O globo, n. 31295, 13/04/2019. Rio, p. 21

 

‘O Exército não matou ninguém’, afirmou Bolsonaro sobre 80 tiros

Gustavo Maia

13/04/2019

 

 

Presidente disse que lamenta a morte de músico por militares e que perícia vai apontar o que aconteceu

Cinco dias depois da morte do músico Evaldo Rosa, que teve o carro fuzilado por militares em Guadalupe, o presidente Jair Bolsonaro se manifestou sobre o caso, isentando a instituição. “O Exército não matou ninguém. Houve um incidente, uma morte”, disse Bolsonaro, em inauguração de aeroporto em Macapá (AM). “Vai aparecer o responsável”. Cinco dias após a morte do músico Evaldo dos Santos Pereira, o presidente Jair Bolsonaro classificou o caso como um “incidente” e afirmou que “o Exército não matou ninguém”. Evaldo foi morto no último domingo, quando o carro que dirigia foi fuzilado com cerca de 80 tiros disparados por militares do Exército, em Guadalupe. — O Exército não matou ninguém, não. O Exército é do povo, e não pode acusar o povo de ser assassino, não. Houve um incidente, uma morte. Lamentamos a morte do cidadão trabalhador, honesto, e está sendo apurada a responsabilidade. No Exército, sempre existe um responsável, não existe essa de jogar para debaixo do tapete. Vai aparecer o responsável — afirmou o presidente ontem, durante a inauguração do Aeroporto Internacional de Macapá. Bolsonaro disse que o caso está sendo investigado e que o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, irá se pronunciar sobre o assunto.

—Uma perícia já foi pedida para ter a certeza do que aconteceu naquele momento. O Exército, na pessoa de seu comandante, o ministro da Defesa, vai se pronunciar sobre esse assunto, e, se for o caso, a gente se pronuncia também. Com os dados na mão, com os números na mão, nós vamos assumir a nossa responsabilidade e mostrar realmente o que aconteceu para a população brasileira —disse Bolsonaro.

'Disparos péssimos'

Pela manhã, o vice-presidente Hamilton Mourão também falou sobre a morte do músico. Em entrevista à rádio CBN, ele disse que a tragédia seria maior, não fossem os “disparos péssimos” dos militares. Na avaliação do general, “não teria sobrado ninguém” dentro do carro atingido por mais de 80 tiros, caso os disparos fossem controlados e tivessem a “devida precisão”. Para Mourão, que classificou o episódio como uma tragédia, “erros dessa natureza” ocorrem sob pressão e sob forte emoção. — Vamos colocar a primeira coisa: houve uma série de disparos contra o veículo da família, né? Você vê que só uma pessoa foi atingida. Então, foram disparos péssimos. Se fossem disparos controlados e com a devida precisão, não teria sobrado ninguém dentro do veículo. Seria pior ainda a tragédia. Isso é um fato — respondeu o vice-presidente, ao ser questionado sobre o que levou ao fuzilamento e o que pode ser feito para evitar novos casos semelhantes. Diferentemente do que disse Mourão, além do músico, duas pessoas foram baleadas pelos militares: o sogro de Evaldo, Sérgio Gonçalves de Araújo, de 59 anos, que foi atingido nos glúteos e continua internado, além de um homem que passava pela rua e tentava ajudar a família, que está em coma. No carro, ainda estavam a mulher da vítima, o filho do casal de 7 anos e uma amiga. Ainda no domingo, o Exército chegou a divulgar um comunicado informando que os ocupantes do carro fuzilado tinham disparado contra a guarnição, que “revidou à injusta agressão”. No dia seguinte, a versão foi mudada, e nove militares, presos.

A família estava indo para um chá de bebê quando houve o ataque. Evaldo, que morreu na hora, também trabalhava como segurança numa creche. — Quando eles (os militares) começaram a atirar, minha tia pegou meu primo no colo e mostrou que era um carro de família, mas eles não pararam — contou um sobrinho de Evaldo.

Segundo o delegado Leonardo Salgado, da Delegacia de Homicídios da Capital, os militares do Exército devem ter confundido o carro de Evaldo com o de bandidos:

— Foram diversos, diversos disparos de arma de fogo efetuados, e tudo indica que os militares realmente confundiram o veículo com um veículo de bandidos. Mas, neste veículo, estava uma família. Não foi encontrada nenhuma arma com as vítimas. Tudo que foi apurado era que, realmente, era uma família normal, de bem, que acabou sendo vítima dos militares. O inquérito sobre o caso está na Justiça Militar.

“O Exército não matou ninguém, não. O Exército é do povo, e não pode acusar o povo de ser assassino, não. Houve um incidente, uma morte. Lamentamos a morte do cidadão trabalhador, honesto, e está sendo apurada a responsabilidade”

Jair Bolsonaro, presidente

“Foram disparos péssimos. Se fossem disparos controlados e com a devida precisão, não teria sobrado ninguém”

Hamilton Mourão, vice-presidente