Correio braziliense, n. 20371, 28/02/2019. Política, p. 2

 

Carta branca para agilizar a reforma

Rodolfo Costa

28/02/2019

 

 

Presidente Jair Bolsonaro deu autonomia para o ministro Onyx Lorenzoni fazer a interlocução entre parlamentares e ministérios, em prol do projeto previdenciário. Os deputados Major Vitor Hugo e Joice Hasselmann integram a força-tarefa

A Casa Civil vai capitanear a articulação política direta com os demais ministérios. Em prol da construção de uma base de apoio para a aprovação da reforma da Previdência, o ministro-chefe da pasta, Onyx Lorenzoni, recebeu autonomia do presidente Jair Bolsonaro para dialogar diretamente com os ministros de Estado e dar diretrizes sobre como atender as demandas de parlamentares. A força-tarefa começa hoje, em uma reunião no Palácio do Planalto com secretários executivos e assessores parlamentares da Esplanada dos Ministérios.

O articulador político de Bolsonaro já tinha certa independência para promover as interlocuções. Mas, após ouvir críticas explícitas dos líderes sobre a falta de atendimento nos ministérios, na reunião com as lideranças na terça-feira, o presidente acenou aos expoentes das bancadas aliadas que ampliará a autonomia de Onyx na coordenação de governo. A ideia, explica um líder presente no encontro, é que ele tenha carta branca para dar direcionamento aos ministros sem relatar cada passo ao chefe do Executivo federal. “O presidente quer apenas respostas e soluções rápidas em troca”, explicou.

A reunião de hoje entre Casa Civil e secretários executivos e assessores parlamentares tem por objetivo orientar os ministérios sobre como atender os deputados. A ideia é que, se necessário, reajustem as agendas para acomodar o atendimento a deputados e senadores, sobretudo pela manhã. As sessões legislativas costumam ser mais intensas no período vespertino. A falta de contato é o que mais tem desagradado a aliados do governo.

Na Câmara e no Senado, as principais reclamações são sobre a falta de atenção dada pelos ministros. No PR, por exemplo, há parlamentares que não conseguiram sequer ser recebidos por ministros para audiências após quatro solicitações. “É algo disseminado no governo. Os ministros não estão tendo a atenção devida para receber a bancada”, criticou o deputado José Rocha (PR-BA), líder da legenda na Câmara. A crítica, entretanto, é generalizada. Na reunião entre Bolsonaro e líderes, todos se manifestaram sobre a ausência de comunicação entre ministros e deputados. Quando conseguem marcar uma audiência, é no meio para o fim da tarde, o pior horário para um parlamentar — é quando costumam participar da Ordem do Dia no Parlamento.

Os deputados e senadores têm demandas diversas. Entre elas, o interesse em indicar apadrinhados e viabilizar recursos de emendas impositivas — aquelas em que o governo é obrigado a executar — para o investimento em obras e serviços públicos nos estados e municípios. O argumento dos congressistas é de que, como fiscalizadores do Executivo em todas as esferas do poder, eles precisam dar respostas aos eleitores e aliados em suas bases.

Urgência nas verbas

A liberação de recursos ainda está em fase de estudos. A Casa Civil pediu que o Ministério da Economia cuide disso com urgência. A promessa é de que, diferentemente do início de outros governos, as verbas para as emendas impositivas não sejam contingenciadas, corrobora o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA). O prazo para as transferências, no entanto, ainda é incerto. “O ministro Onyx trabalha para que ocorra até abril”, disse um interlocutor.

O encontro de hoje entre Casa Civil e os secretários executivos dos ministros dá continuidade ao processo de articulação. Na última semana, Onyx cobrou o mapeamento de cargos de livre nomeação para abrigar aliados políticos na administração pública direta e indireta, na Esplanada, em autarquias, e em empresas públicas. A meta é que as reuniões possam ocorrer semanalmente para fazer análises e reavaliações dos atendimentos aos parlamentares.

A Casa Civil quer dar unidade às articulações. Além de Onyx e auxiliares, atuam nas interlocuções o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), e a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP). Amanhã, eles se reúnem para delinear como cada um atuará depois do carnaval. Há, também, um empenho de comunicação em transparecer à imprensa e aos eleitores que os diálogos são estritamente republicanos, sem o toma lá da cá.

As conversas com os parlamentares, defende Joice, são apenas o amadurecimento de uma conversa. “Nosso presidente sempre foi muito claro quando diz que não haverá toma lá da cá. O problema não é a indicação, e, sim, a corrupção. O que o governo sempre disse é que as pessoas (indicadas) serão qualificadas para aqueles espaços. Todas com passado ilibado. Qual o problema disso? Existem, claro, espaços para serem ocupados. A gente vai colocar inimigos?”, rebateu. (Colaborou Bernardo Bittar)

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De olho na espinha dorsal

Alessandra Azevedo

Gabriel Ponte

28/02/2019

 

 

 

 

A reforma da Previdência nem começou a tramitar e o governo já admite recuar em assuntos críticos, como as regras propostas para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e para a aposentadoria rural. O ministro da Economia, Paulo Guedes, está disposto a conversar sobre os “pontos de resistência”, desde que a economia aos cofres públicos continue na casa de R$ 1 trilhão em 10 anos, disse ontem à recém-escolhida líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP).

A cifra é “inegociável”, segundo a parlamentar. Embora continue ambiciosa, pode ser entendida como uma flexibilização de até R$ 160 bilhões já na largada — a estimativa inicial é de R$ 1,16 trilhão em uma década. “O ministro (Guedes) disse que não está fechado para a discussão do texto. Mas não dá para se aprovar uma reforma pela metade, ou seja, ‘manca’. Precisamos da aprovação de uma reforma que signifique uma economia de trilhão”, reforçou Joice, após almoço na Residência Oficial da Presidência da Câmara.

Também participaram do encontro o ministro Paulo Guedes e os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP), respectivamente. Os parlamentares apresentaram as questões que podem atrapalhar a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019, da Previdência, no Congresso. O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apontado como um dos candidatos a relator da matéria na Câmara, também participou do almoço, mas não foi confirmado na função.

O governo sabe que a reforma não passará sem alterações em pontos polêmicos, o que inclui o BPC, cujas mudanças têm sido fortemente criticadas por parlamentares da base. Pela proposta, idosos de baixa renda, que hoje têm direito a um salário mínimo (R$ 998) mensal quando completam 65 anos, só receberão esse valor aos 70. Em contrapartida, a equipe econômica sugere antecipar o pagamento do benefício para os 60 anos de idade, mas até os 70 seria de R$ 400 mensais.

O BPC é considerado um dos “bodes” que o governo tiraria da sala, durante as negociações, com o intuito de avançar no andamento da reforma no Congresso. “Tirar o BPC é uma frase muito forte. Estamos conversando sobre o tema com Paulo Guedes e o presidente da República. A gente vai dialogar, mas não sabe se o BPC será flexibilizado, se vai haver outro ponto”, ponderou Joice. Ela reforçou que não se pode “desfigurar a espinha dorsal” do projeto.

Outro ponto muito criticado é a aposentadoria rural. A PEC traz uma cobrança de contribuição anual dos trabalhadores da agricultura familiar, para coibir fraudes. Recentemente, Maia disse que o problema pode ser resolvido por medida provisória. Além disso, a proposta do governo também iguala idades mínimas de aposentadoria para homens e mulheres do campo, em 60 anos, o que a oposição tem classificado como injusto. A limitação no acúmulo de pensões e aposentadorias é alvo de críticas, especialmente dos servidores públicos, que costumam receber os maiores benefícios.