Correio braziliense, n. 20365, 22/02/2019. Brasil, p. 8

 

Quatro votos no STF contra a homofobia

Renato Souza

22/02/2019

 

 

Sociedade » Ministros que já analisaram Ação de Inconstitucionalidade por Omissão consideram que prática deve ser enquadrada na lei que trata de racismo. Julgamento foi suspenso

Na quarta sessão dedicada ao julgamento de ações que pedem a criminalização da homofobia, o Supremo Tribunal Federal avançou no sentido de equiparar esse tipo de prática ao racismo. Quatro dos 11 integrantes do plenário já se manifestaram a favor de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) protocolada pelo PPS. Após o voto do ministro Luís Roberto Barroso, a sessão de ontem foi suspensa. O presidente do Tribunal, Dias Toffoli, afirmou que outras 35 ações aguardam julgamento e, por isso, era preciso reorganizar a pauta.

No pedido apresentado ao Supremo, o PPS afirma que, na ausência de tipificação da transfobia e da homofobia pelo Congresso, a quem compete a criação de leis, o STF deve atuar para garantir os direitos da população LGBT. O partido solicitou, então, que atos que atentam contra gays, lésbicas, travestis e transsexuais sejam enquadrados na mesma lei que pune o crime de racismo. Os ministros também analisam um mandado de injunção protocolado pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT).

Além de Barroso, os ministros Celso de Mello, Edson Fachin e Alexandre de Moraes votaram a favor da criminalização. Ainda falta a manifestação de sete magistrados. Caso mais dois deles votem no mesmo sentido, estará formada maioria para definir o caso. No entanto, até que o julgamento seja encerrado, os ministros podem mudar os votos, embora isso não seja comum, ainda mais em temas complexos como esse.

O ministro Fachin lembrou que a identidade de gênero é reconhecida a nível internacional e integra os direitos humanos. “Para termos dignidade com respeito a diferenças, é preciso assentar que a sexualidade possui caráter inerente à dignidade humana”, disse. Alexandre de Moraes votou no mesmo sentido, destacando que é papel do STF assegurar que as liberdades garantidas e as práticas condenadas pela Carta Magna sejam parte das ações do Estado. “Aqui, o Supremo está exercendo sua função constitucional, que é de garantir o respeito à Constituição. Houve um desrespeito, por omissão, mas houve um desrespeito. São 30 anos de desrespeito. Por omissão não se atingiu a proteção e a garantia das liberdades da população LGBT”, disse.

O ministro Barroso se manifestou no mesmo sentido e declarou que diversos direitos da comunidade estão sendo violados, enquanto o Legislativo se omite ao não tratar do tema. “Não escapará a ninguém que tenha olhos para ver e coração para sentir que a comunidade LGBT é claramente um grupo vulnerável, vítima de discriminações e de violência. Sendo assim, o papel do Estado é intervir para garantir o direito dessas minorias”, disse. Barroso também se manifestou no sentido de que a homofobia deve ser incluída, com agravante, em razão de motivo fútil, entre os crimes previstos no artigo 121, parágrafo 2º, do Código Penal.

Embates

Nos próximos dias, o ministro Toffoli deve decidir quando o assunto volta ao plenário para a conclusão dos votos. No entanto, não existe prazo legal para que isso ocorra. Alguns manifestantes se reuniram em frente ao STF ao longo da semana. Mas grande parte dos embates entre grupos contrários e a favor da criminalização da homofobia ocorre por meio da internet.

Enquanto ativistas pelos direitos LGBTs se manifestam a favor da previsão legal para atos discriminatórios contra homossexuais, personalidades religiosas como o pastor e deputado federal Marco Feliciano (PSC -SP) acusam a Corte de tentar censurar as igrejas. No entanto, os ministros que já votaram destacaram em suas manifestações que a liberdade religiosa, inclusive de expressar sua crença, já é um direito previsto na Constituição e não pode ser violado.