Correio braziliense, n. 20369, 26/02/2019. Política, p. 4

 

Juiz libera auxílio-mudança

26/02/2019

 

 

Justiça/ Magistrado derruba restrições a benefício pago a senadores e deputados. Câmara deposita dinheiro na conta de 477 parlamentares

Um juiz federal de Sergipe liberou novamente o auxílio- mudança para deputados federais e senadores que foram reeleitos, no valor de R$ 33,7 mil. O benefício pago no início e no fim da Legislatura havia sido restringido pelo juiz Pedro Esperanza Sudário. Quatro dias depois da contra ordem, dada pelo juiz federal Ronivon de Aragão, a Câmara depositou, ontem, o valor na conta de 477 deputados.

Ao todo, foram R$ 16 milhões transferidos para as contas dos parlamentares, incluindo aqueles que foram reeleitos ou que já moravam em Brasília (caso de deputado que virou senador ou vice-versa). Segundo a Câmara, apenas 30 parlamentares informaram abrir mão do benefício. Ao suspender a proibição, Aragão afirmou não ver “qualquer ilegalidade” no pagamento.

Conforme mostrou o jornal O Estado de S. Paulo em novembro passado, a Câmara e o Senado estimavam pagar cerca de R$ 20 milhões para o auxílio a 298 parlamentares reeleitos. No caso desses, teriam direito a receber quase R$ 70 mil cada, pois acumulariam o auxílio do fim do mandato anterior como do início do novo.

A primeira parte do auxílio foi antecipada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ainda em dezembro, quando estava em campanha pela reeleição. O benefício é tradicionalmente pago ao fim do mandato, que acabou em 31 de janeiro, mas foi depositado em 28 de dezembro. Já o depósito aos parlamentares que iniciaram o mandato neste mês estava suspenso por decisão judicial.

“Risco”

Em sua decisão, assinada na quinta-feira passada, Aragão aponta o “risco claro” de o Judiciário se tornar “árbitro da moralidade social” ao analisar contestações fundamentadas apenas na discordância de regras previstas—como no caso do auxílio-mudança, antecipado por decreto legislativo.

“Ao tempo em que se deve admitir como legítima a postura de quem discorda de tais benesses dadas a essas carreiras estatais, também é legítimo considerar que a sua eventual alteração deve, primeiramente, buscar o caminho da legalidade, através dos espaços conformados à atividade legislativa”, escreveu o juiz, ao analisar ação popular. “Discordar do texto normativo é legítimo e isso faz parte da democracia, mas, para sanar tal discordância, existem os meios adequados para fazê-lo, seja por meio da pressão democrática no sentido de alteração da norma, seja em razão de persistir em seu texto alguma inconstitucionalidade, cujo controle abstrato—para as normas federais—está a cargo do STF.”

Aragão ainda afirmou que o argumento contrário ao auxílio mudança dos parlamentares é “legítimo e razoável”, mas também serviria para contestar o pagamento de honorários advocatícios a procuradores e advogados públicos ou até mesmo para criticar juízes e membros do Ministério Público que recebiam auxílio moradia, mesmo que residissem em casa própria.

“Certamente, os ilustres procuradores e advogados públicos defendem- se de quem qualifica de imorais tais atos, trazendo o argumento de que existe lei a amparar o seu direito (com o que concorda este magistrado) e que a lei assim poderia fazê-lo”, observou. “De igual sorte, os magistrados defendiam o direito de percepção do auxílio-moradia, desde quando a Lei Complementar nº 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) previa tal direito, por inexistir moradia oficial disponível ao magistrado na localidade em que exerce a judicatura”, escreveu ainda o juiz federal em sua sentença.