O globo, n. 31260, 09/03/2019. Economia, p. 21

 

Otimismo com Previdência faz Bolsa subir

Karla Gambra

Bruno Góes

João Sorima Neto

Gabriel Martins

09/03/2019

 

 

Índice Ibovespa sobe 1,09%, atingindo 95.364 pontos, e dólar fecha em queda, a R$ 3,87, após declaração do ministro Paulo Guedes de que faltariam 48 votos para aprovação da proposta na Câmara

Sin ais positivos sobre a reformada Previdência animaram ontem o mercado financeiro. Após declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, publicadas à tarde pela Agência Estado, de que faltariam apenas 48 votos para a aprovação da proposta na Câmara dos Deputados, o dólar se afastou dos R$3,90, fechando a R$3,87, e o índice Ibovespa subiu 1,09%, atingindo 95.364 pontos. Mais cedo, o presidente Jair Bolsonaro já tinha dito que espera que a proposta seja aprovada na Câmara ainda no primeiro semestre, o que fez com que a Bolsa entrasse em ritmo de alta, na contramão do cenário externo. Segundo Bolsonaro, o Congresso não pode levar um ano para aprovara reforma. Enquanto isso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou que a Comissão de Constituição e Justiça( CC J ), a primeira a analisar o texto, deve ser instalada na quarta-feira.

— A Bolsa já vinha no azul com declarações mais positivas sobre a reforma, tanto do presidente Bolsonaro como de Maia. Mas a fala de Guedes acelerou os ganhos. Agora é ver se a CCJ de fato vai ser formada até quarta — disse Luiz Roberto Monteiro, operador da corretora Renascença. Segundo Bolsonaro, o governo está fazendo de tudo para que o texto encaminhado ao Legislativo não seja desidratado, mas respeitará a autonomia do Parlamento. Na semana passada, o presidente chegou a sinalizar que aceitaria reduzira idade mínima para a aposentadoria das mulheres para 60 anos. A reforma prevê 62 anos. Ele também admitiu rever as propostas para benefícios assistenciais e pensões. — Não pode levar um ano para aprovar uma reforma. Nós aqui estamos fazendo de tudo para que ela não seja desidratada, mas respeitamos a autonomia do Parlamento. É o interesse de todos, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do Davi Alcolumbre (Presidente do Senado) também, de muitos parlamentares —afirmou o presidente.

'Espírito patriótico'

Bolsonaro disse que espera convencer os parlamentares sobre a necessidade da aprovação da reforma. —Sabemos que, em algum aspecto, é uma medida amarga, mas é uma resposta que temos que dar de uma política sem muita responsabilidade que foi feita ao longo dos últimos anos. Até os militares vão entrar com essa cota de sacrifício nessa reforma. Estamos buscando os parlamentares, apelando para o espírito patriótico deles. Guedes disse à Agência Estado que um mapeamento do governo indica que 160 deputados já declararam publicamente apoio às mudanças. E outros 100 já teriam indicado ao Planalto que votarão a favor. Como são necessários 308 votos, faltariam 48. Perguntado sobre a expectativa de tempo para a aprovação da reforma previdenciária dos militares, Bolsonaro afirmou que o caso é mais simples porque as regras podem ser alteradas sem necessidade de Proposta de Emenda Constitucional (PEC): —A nossa reforma não depende de proposta de emenda na Constituição, então é muito fácil. Pode chegar lá e ir uma semana na Câmara e uma semana no Senado e estar solucionada a questão. A CCJ deve ser presidida pelo deputado de primeiro mandato Felipe Francischini (PSL-PR).

— A partir de segunda-feira os partidos começam a indicar (nomes para compor a comissão). Espero que na quarta possamos instalar pelo menos a CCJ e as principais comissões —explicou Maia.

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Governo precisará de mais que reforma para zerar déficit

Marcello Corrêa

09/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Efeito da mudança será sentido a longo prazo. Para obter resultado fiscal esperado em 2019, saída será fazer privatizações

A reforma da Previdência é a medida mais importante para equilibrar as contas públicas, mas, sozinha, não será suficiente para resolver o déficit bilionário, principalmente no curto prazo. Mais focada em um ajuste estrutural e com um impacto fiscal que crescerá aos poucos nos próximos anos, a proposta não atende à meta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de zerar o rombo fiscal neste ano. Para isso, o governo terá de recorrera receitas extraordinárias, como concessões de infraestrutura, privatizações e leilões de petróleo. E, mesmo no longo prazo, para que tenham efeito fiscal, as novas regras deverão ser acompanhadas de outras reformas, co moado funcionalismo, alertam especialistas. Analistas projetam que o país fechará este ano com um déficit primário (sem contar o pagamento de juros) de quase R$ 100 bilhões. Guedes espera um resultado fiscal bem diferente: zero. A promessa é garantida desde a campanha. Mas ele sabe que o objetivo só será alcançado com ajuda de receitas extraordinárias, ou seja, que vão além da arrecadação de impostos. Recentemente, em um jantar com jornalistas, Guedes reconheceu que essa será a estratégia adotada: —A reforma da Previdência só entra para ajudar ano que vem. Não quer dizer que vou ficar parado. Eu faço qualquer coisa, vou de cessão onerosa, vou de privatização, vou de devolução de caixa, vou buscar esse dinheiro. Eu quero zerar. Quando fala em cessão onerosa, o ministro se refere ao acordo entre o governo federal e a Petrobras em que a União entregou à empresa o direito de explorar cinco bilhões de barris de óleo numa área do pré-sal que, na verdade, tem reserva muito superior a este volume. Um megaleilão para licitar esse excedente foi marcado para outubro e deve render aos cofres públicos R$ 100 bilhões. Embora o certame esteja marcado, a rodada só sairá do papel quando houver uma renegociação do contrato entre a Petrobras e o governo. Esse assunto pode ser resolvido por meio de um aval do Tribunal de Contas da União (TCU). A equipe econômica deve lançar mão de concessões de aeroportos, ferrovias e portos que podem gerar uma arrecadação de R$ 3,4 bilhões. A privatização da Eletrobras deve render R$ 12 bilhões, mas precisa de autorização do Congresso para ser realizada, e sua receita já está prevista no Orçamento deste ano — ou seja, não terá impacto fiscal no ano. Todas essas receitas, no entanto, seriam pontuais — não se repetirão nos anos seguintes. É possível até que, mesmo que a meta de zerar o déficit em 2019 seja alcançada, o país volte ao vermelho em 2020. Para o ano que vem, a expectativa de analistas é de déficit de R$ 65 bilhões. Se aprovada, a reforma da Previdência já ajudaria a entregar resultado melhor, mas o impacto da medida começa pequeno. O governo não divulgou a economia ano a ano, mas estimativa feita pelo economista André Gamerman, da ARX Investimentos, mostra que, no primeiro ano de vigência, as novas regras resultariam numa economia de R$ 18,9 bilhões. Esse impacto positivo subiria gradualmente, até chegar a R$ 228,3 bilhões em 2030, projeta o economista. — Sem aumento de imposto, o déficit primário deve zerar entre 2021 e 2023. É possível que, com um grande leilão do pré-sal e outras medidas (concessões e privatizações), seja possível, eventualmente, zerar o déficit antes —estima. Em entrevista à colunista Míriam Leitão, na semana passada, o economista do Itaú Unibanco Pedro Schneider estimou que, mesmo que a proposta seja aprovada, o gasto com Previdência continuará a subir, passando de 58% do Orçamento para 75% ao longo de uma década. Isso comprometeria a sustentabilidade do teto de gastos, que impede que as despesas do governo cresçam mais que a inflação do ano anterior, colocando em risco investimentos em outras áreas.