Valor econômico, v.18, n.4479, 10/04/2018. Brasil, p. A5

 

Debandada de técnicos no MME desagrada e aumenta a descrença sobre privatização 

Daniel Rittner

Camila Maia 

André Ramalho

10/04/2018

 

 

O mercado reagiu mal, com um tombo nas ações da Eletrobras pelo segundo pregão consecutivo, à debandada de seus principais xodós do Ministério de Minas e Energia após o anúncio de Moreira Franco como novo chefe da pasta. Ontem foi a vez de Luiz Augusto Barroso, um prestigiado consultor que assumiu o comando da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) em julho de 2016, entregar sua carta de demissão.

Em uma tentativa de acalmar os investidores, Moreira definiu antes mesmo de sua posse, marcada para hoje, a promoção do engenheiro Márcio Félix Carvalho Bezerra ao cargo de secretário-executivo. O posto ficou vago na sexta-feira com a saída de Paulo Pedrosa, um dos mentores da privatização da Eletrobras, deflagrando a primeira queda dos papéis da estatal. Em apenas dois dias, as ações ON caíram 17,85%.

Barroso e Pedrosa também atuaram juntos no desenho de reforma do setor elétrico, bem recebido pelo mercado, cujo texto já foi encaminhado à Casa Civil e ainda não tem data para seguir ao Congresso Nacional.

"Não posso fazer mais nada", retrucou Moreira, em conversa com o Valor ontem à tarde, ao ser questionado sobre a repercussão negativa de seu deslocamento da Secretaria-Geral para o Ministério de Minas e Energia. "Já disse que nada vai mudar e que a capitalização da Eletrobras continua sendo a nossa grande prioridade", acrescentou, lembrando a incapacidade financeira do governo de fazer novos aportes públicos na estatal. "Ela é a cabeça do sistema e está mal das pernas."

Félix é um nome bastante respeitado no mercado. Atual secretário de Petróleo e Gás, ele foi o articulador da retomada dos leilões do setor e hoje é peça-chave das negociações sobre a revisão do contrato de cessão onerosa à Petrobras. Algumas alas chegavam a apontá-lo como alternativa para a sucessão do ex-ministro Fernando Coelho Filho. Um dos defensores era o presidente da estatal petrolífera, Pedro Parente, que endossava sua nomeação em conversas no Palácio do Planalto.

A escolha de Félix como nº 2 do ministério dá um impulso aos preparativos do megaleilão no pré-sal que o governo almeja realizar no segundo semestre. A oferta dos excedentes do petróleo cedido à Petrobras em 2010 pode render mais de R$ 100 bilhões ao caixa da União. Cogita-se fixar um bônus de assinatura parcelado em vários anos, o que tende a melhorar a situação fiscal não só deste, mas do próximo governo.

Moreira enfatiza a intenção de organizar o certame ainda em 2018, mas rejeita o viés arrecadatório. Quer agilidade nos leilões de petróleo e usa uma comparação histórica. "A idade da pedra não acabou por falta de pedra. Temos que aproveitar essa riqueza natural enquanto é tempo."

Por outro lado, a nomeação de Félix provoca dúvidas no setor elétrico, que não identifica claramente um interlocutor claro na equipe do ministério, devido à inexperiência do novo secretário-executivo nessa área específica.

Outra fonte de incertezas é o futuro da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O grupo do MDB do Senado tem articulado indicações para ocupar a vaga do diretor-geral, Romeu Rufino, cujo mandato expira em agosto.

Ainda não há confirmação, mas outras duas saídas bastante prováveis do ministério são a do secretário de Geologia e Mineração, Vicente Lôbo, e a do secretário de Energia Elétrica, Fábio Lopes Alves. Lôbo já considera sua missão cumprida. Lopes deve migrar para a presidência da Chesf no lugar de Sinval Gama, cotado para assumir uma das diretorias abertas no Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr., não deu sinais de seguir a onda. Ele disse que tem "mandato" a cumprir na empresa e "compromisso" com um trabalho que vem sendo feito.

"O setor elétrico ficou intranquilo com a saída do Barroso e do Pedrosa, porque são técnicos renomados e estavam tocando a pauta das reformas do setor, mas a EPE é uma instituição do Estado. Vamos dar continuidade à pauta que vinha sendo tocada", afirmou ao Valor o atual diretor de petróleo e gás da EPE, José Mauro Coelho, que assumiu a presidência em exercício da estatal de planejamento energético. (Colaboraram Rodrigo Polito, Francisco Góes e Juliana Schincariol, do Rio)