O globo, n. 31300, 18/04/2019. Economia, p. 17

 

Em busca de mais apoio à Previdência

Marcello Corrêa

Geralda Doca

18/04/2019

 

 

Guedes oferece antecipar até R$ 6 bi a estados para ampliar aprovação à reforma

Após uma semana em que acumulou derrotas na articulação da reforma da Previdência, o governo acenou a governadores e parlamentares com um pacote de bondades, na expectativa de conseguir mais apoio à proposta. Para estados, o ministro da Economia, Paulo Guedes, ofereceu ontem antecipar até R$ 6 bilhões do dinheiro que deve ser arrecadado no megaleilão de petróleo no pré-sal, referente ao excedente da chamada cessão onerosa (contrato em que a União cedeu à Petrobras o direito de explorar seis blocos na Bacia de Santos). O repasse só ocorrerá se a reforma ganhar fôlego no Congresso. Em paralelo, a equipe econômica trabalha para garantir recursos para que deputados toquem obras em suas bases. O plano, segundo fontes, envolve liberação de até R$ 30 milhões em créditos extraorçamentários para líderes de partidos.

Guedes já pretendia compartilhar o dinheiro do petróleo com estados, mas ontem foi a primeira vez que o ministro falou em fazer os repasses antes da realização do certame, previsto para outubro. A medida se somaria ao plano de equilíbrio financeiro que prevê a liberação de R$ 10 bilhões em empréstimos com aval da União para entes que apresentarem propostas de ajuste fiscal e à ajuda do governo federal nos processos de privatização de estatais estaduais.

Questionado se essa antecipação seria com recursos da União, o ministro afirmou que a ajuda só sairia do papel se as reformas andassem, o que abriria espaço fiscal.

— Estamos estimando já, no mínimo, R$ 4 bilhões, podendo chegar a R$ 6 bilhões, uma possível antecipação (do megaleilão). Estamos estudando. O (Plano) Mansueto é garantido. A privatização é garantida. A antecipação de uma cessão onerosa estamos estudando, porque depende da capacidade de antecipação das reformas. Sem as reformas, a União também está em dificuldades, e aí é um abraço de afogados. Estamos estudando (...) e já guardando recursos para liberar, caso a coisa indique que vai ser tudo aprovado e estamos andando bem — afirmou o ministro, após um encontro com o Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Segundo um integrante da equipe econômica, antecipar a divisão do dinheiro do petróleo deve motivar os governadores a mobilizarem suas bancadas na Câmara em favor do projeto, que está emperrado. Ontem, a votação da reforma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi adiada. Após pressão da oposição e de partidos do centrão, o relator do texto, Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), anunciou que alteraria seu parecer, que inicialmente recomendava a aprovação da proposta na íntegra.

Inexperiência de deputados

É por isso que o governo também estuda um aceno aos parlamentares. Diante da resistência do centrão, a ala política do governo negocia com a equipe econômica a liberação de recursos extraorçamentários para líderes partidários e integrantes da CCJ. Segundo um interlocutor, a ideia é destinar R$ 30 milhões para os líderes e R$ 10 milhões para membros da CCJ. Seria uma espécie de crédito, explicou a fonte. Os beneficiados poderão entrar em contato com os prefeitos para que eles encaminhem projetos aos ministérios. A verba seria destinada a obras nos redutos eleitorais dos parlamentares nos municípios.

Ao anunciar os planos para atender aos estados ontem, Guedes disse que, apesar da reforma da Previdência ser a principal medida para destravar a economia, foi convencido pela classe política de que outras pautas precisam ser encaminhadas. Ao lado de Alcolumbre, anunciou que o Senado tocaria a proposta do pacto federativo, que prevê descentralização de recursos para os estados. O ministro também minimizou os entraves à aprovação da reforma.

— O ministro Onyx (Lorenzoni, da Casa Civil) esteve conosco aqui um pouco antes. Disse que a coisa estava quase toda acertada e tem esses pequenos desajustes que vêm até da relativa inexperiência. Tem um grupo chegando e tinha um grupo que já estava estabelecido, que conhece mais as práticas regimentais. A coisa do ponto de vista político já estava equacionada. Houve um pequeno resvalo na condução dos trabalhos lá (na Câmara), e a coisa foi para terça-feira. Mas com a expectativa política de que será aprovada — afirmou Guedes.

Guedes comentou ainda que não considera uma boa estratégia fazer concessões no mérito do texto já nesse primeiro momento. Desde o início dos trabalhos, a ideia de integrantes da equipe econômica era deixar essa negociação para a comissão especial, a próxima etapa de negociação da reforma na Câmara.

— Isso (mudar pontos do projeto) é decisão do Parlamento. A única coisa de que fui informado é que, como a comissão é de Constituição e Justiça, não cabe decisão de mérito. A preservação da integridade do projeto, se tiver constitucional, seria o procedimento correto. A hora de fazer política não é dentro da comissão (CCJ). Não seria adequado, mas estou falando sem conhecimento de causa, não sou político. O movimento político é na hora da discussão da comissão especial — destacou o ministro.

“Sem as reformas, a União também está em dificuldades, e aí é um abraço de afogados”

Paulo Guedes, ministro da Economia

“A coisa do ponto de vista político já estava equacionada. Houve um pequeno resvalo na condução dos trabalhos lá (na Câmara), e a coisa foi para terça-feira“

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Governo já aceita ceder em pelo menos 3 pontos do texto

Geralda Doca

Eduardo Bresciani

Bruno Goes

Manoel Ventura

18/04/2019

 

 

Fim da multa de 40% do FGTS na demissão e aumento da idade para aposentadoria compulsória nos tribunais superiores devem cair

Derrotado, ontem, na votação da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o governo aceita ceder em pelo menos três pontos do texto enviado ao Congresso, já na largada da tramitação da proposta. As mudanças foram negociadas, ontem, com o relator, Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), e líderes dos partidos do centrão, e farão parte do novo parecer a ser apresentado por Freitas na próxima semana.

Segundo fontes envolvidas na negociação, ainda na CCJ o governo concordaria em retirar o fim da multa de 40% do FGTS nas demissões sem justa causa e o fim da obrigatoriedade do pagamento da contribuição de 8% para aposentados na ativa. O governo pretende abrir mão também da proposta de descentralizar as ações contra a União e jogá-las para os estados.

O terceiro item que o governo cogita abandonar é a alteração da chamada PEC da Bengala, que aumentou a idade de aposentadoria compulsória nos tribunais superiores de 70 anos para 75 anos. Se aprovada, a medida permitiria, na prática, que o governo indicasse ministros, sobretudo para o Supremo Tribunal Federal (STF), o que elevaria o seu grau de influência na Corte.

Pressão sobre abono

O centrão pressiona também pela retirada da restrição ao abono salarial (PIS), que seria pago a quem ganha apenas um salário mínimo, e não dois, como é hoje. Mas o governo alega que o benefício tem características previdenciárias.

Para garantir a aprovação da reforma, o governo também não descarta uma nova rodada de concessões na comissão especial. São exemplos mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos de baixa renda; nas aposentadorias dos trabalhadores rurais; e nas regras de transição dos servidores públicos, para permitir que eles possam se aposentar com salário proporcional, sem ter de cumprir a fórmula 86/96 (soma de idade e tempo de contribuição).

Os impactos fiscais de cada medida—queajudarãoacompor a economia de R$ 1 trilhão em dez anos —serão apresentados na comissão especial. A orientação da equipe econômica é evitar que as concessões desidratem a reforma.

O centrão espera, ainda, que o governo aponte a retirada de alguns pontos da chamada desconstitucionalização, que permitiria mudanças futuras na Previdência sem precisar de alterações constitucionais.

Embora tenha assegurado quórum na antevéspera do feriado da Páscoa, a sessão de ontem na CCJ foi marcada por tumultos e manobras regimentais por parte da oposição para atrasar os trabalhos. Houve bate-boca e a sessão foi suspensa. Ao ser reaberta, houve o anúncio do adiamento da votação para terça-feira.

—O presidente da CCJ disse que vota terça. É muito importante votar —disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

O resultado pegou a equipe econômica de surpresa e gerou uma série de reuniões ao longo do dia para fechar um acordo sobre as mudanças no texto ainda na CCJ. O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, disse que as alterações não terão impacto fiscal, mas admitiu que novas mudanças poderão ser necessárias na comissão especial:

— Não significa que no mérito não tenhamos que negociar novamente.

No fim da tarde, Marinho chegou a se reunir com líderes partidários. O líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lira (AL) saiu do encontro dizendo que já havia acordo para alterar quatro pontos. Marinho, porém, negou:

— Iniciamos um diálogo. Mas não existe meio acordo. O acordo tem que ser feito por inteiro.