Valor econômico, v. 19, n. 4526, 16/06/2018. Opinião, p. A10

 

O país é o que for seu povo

Fernão Bracher

16/06/2018

 

 

Nos dias que correm, constantemente somos lembrados que a Educação é importante e, logo depois, vem a observação de que no nosso país as notas que mostramos são bem menos boas do que gostaríamos.

Neste artigo procurarei mostrar que, apesar do nosso nível atual ser inaceitável, não é verdade que não tenhamos feito progressos, seja no campo material, seja no conceitual. No campo material, podemos citar avanços como a estruturação de um sistema de financiamento da educação básica (Fundeb), uma política nacional que assegura livros didáticos a todos os alunos (PNLD) e a ampliação da oferta de escolas para abrigar os nossos quase 49 milhões (!) de alunos matriculados de 4 a 17 anos. No campo conceitual, avançamos muito com a aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que dá clareza em relação às aprendizagens a que os alunos têm direito.

Os itens com razoável acordo, sem nos atermos à ordem hierárquica, são:

1- necessidade da atenção aos professores, seja na sua formação, seja na sua remuneração e nas condições de trabalho para a estrutura do ensino.

2- Um sistema de avaliação abrangente e bem calibrado, que possibilite o monitoramento dos resultados por escola.

3- A expansão das escolas de tempo integral, notadamente daquelas com um currículo integrado e professores de dedicação exclusiva.

4- Um ensino médio pensado para todos os brasileiros e não só para atender os menos de 20% que irão para a universidade, como hoje ainda acontece.

5- O aperfeiçoamento da gestão das escolas, com seleção de diretores a partir de critérios técnicos.

Nesses pontos deve haver continuidade e necessitamos da conscientização da sociedade, para demandar sua implantação.

Examinaremos cada item por si:

1- O fulcro central da educação está na relação professor-aluno. Todo o resto é acessório, mais ou menos importante, mas acessório. Portanto é da maior importância a formação do professor, seja no conteúdo, seja na habilidade didática para ensinar esse conteúdo de forma que o aluno o aprenda. Temos aqui um trabalho enorme pela frente: a valorização da carreira do professor. Quem a procura? São os melhores alunos do ensino médio? São as maiores notas do Enem? Não, a profissão professor não é concorrida e com isso a nota de corte para entrar nos cursos de pedagogia é das mais baixas, portanto não são os estudantes com melhores notas que se encaminham para a docência. Mas, e uma vez no curso? Também aí uma decepção. A formação universitária favorece o estudo teórico, deixando para segundo plano a prática da sala de aula.

Temos então uma dupla deficiência: no preparo com o qual os futuros professores entram nas respectivas faculdades e no ensino que lá recebem. Uma razão para essa situação de desprestígio certamente é a remuneração e o plano de carreira. No que concerne à compensação financeira, criou-se uma situação difícil: há um sentimento claro de que um reajuste deve ser feito. Ocorre que o problema é antigo, criado por dificuldades orçamentárias do Estado e pela falta de uma política salarial condizente com a importância da profissão de professor.

O corpo docente, ao longo do tempo, reagiu negociando alternativas, vantagens para compensar essa falha. Um sem número de disposições foram criadas: faltas abonadas para compensar as perdas salariais, aposentadorias diferenciadas, escolha do local de trabalho atendendo a conveniências outras que não as da aprendizagem dos alunos e daí por diante. Infelizmente quase todas as medidas encontradas não atendem às necessidades do ensino e apenas visam compensar a deficiência salarial.

2- A batalha da avaliação é um ponto vencido. Temos já boas avaliações. O importante neste passo é a reflexão sobre o resultado das avaliações para criar incentivos a acertos e correção para erros.

3- A escola de tempo integral também é um item que está ganhando consenso geral da sua importância. Há grandes vantagens: em primeiro lugar, na maioria dos Estados em que foram implantadas, as escolas de tempo integral foram acompanhadas por um aumento real no salário dos professores. Segundo, possibilitam que o professor se dedique a um único local de trabalho, evitando a correria entre dois ou mais empregos. Isso diminui o problema das faltas e também soluciona a questão de tempo e lugar para as aulas de recuperação.

Em 2017 o Ministério da Educação lançou um programa de incentivo à implantação de escolas de tempo integral que teve adesão de todos os Estados. Além disso, o Sr. Marcos Magalhães, de Pernambuco, criou um modelo que dá interessante formulação para as atividades nas escolas de tempo integral, com resultados excelentes de desempenho dos alunos. Esse modelo e seus princípios já foram adotados em cerca de 55% da rede de ensino médio de Pernambuco, em mais de 360 escolas de tempo integral em São Paulo (as PEIs), e está sendo implantado em vários Estados da federação.

4- O ensino médio está em fase de adaptação. O governo reconheceu (o que na maioria dos países já existe) a importância de que o aluno aos 17 anos, ao terminar o ensino médio, além ou ao lado do preparo para carreira universitária, tenha a opção de preparo profissional à sua escolha. Como o ensino médio é competência dos Estados, as nossas Secretarias Estaduais de Educação estão atualmente aguardando a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino médio para adaptarem os seus currículos de tal forma a poder oferecer aos alunos aulas de formação profissional, além da formação acadêmica, como já ocorre hoje. Espera-se com isso proporcionar aos jovens uma melhor condição para se organizarem para dar sequência à vida pós ensino médio - seja para que possam trabalhar, seja para continuar estudando.

5- No Estado de São Paulo foram promovidos concursos para diretores de escolas no segundo semestre do ano passado, nos quais foram exigidos conhecimentos técnicos de gestão, necessários à função de dirigir uma escola. Os aprovados terão três anos de estágio probatório, durante o qual receberão supervisão e um curso de formação, após o que, tendo bons resultados, assumirão uma escola. Infelizmente isso ainda não é uma realidade em vários Estados onde o diretor pode ser indicado, inclusive por motivos políticos. A importância desse item decorre de que, além de outros benefícios, espera-se que de uma boa escolha dos diretores decorra uma boa gestão. Agora o que falta é: fazer acontecer!

Um país é o que for o seu povo. Diante dessa realidade deveríamos retomar um conceito um pouco fora de moda pelo mau uso que dele foi feito: a ideia do patriotismo. Não há porque aceitarmos o 63º lugar no Pisa (2015), depois da Indonésia e Albânia entre outros. É nossa tarefa de brasileiros darmos aos nossos concidadãos o instrumental necessário para juntos levarmos o Brasil ao seu bom destino.

Esses são os pontos que chamei, no início deste artigo, de "pontos onde há um razoável consenso" e os quais deveremos estudar, aprofundar e desenvolver. Dar continuidade a eles é imperativo!

Isso feito poderemos esperar uma melhora substancial nos índices de medições dos nossos alunos. Evidentemente cada um dos itens acima se subdivide em inúmeras partes e detalhes. É trabalho que requer muita persistência, dedicação e consequência.