Título: Uma esfinge chamada Peluso
Autor: Abreu, Diego ; Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 29/08/2012, Política, p. 3

Mistério sobre a postura do magistrado mais experiente da Corte no julgamento da Ação Penal 470 acaba na sessão desta tarde. Futuro político do deputado João Paulo Cunha será decidido hoje

O ministro Cezar Peluso vai acabar hoje com o suspense a respeito de sua participação no julgamento do mensalão. Já em clima de despedida do Supremo Tribunal Federal (STF), ele terá a palavra logo na abertura da sessão, marcada para as 14h. Além do mistério acerca do voto de Peluso, a expectativa é de que o futuro do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) seja selado até o fim do dia. Já há quatro votos para que o candidato a prefeito de Osasco seja condenado e dois a favor da absolvição. Bastam mais dois para que haja maioria pela condenação do petista.

Depois das especulações de que Peluso poderia adiantar o voto integralmente ou até mesmo abrir mão do direito de se manifestar a respeito da Ação Penal 470, a expectativa entre os ministros do STF é de que ele vote apenas a respeito do item três do mensalão, que trata dos contratos das agências do empresário Marcos Valério com a Câmara dos Deputados e com o Banco do Brasil. O ministro completa 70 anos na próxima segunda-feira, data-limite para se aposentar compulsoriamente.

Ao deixar a sessão da 2ª Turma do STF, ontem à tarde, Peluso não quis entrar em detalhes sobre o caso. Questionado sobre como procederia, ele respondeu de forma enigmática: "Amanhã, vocês verão, não estraguem a surpresa". O Regimento Interno do Supremo prevê que o relator e o revisor são os primeiros a votar e que, depois disso, falam os outros ministros, em ordem inversa de antiguidade. O rito está sendo seguido em relação ao item em debate. Agora, chegou a vez de Peluso, mas ele, em tese, terá de se ater aos réus já citados pelo relator, embora o mesmo dispositivo do regimento estabeleça que é possível antecipar o voto, desde que autorizado pelo presidente da Corte.

Marco Aurélio Mello alerta que essa possibilidade só existe após relator e revisor votarem. Para ele, Peluso vai se pronunciar apenas no item três. "Essa antecipação ao relator e ao revisor seria impensável, porque contraria a ordem natural das coisas", afirmou. "Acho que ele (Peluso) vai votar só nesse item já debatido, pela larga experiência que tem do ofício judicante. Confio no taco jurídico de sua excelência", afirmou Marco Aurélio.

Sequência Depois de Peluso, será a vez de o ministro Gilmar Mendes votar. Ele tende a ser rigoroso, mas fará um voto curto. A aposta entre advogados é de que Gilmar concordará com o relator do processo, Joaquim Barbosa, em relação às condenações de João Paulo, do empresário Marcos Valério e de dois ex-sócios. Indicado para o Supremo pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Gilmar deve condenar também o diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, contra quem já há maioria pela condenação, mesmo caso de Valério e dos ex-sócios no subitem referente ao BB. A tendência, nesse caso, é que o veredicto seja por unanimidade. Marco Aurélio também promete não se alongar.

O decano da Corte, Celso de Mello, será o penúltimo a se manifestar. Ele costuma se apegar à análise das provas cabais. Por isso, entre os defensores, há a esperança de que ele possa absolver parte dos acusados. É possível que não haja tempo para que o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, vote hoje. Ele será rápido e, provavelmente, implacável contra os réus.

Na abertura da sessão da 2ª Turma, os ministros fizeram ontem uma rápida homenagem a Cezar Peluso. Gilmar Mendes lamentou a aposentadoria do colega. "Nós, nesse momento, certamente com uma ponta de tristeza, deploramos esse instituto da aposentadoria compulsória, que faz com que alguém com essa agilidade mental tenha que nos deixar por imposição constitucional e legal." Já Celso de Mello destacou a trajetória de Peluso. "Sua excelência, todos sabemos, tem sido um grande magistrado, um grande juiz nessa Suprema Corte", afirmou. O magistrado agradeceu as homenagens. "Vejo-me na contingência de celebrar essa despedida. Foi com vossas excelências que pude coroar minha carreira de magistrado."

As possibilidades Cezar Peluso participará somente de mais duas sessões antes de se aposentar. Confira os três cenários possíveis sobre a linha de atuação do ministro no julgamento do mensalão:

Votar o item 3 Primeiro a ter a palavra na sessão de hoje, Peluso pode optar por apresentar sua manifestação sobre o capítulo em debate no julgamento, que trata de supostos desvios de recursos públicos do Banco do Brasil e da Câmara dos Deputados. Nesse caso, ele só se pronunciaria sobre o futuro de João Paulo Cunha, Henrique Pizzolato, Luiz Gushiken, Marcos Valério e seus dois ex-sócios.

Não votar O ministro Peluso pode abrir mão de votar para que não tenha que se manifestar em relação a apenas um ponto do julgamento, já que ele não estará no STF durante a apreciação de outros seis itens da denúncia. Ele pode aproveitar a sessão de hoje para anunciar que, diante de sua aposentadoria compulsória, não irá votar porque não estará no Supremo no fim da análise, quando o cálculo das penas será feito.

Antecipar o voto inteiro O cenário mais improvável seria o de Peluso pedir para apresentar o seu voto completo em relação aos 37 réus. Se isso ocorrer, o ministro estará tratando de tema ainda não abordado pelo relator da ação, o que seria inédito no Supremo e provocaria debate entre os ministros sobre a legalidade da ação.