Correio braziliense, n. 20359, 16/02/2019. Cidades, p. 17
 
Ano para destravar a economia do DF
Augusto Fernandes
16/02/2019
 
 
Mesmo com o ano no início, entidades do Distrito Federal ligadas ao comércio, ao setor varejista e à indústria da construção civil apostam que 2019 será mais positivo para a economia local do que foi o último ano. Motivos, como o aumento do índice de confiança da classe empresarial e o crescimento da intenção de consumo das famílias brasilienses fazem com que as associações estimem uma evolução entre 2% e 6% em relação a 2018.
“Ainda estamos longe de reverter os prejuízos causados pela crise econômica nos últimos anos, mas as projeções para 2019 são otimistas. Há uma perspectiva de redução das taxas de juros, portanto, é possível que haja uma queda na inadimplência este ano. Isso vai impactar numa maior disposição das famílias para o consumo. Além disso, a mudança de governo sempre gera expectativa nos empresários. Caso as ações governamentais sejam eficientes, o empresário terá confiança para investir novamente”, explica o presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do DF (Fecomércio), Francisco Maia.
A projeção é considerada tímida, mas representa um alívio, segundo o presidente do Sindicato do Comércio Varejista do DF (Sindivarejista) e vice-presidente da Fecomércio, Edson de Castro. “Qualquer crescimento depois de um período tão difícil é animador. De 2015 a 2017, registramos mais fechamentos do que aberturas de lojas comerciais. Nesse período, perdemos quase 5 mil estabelecimentos. Em 2018, tivemos um saldo positivo. Fechamos o ano com 57 novas lojas. Queremos manter a projeção”, destaca.
Um dos comércios inaugurados no último ano foi o da administradora Paula Dellinghausen, 27 anos. Em outubro passado, ela abriu uma pequena loja de moda e acessórios infantis. “Sempre foi o meu sonho. Mesmo com toda a crise financeira pela qual o país estava passando, senti que era a hora certa para fazer isso. Comecei muito bem. Consegui um retorno de R$ 15 mil a R$ 18 mil em cada um dos primeiros três meses”, diz.
Apesar de ainda não ter recuperado o dinheiro que investiu para abrir o estabelecimento, Paula está confiante para 2019. Apenas nas duas primeiras semanas de fevereiro, ela conseguiu vender R$ 2 mil a mais do que comercializou nos 31 dias de janeiro. “Fevereiro superou as expectativas. Se eu tiver o mesmo lucro nos próximos meses, farei novos investimentos, como criar um site para vender também pela internet”, prevê.

Estatísticas

Na opinião da pequena empreendedora, o bom volume de vendas tem a ver com a mudança do cenário político nacional. “Sinto que os brasilienses estão mais empolgados com as expectativas anunciadas pelo novo governo. É claro que os consumidores ainda buscam produtos mais baratos, mas acredito que neste ano eles estão mais animados para gastar.”
Em todos os meses de 2018, o Índice de Confiança do Empresário do Comércio do DF, medido pela Fecomércio, superou a marca dos 100 pontos. Valores acima de 100 indicam otimismo, de acordo a entidade. “Houve um aumento significativo na comparação anual, o que significa que a confiança do empresário do comércio está reagindo positivamente”, aponta Edson de Castro, do Sindivarejista.
Vendedora de uma loja de perfumes há um ano e meio, Alanna Medeiros, 30, confirma o ânimo para 2019. “Apesar de os primeiros meses do ano serem um período em que as pessoas estão pagando dívidas e resolvendo outras pendências, há uma boa movimentação no nosso comércio. O volume de vendas cresceu 10% em relação à mesma época de 2018. Isso nos faz crer que o restante do ano também será bom”, comemora.
Dessa forma, ela acredita que será possível investir em novos produtos para atender às necessidades da clientela. “Os consumidores querem qualidade. Quanto mais variado for o nosso estoque, melhor para a loja. Mesmo se vendermos com desconto, certamente lucraremos”, detalha.
Também de acordo com a Fecomércio, o Índice de Consumo das Famílias do DF chegou a 102,5 pontos em janeiro deste ano. Foi a primeira vez desde março de 2015 que o levantamento ultrapassou a zona de indiferença, de 100 pontos. “Apuramos que boa parte dos brasilienses se sente mais seguro no emprego, em comparação com o mesmo período de 2018. Isso reforça que a economia está se recuperando e as empresas não estão querendo mais demitir”, avalia Francisco Maia, da Fecomércio.

Indústria animada

O ano também deve apresentar recuperação econômica, de acordo com o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), João Carlos Pimenta. “Os últimos quatro anos foram difíceis. Atolamos em uma situação complicada. O efetivo médio de trabalhadores na construção civil, por exemplo, baixou de 90 mil para menos de 20 mil. Mas com os novos investimentos prometidos pelos governos federal e do DF, tenho certeza de que vamos destravar a legislação e reaquecer a economia”, disse.
Gerente de uma empresa de móveis planejados, Cleiton Bezerra, 47, começou este ano melhor que em 2018. Apenas em janeiro, os ganhos do seu estabelecimento subiram 30% em relação ao mesmo período do ano passado. “Estou otimista para o restante do ano. Quero manter essa margem de diferença. A intenção é fechar o ano no verde, o que não acontece desde 2015”, relata.
Nos últimos quatro anos, Cleiton precisou fazer alguns sacrifícios para não fechar as portas. Vendeu bens próprios, demitiu funcionários e acumulou funções na empresa. Em 2018, viu a sua demanda de pedidos por mês cair de 25 para 10. Por conta disso, ele estima que deixou de ganhar pelo menos 
R$ 150 mil no ano passado. “Mesmo assim, fiz o possível para manter a empresa aberta. Como 2019 começou melhor, contratei mais quatro pessoas para o quadro de funcionários. A demanda voltou a crescer, felizmente. Espero recuperar tudo o que perdi ainda este ano. Isso me dará tranquilidade para seguir trabalhando”, afirma.
Apesar das projeções otimistas, o cenário de desemprego ainda preocupa. Há quatro meses sem emprego, Emily Barbales, 26, está preocupada com 2019. “Voltar ao mercado de trabalho tem sido um desafio. Estou procurando vagas, mas a concorrência é muito grande. Enquanto isso, não posso me dar ao luxo de ficar gastando à toa”, lamenta a secretária.
Eventualmente, Emily trabalha como diarista para sustentar as duas filhas, de 4 e 6 anos. “No início do ano passado, quando eu ainda trabalhava, era mais fácil. Agora, tenho que controlar tudo. Antes de pensar em comprar qualquer coisa, tenho que priorizar minha família”, diz.
5,8%
Expectativa de aumento no volume de vendas do varejo no DF para 2019, de acordo com a Fecomércio
2%
Estimativa de crescimento das indústrias do DF este ano, segundo a Fibra

Desburocratização

O desemprego atinge cerca de 10% da população ativa do Distrito Federal. São 310 mil pessoas, de acordo com a Companhia de Planejamento (Codeplan). Para diminuir a quantidade de desocupados, o secretário do Trabalho do DF, João Pedro Ferraz, aposta na rapidez de concessão dos alvarás e licenças para microempresas e empresas de pequeno porte e assim ajudar a eliminar burocracias no setor produtivo. “Além disso, vamos investir no setor de serviços e da construção civil, que são os que mais empregam. Essas são medidas a curto prazo. No futuro, pretendemos criar um polo de livre comércio”, afirma.

Quatro perguntas para Jamal Jorge Bittar, presidente da Federação das Indústrias do DF (Fibra)

Quais sinais de que este ano será mais positivo para a economia?

Temos indicadores que apontam nesse sentido. A confiança do empresariado de Brasília medida pela Fibra registrou alta em janeiro. Chegou a 64,7 pontos, sendo o melhor resultado para o mês desde o início da série histórica, em 2010. Além disso, embora longe da expectativa, o Produto Interno Bruto (PIB) do DF cresceu no ano passado. A situação econômica ainda é frágil, mas quando ela começa a mostrar movimentos positivos, por menor que eles sejam, nós ficamos muito confiantes. Haverá crescimento, mas nada assustador. É um processo lento, que precisa de continuidade.
Quais segmentos devem se destacar neste ano?
No comércio, acredito que as perfumarias, lojas de sapato, vestuário e brinquedo, pois são produtos que as pessoas consomem diariamente ou compram para presentear alguém. Para as indústrias, vejo uma perspectiva mais harmonizada. Deve acontecer uma retomada no contexto geral. O que pode alterar isso é a construção civil. Se os investimentos de governo forem confirmados, ela será a primeira a ser atingida positivamente. A construção civil é sempre marcante, pois pode destoar e dar uma grande contribuição aos indicadores econômicos. Quando a construção civil circula com muita abrangência, ela ativa todos os outros setores da economia.
Por mais que exista essa previsão otimista, por que alguns consumidores não sentem confiança de que o ano será melhor?
Porque o cidadão precisa ter convicção de que está em um meio estável. O nosso otimismo não adiantará para nada se não houver boas políticas de governo para efetivar o ânimo das pessoas. São os indicadores de inflação e de desemprego, principalmente, que refletem na segurança e conforto da população para consumir mais. A base do crescimento para a economia é o consumo. Se ele não ocorre, tudo mais vira retórica. Portanto, é preciso deixar a população segura.
O nível do desemprego em Brasília cairá neste ano?
Com certeza, a expectativa é boa. O ânimo do empresário para investir acarreta na geração de empregos. O ideal seria uma queda profunda do número de desocupados, mas qualquer diminuição será importante. Nessa corrida, é fundamental a participação das lideranças do setor produtivo e dos poderes Executivo e Legislativo. Nenhum ente consegue produzir resultados sozinho. O espírito colaborativo deve prevalecer.