Valor econômico, v.18 , n.4456, 07/03/2018. Política, p. A7

 

STJ nega reurso e abre caminho para prisão de Lula 

Maíra Magro

Fabio Murakawa

 

 

Em decisão unânime, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou ontem um pedido de habeas corpus preventivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A intenção do recurso era impedir o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) de decretar a prisão de Lula assim que julgar os últimos recursos da defesa - o que deve acontecer até abril. Os ministros também recusaram o requerimento de Lula para não se tornar inelegível após a decisão final do TRF-4.

Os cinco integrantes da turma ressaltaram que o Supremo Tribunal Federal (STF) admite a prisão após a condenação em segunda instância. Assim, não caberia ao STJ alterar o entendimento da corte hierarquicamente superior.

Também prevaleceu o argumento de que o STJ não pode impedir uma prisão ainda não decretada pelo TRF-4, já que a defesa aguarda o julgamento de recurso naquela corte.

No começo da sessão, o ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence, advogado de Lula, apontou o que chamou de "abuso kafkiano" na condenação do ex-presidente, seguida de uma "ampliação desatinada da dosimetria da pena", fixada pelo TRF-4 em 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Pertence reclamou de uma "pressão da mídia para forçar a condenação" de seu cliente e se defendeu de afirmações de que estaria fazendo tráfico de influência nos tribunais.

O advogado ressalvou que não entraria em detalhes sobre o mérito da condenação, pois o habeas corpus se limitava a discutir a determinação, pelo TRF-4, de que Lula seja preso assim que esgotados os recursos naquela corte. Pertence pediu à 5ª Turma que alterasse a decisão do TRF-4, na parte que determina a prisão de Lula, ou que suspendesse os efeitos dela até um novo posicionamento do STF.

Em nome do Ministério Público, o subprocurador-geral da República Francisco Sanseverino ressaltou que a jurisprudência atual do STF admite a prisão após a condenação em segunda instância e defendeu que o mesmo posicionamento seja adotado para Lula. "Não há nenhum elemento de diferenciação deste caso em relação ao trazido pelo STF", argumentou.

Primeiro a votar, o ministro Félix Fischer, relator do habeas corpus, rejeitou o pedido da defesa. Para ele, "não se mostra arbitrária, mas inteiramente justificável" a possibilidade de o julgador determinar o cumprimento da pena após esgotados os recursos nas instâncias ordinárias. Além disso, para ele, o STJ não deve analisar o assunto sem que a discussão se esgote no TRF-4.

O ministro Jorge Mussi acrescentou que não haveria ameaça "iminente" à liberdade de locomoção de Lula, uma vez que o TRF-4 ainda não julgou os embargos declaratórios da defesa. Para ele, a presunção da inocência tem que ser contraposta ao interesse estatal de que os condenados cumpram pena em tempo razoável.

Já o ministro Reynaldo Soares da Fonseca considerou que existe, sim, um risco concreto de prisão iminente de Lula. Mesmo assim, em sua visão, o STJ só deve avaliar o assunto após decisão definitiva do TRF-4.

O ministro Ribeiro Dantas questionou: "Como desde já impedir a execução antecipada de uma pena que não se sabe se será aplicada?" E apontou que aguardar a decisão das cortes superiores para determinar o cumprimento da pena pode resultar na delonga dos processos. O ministro Joel Ilan Pacionik acompanhou os colegas apontando que, mesmo que o STF mude de opinião, o precedente válido atualmente admite a prisão após a decisão de segundo grau.

Após a derrota, Pertence defendeu que a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, coloque em pauta "o mais rápido possível" as ações declaratórias de constitucionalidade que contestam a validade da prisão antes de esgotados todos os recursos no Judiciário. Ele ressaltou que o Supremo hoje está dividido e a concessão ou não de habeas corpus para evitar a prisão após a decisão de segunda instância "depende do sorteio do relator". Pertence disse ainda que irá recorrer ao STJ, caso o TRF-4 não altere sua decisão, e também ao STF: "Temos muita luta pela frente."

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Fora da eleição, ex-presidente corre contra o relógio para não ser preso 

Raymundo Costa

07/03/2018

 

 

A decisão de ontem do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçou a posição dos ministros da Suprema Corte que defendem a prisão de réus condenados em segunda instância, com trânsito em julgado, e deixou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais perto de uma cela em Curitiba, onde cumprem pena os acusados de integrar o petrolão, o esquema que desviou bilhões de reais da Petrobras.

A rigor, o julgamento era uma espécie de preliminar de um julgamento que a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, tem se recusado a colocar em pauta. Mas a unanimidade dos votos contrários à defesa de Lula deixa mais confiantes os ministros do Supremo - a quem cabe a palavra definitiva - favoráveis a uma interpretação menos ortodoxa da Constituição e que permite a prisão de pessoas condenadas já na segunda instância. Deixa constrangidos os ministros do STF para revogar uma decisão já ratificada em outras instâncias do Judiciário.

Trata-se de assunto controverso. No último julgamento, a maioria do Supremo - na qual se baseou o STJ - formou-se com apenas um voto de diferença: 6 a 5. Mais tarde, o ministro Gilmar Mendes refletiu melhor e sugeriu que poderia mudar de voto. Ocorre que a ministra Rosa Weber também deu sinais de que poderia rever sua posição - ou seja, o placar não mudaria, pois dois tiveram entendimento diferente da questão. Noviço na corte, Alexandre Moraes tende a votar com a maioria formada em 2016. O ministro Dias Toffoli, próximo presidente do Supremo, tenta articular uma terceira via - a prisão só após condenação do STJ (3ª instância).

A luta de Lula agora é contra o relógio, e a de sua defesa, convencer a ministra Cármen Lúcia a pautar o mais rápido possível no STF. O que não é garantia de sucesso. Na prática, assim que o embargo declaratório que impetrou for negado pelos juízes encarregados da Lava-Jato, Lula pode ser preso a qualquer momento. No entanto, é possível que a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região fique mais para o fim do mês, quando juízes titulares responsáveis pela sentença do ex-presidente estão de volta das férias. O ex-presidente ainda não ganhou uma na Justiça, difícil prever uma revisão de expectativas.

No momento, a prisão de Lula é um problema maior para o PT que sua eventual candidatura às eleições de 2018. O ex-presidente, antes de tudo, tem de evitar ser preso. Ele lidera as pesquisas de opinião com boa vantagem, mas não tem uma dianteira que não possa ser reduzida. Cadeia é cadeia. Em todo o processo, Lula e o PT erraram muito. Mais Lula que o PT. Desde o início os amigos do ex-presidente dos tempos de São Bernardo temiam pela estratégia da defesa. Mas só agora, quando o processo tomou o rumo de Brasília, conseguiram convencê-lo a contratar um peso-pesado: Sepúlveda Pertence.

A menos que ocorra alguma reviravolta inesperada, que não está no radar nem da política nem do Congresso, Lula está fora da sucessão presidencial de 2018 e o que ele e o PT têm a fazer, neste instante, é começar a preparar uma alternativa para as eleições. O ex-presidente deve ter outras condenações até outubro (sítio de Atibaia) e dificilmente o Tribunal Superior Eleitoral deixará que ele se candidate - Lula já é ficha suja - pendurado numa liminar.

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Petista diz que manterá candidatura 

Cristiane Agostine 

Carolina Freitas

07/03/2018

 

 

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que manterá "até o fim" sua pré-candidatura à Presidência, não desistirá e usará todos os meios jurídicos para tentar garantir sua participação na eleição presidencial. Lula disse também que, se for para cadeia, vai se considerar um "preso político".

Ontem, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou por unanimidade o pedido de habeas corpus preventivo para evitar a prisão do ex-presidente antes de esgotados todos os recursos no caso do tríplex em Guarujá (SP). Lula foi condenado a 12 anos e 1 mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em janeiro.

Durante o julgamento do habeas corpus pelo STJ, Lula recebeu integrantes da Central de Movimentos Populares em seu instituto, em São Paulo, e não quis acompanhar o voto dos cinco ministros da 5ª Turma da Corte. O ex-presidente demonstrou otimismo e disse que seus acusadores não têm provas contra ele. Em nenhum momento tratou de um plano B, segundo relatos de quem participou do encontro. "Ele disse que não vai desistir e vai levar a candidatura até o fim", afirmou o coordenador da Central de Movimentos Populares, Raimundo Bonfim.

Depois de ter se informado sobre o resultado do julgamento, Lula reuniu-se com o ex-prefeito Fernando Haddad, coordenador de seu programa de governo e cotado como plano B do PT se Lula for impedido de disputar.

Pela manhã, antes da sessão do STJ, o ex-presidente disse ter a expectativa de reverter sua condenação. "Espero que a decisão do TRF-4 seja revista para não me transformarem em preso político", disse em entrevista à Rádio Metrópole, de Salvador (BA). "Eles vão ter que arcar com o preço de decretar minha prisão." Lula reiterou que não vai fugir, caso seja decretada sua prisão - o que pode acontecer ainda neste mês, assim que o TRF-4 analisar os embargos. "Estarei na minha casa. Eu acredito tanto na Justiça que estou recorrendo."

O ex-presidente refutou as acusações de que é alvo, entre elas de ter cometido crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Apesar de pedir que a Justiça deixe "o povo brasileiro" julgá-lo "em outubro", nas eleições, Lula reconheceu que pode estar fora do pleito. "Se eu estiver com a ficha suja eles não vão deixar meu nome entrar na cédula", disse. "De qualquer maneira, quero ser pessoa de muita influência na política, andar pelo país", afirmou. ""Estou nessa agonia, esperando o bom senso da Justiça."

Com derrota de Lula no STJ, o PT pediu urgência no julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a prisão depois da condenação em segunda instância e o caso de Lula. Em nota, o partido disse que o Supremo não pode se omitir na defesa da Constituição, nem decidir "à luz da agenda política".

"É urgente o Supremo Tribunal Federal julgar as ações que defendem o princípio constitucional da presunção de inocência. Ninguém, seja Lula ou qualquer outro cidadão brasileiro, pode ser privado da liberdade antes do trânsito em julgado na última instância", disse o PT, em documento assinado pela presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), pelo líder do partido na Câmara, Paulo Pimenta (RS), e do líder no Senado, Lindbergh Farias (RJ). "O Supremo Tribunal Federal tem a obrigação de se pronunciar urgentemente, em duas ações que estão prontas para julgamento. Estas ações não tratam do caso Lula, embora ele seja vítima do polêmico entendimento repetido pelo STJ. Trata-se de restabelecer plenamente um dos mais caros princípios constitucionais, que diz respeito a todos os cidadãos".