico. Tudo isso, contudo, saiu do texto final após pressão do governo.

A MP precisa ser aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado até 16 de novembro para não perder a validade. Temer, contudo, quer tudo aprovado até o dia 8 para poder sancionar a MP na abertura do Salão do Automóvel.

Por outro lado, a disputa entre Fiat Chrysler Automobiles (FCA), que tem fábrica em Pernambuco, e a Ford Motors, com unidades na Bahia e Ceará, em torno da prorrogação do regime automotivo do Nordeste terminou num acordo após o governo aceitar um impacto fiscal maior. A equipe econômica queria limitar os crédito gerados ao IPI, o que deixaria a Ford em desvantagem em relação à Fiat, que produz veículos mais caros e potentes na região, que pagam mais IPI e, por isso, teria um desconto maior.

Ontem, o governo autorizou uma emenda que prorrogará por cinco anos o programa, que acabaria no fim de 2020, e contemplará as duas empresas, com a permissão para que usem os créditos para compensar todos os impostos federais, além de não exigir que os investimentos ocorram em novos modelos - o que prejudicaria a Ford, sem previsão de lançar veículos no curto prazo. Procurada, a Receita não informou o impacto que isso terá na arrecadação.

Para o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), a emenda, embora prorrogue o programa, atende à demanda fiscal porque reduzirá os incentivos em cerca de 44%. Ele também destaca que uma mudança nas regras restringirá a compensação dos créditos aos impostos devidos pelas fábricas do Nordeste - as duas empresas, portanto, não poderão usá-los para reduzir os custos de suas unidades em São Paulo e Minas Gerais.

Por mais apoio para manter o acordo no plenário, também foram prorrogados, com as mesmas regras, os regimes automotivos do Norte e Centro-Oeste (onde estão montadoras como Hyundai e Mitsubishi).

Kaefer ainda incorporou ao parecer dois "jabutis" (assuntos que não estão relacionados ao tema da medida provisória) que o governo avisou que vetará: reabertura do programa de parcelamento de dívidas tributárias (Refis) e volta do Reintegra, regime tributário especial para exportadores.

Outra emenda, que reinclui as empresas do setor moveleiro e de comércio varejista de calçados e artigos de viagem na desoneração da folha de pagamento, será avaliada pela Fazenda. O quarto jabuti teve o aval do governo e garantirá incentivos fiscais para fábricas de triciclos e quadriciclos da Zona Franca de Manaus.

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País exporta 10% mais este ano, apesar da onda protecionista, diz Mdic

Assis Moreira 

25/10/2018

 

 

Apesar da onda protecionista no cenário internacional, o Brasil fechará o ano com aumento de 10% das exportações e o segundo maior superávit da balança comercial desde 1989, segundo o secretário de Comércio Exterior do Mdic, Abrão Neto.

Conforme o secretário, as exportações cresceram 9,7%, e as importações, 20,8%, em valor no ano até a terceira semana de outubro, comparadas a 2017.

Assim, pelo ritmo das vendas externas, Abrão Neto acredita que as exportações fecharão em torno de US$ 240 bilhões em dezembro. O valor ainda é inferior aos US$ 256 bilhões exportados pelo país em 2011.

A corrente de comércio aumenta porque as importações subiram. As compras externas chegaram a US$ 145,7 bilhões até a terceira semana de outubro e devem continuar aumentando até o fim do ano, ilustrando retomada de certos investimentos do setor privado. Mas não devem alcançar o recorde de US$ 239,6 bilhões registrado em 2013.

O saldo comercial acumulado de US$ 48,9 bilhões até agora está 14% menor do que em 2017, ano em que teve recorde de US$ 67 bilhões, mas será ainda assim o segundo maior desde o início da série histórica elaborada pelo Mdic.

"O superavit é menor, mas significa que o comércio exterior está movendo mais a economia", afirma o secretário do Mdic. "Houve tanto alta de preços como aumento de quantidade nas exportações."

Abraão Neto, que participa em Genebra do Fórum Mundial de Investimentos, promovido pela Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), destaca a expansão das exportações de bens básicos e de bens manufaturados.

Neste ano, o país tem uma pequena queda na produção de petróleo, mas a exportação do produto cresceu. E bate recorde nos embarques de soja e de minério de ferro.

Desde o ano passado o comércio exterior ganhou mais espaço das empresas, diante da situação interna, e elas investiram nesse sentido, acrescentou. Ele diz que o governo fez de seu lado um "esforço monumental" de facilitação de comércio. A partir da metade do ano, todas as exportações acontecem pelo portal único, reduzindo a burocracia.

Conforme o secretário, em alguns casos o ambiente de guerra comercial resultou em ganhos setoriais para o Brasil, mas no acumulado ela é considerada negativa para os interesses do país.

A soja brasileira recebeu preço adicional no mercado chinês, depois que Pequim sobretaxou o produto originário dos EUA. Mas a mensagem do Brasil é de que é mais importante ter um comércio previsível e equilibrado. Até porque o mercado brasileiro pode sofrer com o desvio de comércio, na medida em que um país que teve o acesso reduzido em outros mercados vai procurar novos compradores.

A situação está sendo monitorada e o governo constata que até agora não absorveu esse excesso de mercadorias que não conseguem entrar nos EUA ou na China, por causa da briga entre os dois, por exemplo.

Outro efeito da guerra comercial é que a concorrência aumenta para as exportações brasileiras em terceiros mercados, nota Abrão Neto.

A dinâmica do comércio exterior brasileiro contrasta com a desaceleração prevista para o comércio mundial em meio à escalada de tensões entre grandes parceiros. A Organização Mundial do Comércio (OMC) projeta expansão de 3,8% das trocas globais em 2018. A estimativa é de crescimento em volume, mas nota que o comércio calculado em dólares também é relevante. De toda maneira, é preciso notar que o crescimento nominal deve ser visto com cautela, podendo ser fortemente influenciados pelos preços e pelas taxa de câmbio.

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Brasil e mais 12 da OMC fazem alerta sobre comércio global

Assis Moreira 

25/10/2018

 

 

Um grupo de 13 membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), incluindo o Brasil, reunido nesta quinta-feira em Ottawa (Canadá), dará uma forte mensagem política de que estão preocupados com a escalada de tensões no comércio global e dispostos a buscar soluções.

O encontro terá a participação de ministros do Comércio de Austrália, Brasil, Chile, Coreia do Sul, Japão, Quênia, México, Nova Zelândia, Noruega, Cingapura, Suíça, União Europeia e o anfitrião Canadá. Na prática, estarão presentes ministros representando 40 países, com a UE falando por seus 28 sócios.

Os EUA e a China, os dois principais beligerantes e maiores economias do mundo, não foram convidados. A ideia canadense foi de reunir um grupo de países com posições semelhantes sobre a importância de preservar o sistema multilateral de comércio. A Índia não está na lista dos convidados.

A montagem de um pacote para aperfeiçoar a OMC é um dos pontos centrais da agenda, além de medidas para monitoramento no comércio e de desbloqueio das nomeações de juízes para o Órgão de Apelação, espécie de corte suprema do comércio global.

Para o Brasil, o mais urgente é encontrar uma solução ao impasse provocado pelos EUA na nomeação dos árbitros para o Órgão de Apelação. O mecanismo para resolver contenciosos corre o risco de paralisar o sistema multilateral como um todo.

Para o Brasil, é urgente uma solução. O país não se furta a discutir qualquer preocupação que for colocada por um membro, diz uma fonte brasileira. O Brasil é representado pelo ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, acompanhado do subsecretário de assuntos econômicos do Itamaraty, embaixador Ronaldo Costa, e do novo embaixador junto à OMC, Alexandre Parola.

Não será ainda desta vez que o grupo vai definir um pacote para reforma ou aperfeiçoamento da OMC. Todos sabem que será preciso aprofundar os debates para equilibrar diferentes interesses. Os países precisam calibrar inclusive a linguagem. Enquanto alguns falam em reforma da OMC, o Brasil acha que isso pressupõe que o sistema multilateral está caindo pelos pedaços e considera que não é o caso - o país prefere falar de melhoras no seu funcionamento.

Em 6 de novembro, a França também organizará um encontro de alto nível com vários países para discutir uma revitalização do sistema multilateral, uma maneira de evitar que os EUA abandonem a organização ou continuem a minar suas regras.

No fim de novembro, os chefes de Estado e de governo do G-20 (reúne grandes economias desenvolvidas e emergentes) poderão tomar alguma decisão sobre os rumos do que pode ser mudado na OMC.