Correio braziliense, n. 20368, 25/02/2019. Mundo, p. 12

 

Guaidó quer todas as opções contra Maduro

25/02/2019

 

 

Venezuela » Depois dos confrontos que frustraram a entrega de ajuda humanitária, presidente interino vai ao encontro de governos latino-americanos para pedir maior pressão externa sobre o regime chavista de Caracas

O presidente interino autoproclamado da Venezuela, Juan Guaidó, leva hoje aos governos vizinhos que o reconhecem como governante legítimo a demanda de maior pressão internacional para que o presidente chavista, Nicolás Maduro, deixe o poder. Guaidó desembarcou ontem na capital colombiana, Bogotá, que sediará o encontro, no dia seguinte aos confrontos que marcaram a tentativa frustrada da oposição de transportar para o país ajuda humanitária enviada pela fronteira da Colômbia e do Brasil. Os conflitos deixaram saldo de ao menos dois mortos e mais de 300 feridos, além do registro de mais de 60 deserções de militares venezuelanos que pediram asilo nos dois países vizinhos.

“A pressão interna e externa é fundamental para a libertação do país”, afirmou o líder oposicionista ao desembarcar na capital colombiana. Na véspera, ele acompanhou em Cúcuta, na fronteira, os esforços frustrados para que caminhões com toneladas de donativos cruzassem para território venezuelano. Choques entre manifestantes e as forças de segurança se sucederam, assim como ocorreu na divisa com o Brasil, e os veículos que cruzaram a fronteira foram incendiados, do lado venezuelano, por grupos paramilitares chavistas. Guaidó insistiu com a comunidade internacional para que mantenha “todas as opções abertas” no enfrentamento da crise e lancem mão de “todos os meios” para afastar Maduro do poder.

O Grupo de Lima, criado em 2017 para promover uma solução para o impasse político na Venezuela, é integrado por 14 países das Américas, dos quais 11 reconhecem o líder oposicionista como presidente interino. Entre eles estão Brasil e Colômbia, que compartilham as fronteiras terrestres com o país. Será a primeira vez que Guaidó participará, nessa condição, de uma reunião do foro. “O legítimo governo da Venezuela se integra formalmente ao Grupo de Lima”, anunciou o presidente colombiano, Iván Duque. Ele esteve com Guaidó em Cúcuta, no sábado, e ontem percorreu as áreas onde ocorreram os conflitos que deixaram 285 feridos — 255 venezuelanos e 30 colombianos.

O vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, estará hoje em Bogotá para acompanhar, como convidado, a reunião dos chanceleres do Grupo de Lima. Ontem, o secretário de Estado Mike Pompeo manifestou a confiança do governo americano de que os dias de Maduro no poder “estão contados”. “Previsões são difíceis, apontar os dias exatos é difícil”, disse Pompeo à rede de tevê CNN. “Mas acredito que o povo venezuelano vai garantir que os dias de Maduro estejam contados.” O chefe da diplomacia dos EUA condenou as “cenas inacreditáveis” de caminhões com ajuda humanitária queimados por supostos milicianos chavistas e a repressão do regime de Caracas aos voluntários que se mobilizaram para recolher os donativos na fronteira com a Colômbia e o Brasil.

“Vitória”

O governo de Maduro celebrou como uma “vitória” o bloqueio imposto aos comboios de ajuda. “Hoje, consolidamos a vitória de ontem. Amanhã, consolidaremos mais essa vitória: nem um único caminhão com ajuda humanitária passou”, declarou o poderoso líder chavista Diosdado Cabel-lo, em um ato em San Antonio del Táchira, na fronteira com a Colômbia. Acompanhado por generais leais a Nicolás Maduro, Cabello, presidente da Assembleia Constituinte que governa o país com poder absoluto, assegurou que o governo está firme em sua posição. “Nós não nos rendemos nem vamos nos render.”

No sábado, falando a milhares de simpatizantes em Caracas, o presidente chavista anunciou o rompimento de relações diplomáticas com a Colômbia e deu prazo de 24 horas para a partida dos diplomatas do país vizinho. O ministro da Comunicação, Jorge Rodríguez, responsabilizou o governo de Bogotá pela violência na fronteira. “Tudo aconteceu na Colômbia”, afirmou, acusando “manifestantes (da oposição venezuelana) drogados” pela queima dos caminhões que transportavam ajuda.

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Condenação do Brasil

25/02/2019

 

 

 

 

O governo brasileiro atacou ontem duramente o “regime ilegítimo” do “ditador Maduro”, a quem responsabilizou pelas duas mortes registradas no fim de semana em regiões fronteiriças. “ O governo do Brasil expressa sua condenação mais veemente aos atos de violência perpetrados pelo regime ilegítimo do ditador Nicolás Maduro, no dia 23 de fevereiro, nas fronteiras da Venezuela com o Brasil e com a Colômbia, que causaram várias vítimas fatais e dezenas de feridos”, diz a nota divulgada ontem pelo Ministério das Relações Exteriores. O chanceler Ernesto Araújo e o vice-presidente Hamilton Mourão participam hoje, em Bogotá, da reunião do Grupo de Lima.

No texto divulgado pelo Itamaraty, o governo reforça o chamado aos demais países para que apoiem o presidente interino, Juan Guaidó, e os esforços pela transição democrática na Venezuela. “O Brasil apela à comunidade internacional, sobretudo aos países que ainda não reconheceram o presidente encarregado Juan Guaidó, a somarem-se ao esforço de libertação da Venezuela, reconhecendo o governo legítimo de Guaidó e exigindo que cesse a violência das forças do regime contra sua própria população.”

Confrontos se repetiram no posto de fronteira entre os dois países próximo à cidade brasileira de Pacaraima (RR), onde no sábado manifestantes incendiaram um posto de imigração depois que foi barrada a passagem de dois caminhões com donativos. Ontem, cerca de 20 venezuelanos, em território brasileiro, enfrentaram militares venezuelanos, que responderam com gás lacrimogêneo. Com o rosto coberto, os jovens lançaram pedras e outros objetos durante meia hora contra os agentes da Guarda Nacional Bolivariana, que avançou mais do que o costume e se manteve alinhada a 50m do marco fronteiriço.

Do lado brasileiro, militares afastaram os manifestantes e montaram um perímetro de segurança para evitar novos distúrbios. Com um megafone, o coronel Georges Feres Kanaan esclareceu que a fronteira não foi fechada, mas que a zona foi desocupada para proteger a integridade das pessoas.

“Estamos observando para que ninguém se machuque. É um enfrentamento entre civis e militares venezuelanos”, disse o oficial brasileiro.