Correio braziliense, n. 20358, 01/02/2019. Brasil, p. 5

 

Mello critica restrições à liberdade

Renato Souza

15/02/2019

 

 

Durante a continuidade do julgamento sobre a criminalização da homofobia e da transfobia, no Supremo Tribunal Federal (STF), o relator de uma das ações, ministro Celso de Mello, criticou duramente o preconceito e a “omissão” do Congresso Nacional em legislar sobre o tema. Ele afirmou que alguns grupos vêm “perpetuando o desprezo e disseminando o ódio contra a comunidade LGBT”. No entanto, a conclusão do voto do ministro será conhecida apenas na próxima semana, quando a Corte retomar a análise do caso.

Mello dividiu sua avaliação em 18 tópicos, sendo que 11 foram apresentados na sessão de ontem. O restante ficou para o dia 20. Duas sessões da Corte já foram dedicadas ao assunto, sendo que nenhum voto foi conhecido até o momento. Parlamentares foram ao STF e conversaram com ministros nos últimos dias. Políticos que se opõem às ações fazem forte pressão contra os pedidos. Um deles é o deputado Marco Feliciano. Ele chegou a conversar com o presidente do tribunal, Dias Toffoli, e tem criticado o julgamento nas redes sociais. Há parlamentares também que têm se manifestado a favor da criminalização, mesmo que ocorra por via judicial.

Ao proferir parte de seu voto, Celso de Mello, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), enviada ao tribunal pelo PPS, afirmou que homossexuais sofrem um preconceito histórico e intenso em relação a sua orientação sexual. Ele criticou, indiretamente, a ministra da Família e Direitos Humanos, Damares Alves. “Essa visão de mundo, fundada na ideia artificialmente construída de que as diferenças biológicas entre o homem e a mulher devem determinar os seus papéis sociais — meninos vestem azul, e meninas vestem rosa —, essa concepção de mundo impõe notadamente, em face dos integrantes da comunidade LGBT, uma inaceitável restrição às suas liberdades fundamentais, submetendo tais pessoas a um padrão existencial heteronormativo incompatível com a diversidade e o pluralismo que caracterizam uma sociedade democrática”, afirmou.

O magistrado deixou claro que é a favor da criminalização da homofobia. No entanto, também afirmou que não cabe ao STF criar tipificação penal. Ele reconheceu a “omissão” e a “inércia” do Congresso em relação ao assunto e vê flagrante violação de direitos previstos na Constituição. Para o magistrado, em busca de impor suas vontades, grupos e parte da sociedade atentam violentamente contra os direitos da comunidade LGBT. “A sociedade impõe normas e regras da orientação sexual das pessoas e exerce controle sobre como essas pessoas vivem sua sexualidade. O policiamento da sexualidade continua a ser uma poderosa força de violência contra os homossexuais.”

Mourão não vê urgência

O vice-presidente Hamilton Mourão disse, na quarta-feira, que não vê urgência para a discussão sobre a criminalização da homofobia. Para ele, “querer transformar a homofobia em um crime igual ao racismo é um passo além da necessidade”. “Não acho que isso seja (uma pauta de) urgência. Acho que qualquer crime cometido contra qualquer pessoa, independentemente da opção sexual dela ou do gênero, é crime.”