O globo, n. 31288, 06/04/2019. País, p. 4

 

Divórcio iminente

Alan Gripp

Paulo Celso Pereira

06/04/2019

 

 

Bolsonaro sinaliza demissão de Vélez ao dizer que vai ‘tirar a aliança’ da mão direita

O presidente Jair Bolsonaro prometeu ontem pôr fim, segunda-feira, na crise que atinge o Ministério de Educação (MEC) desde o início do governo. E a solução pode passar pela demissão do ministro Ricardo Vélez Rodriguez. A afirmação foi feita durante um café da manhã de uma hora no Palácio do Planalto com um grupo de 15 jornalistas, entre colunistas e chefes de redação de diversos veículos. No encontro, do qual O GLOBO participou, o presidente abordou ainda a tensa relação com o Congresso, admitiu abrir mão de pontos da reforma da Previdência e desculpou-se pelo que chamou de “caneladas”. Se a saída de Vélez for confirmada, ele será o segundo exonerado por Bolsonaro desde a posse. Em fevereiro, o ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, foi o primeiro. — Está bastante claro que não está dando certo o ministro Vélez. É uma pessoa honrada, mas está faltando gestão. Na segunda-feira, vamos tirar a aliança da mão direita, ou vai para a esquerda ou vai para a gaveta — disse o presidente, acrescentando que a decisão já está tomada. Vélez, que está em Campos do Jordão (SP) para participar como palestrante de um fórum empresarial, afirmou que não pretende entregar o cargo. Em meio à disputa de poder dentro do MEC, pelo menos 16 pessoas do alto escalão já foram demitidas desde janeiro. Alguns dos exonerados eram ligados ao ideólogo da direita Olavo de Carvalho. Bolsonaro, no entanto, negou que Carvalho tenha influência na pasta:

— Tem pouca gente do Olavo de Carvalho na Educação. Ele teve uns 8.000 alunos à distância.

Falta 'habilidade política'

O presidente deixou claro durante a conversa que está disposto a conversar com caciques dos partidos do Congresso e atender algumas de suas demandas, mas reafirmou que não irá trocar cargos por apoio parlamentar. Sem tergiversar, admitiu que parte das arestas com a classe política se deve à pouca intimidade de sua equipe com o parlamento: —A maioria dos ministros não tem nenhuma habilidade política. Vivência política. Ontem, alguns (presidente de partido) reclamaram de ministros, de bancos oficiais... O presidente da Caixa recebe umas 20 ligações e não tem como atender. Mas tem que ter alguém que atenda. Muitas vezes, o pedido é uma coisa simples, às vezes cabe a ele só colocar uma assinatura —pontuou. O presidente disse que a única preocupação em relação ao Congresso é com a votação da reforma da Previdência. Um dos temores no parlamento é justamente a possibilidade de a relação entre Executivo e Legislativo piorar após o projeto prioritário do Planalto ser aprovado. —A não ser a Previdência, não temos outra medida que tenhamos de forçar a barra para aprovar — destacou Bolsonaro. O presidente, no entanto, fez uma avaliação positiva da conversa com os presidentes de partidos na quinta-feira. Ele recebeu os presidentes do PRB, PSD, DEM, PP, PSDB e MDB no Planalto. Para o presidente, eles entenderam a nova forma de fazer política que o governo deseja. — Ninguém falou em cargo ontem. No dia anterior, o vice (Hamilton Mourão) falou em cargo, mas não aconteceu. Matamos no peito — afirmou, destacando, no entanto, que não ficará restrito às cúpulas das legendas: — Estamos conversando com a elite (política), mas também com o baixo clero. Eu sempre fui baixo clero. Uma das reclamações dos presidentes de partidos, segundo Bolsonaro, é com a divisão frequentemente feita pelo governo entre “nova” e “velha” política. O presidente disse que está conversando inclusive com os subordinados para evitar melindrar a classe política com essa classificação. — Eles não querem mais falar em nova e velha política. Tenho conversado com todos (os ministros) para darem uma segurada. Até semanas atrás, o governo tentava construir uma base sem vinculação com os partidos. Não funcionou. Em dois meses, o Planalto sofreu derrotas e conseguiu pouco apoio de fora de seu partido, o PSL. Indagado sobre a baixa adesão das bancadas temáticas da Câmara, Bolsonaro mostrou-se incomodado: — A bancada ruralista, eu escolhi o ministro que eles indicaram. Não foi lista tríplice, foi quem eles indicaram. Saúde, com o Mandetta, foi a mesma coisa. O do Turismo, a mesma coisa.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

‘Vou me arrepender porque fiz xixi na cama aos 5 anos? Saiu, pô’

06/04/2019

 

 

Em clima descontraído, presidente lembra de polêmicas passadas

“Presidente, posso fazer uma rápida introdução?”, disse o portavoz da Presidência, general Rêgo Barros, pedindo autorização a Bolsonaro para dar início ao café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto. “Claro, rapaz, você é general, eu sou capitão!”, devolveu o presidente.

Em clima descontraído, Bolsonaro recebeu jornalistas e, no estilo “sincerão”, respondeu da mesma forma a todas as perguntas (ao todo, foram 31), da exploração do nióbio ao modo como administra sua conta no Twitter. Nesse tempo, tomou dois copos de suco de laranja, café com leite, comeu um pedaço de bolo de coco e deu uma mordida em um pão de queijo. Deu muita risada de si mesmo ao lembrar das polêmicas que causou no passado, que chamou de “caneladas”. —Tem vídeo meu que circula e eu penso: falei isso mesmo? Mas disse que não se penitencia por afirmações feitas em outros contextos. —Vou me arrepender porque fiz xixi na cama aos 5 anos? Saiu, pô! Além do porta-voz, Bolsonaro estava acompanhado dos ministros Sérgio Moro (Justiça), Augusto Heleno (Segurança Institucional), Floriano Peixoto (Secretaria-Geral) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil) —que por vezes tentou amenizar frases do chefe, especialmente relacionadas à Reforma da Previdência. Em sua introdução, no entanto, o presidente fez questão de citar Paulo Guedes (Economia), ausente.

— O mais importante ministro é o da Economia. Durante o encontro, Bolsonaro citou reportagens críticas a ele. Mas evitou queixas. Chegou a fazer sugestões aos jornalistas, como a de entrevistar o secretário da Pesca, Jorge Seif, que, em suas palavras, está “revolucionando” o setor. Nesse momento, aproveitou para dar uma estocada em um ex-aliado, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, que era responsável pela área no governo Dilma Rousseff. —Tinha ministro da pesca que não sabia botar minhoca no anzol —disse, citando uma declaração polêmica de Crivella em 2012. Bolsonaro, que usava uma pulseira com o versículo da Bíblia Apocalipse 12:11 (“E eles o venceram pelo sangue do cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não amaram as suas vidas até a morte”), foi instado a enumerar as marcas de seus primeiros 100 dias. Citou a transparência e a escolha técnica dos ministros, mas logo em seguida emendou: —O mais importante é que não fomos acusados de nada que os outros foram. Perguntado sobre as polêmicas envolvendo os filhos nas redes sociais, disse: —O que meu filho posta é responsabilidade dele. Ninguém tem mais controle de mídias sociais. Ali é liberdade pura —reconhecendo que terceiros (sem nominálos) fazem posts em seu nome, com sua autorização. —A responsabilidade é toda minha. Quem tem a senha (nas redes sociais), tem a minha confiança. Um dos jornalistas quis saber se Sergio Moro tem o desejo de, um dia, sentar na cadeira de Bolsonaro, que brincou com a pergunta: —Na campanha, eu disse que em janeiro ou estaria aqui nessa cadeira ou na de praia. Me dei mal (risos). Pode assumir a cadeira, Moro!

No fim do café da manhã, brincou com a foto ao lado dos jornalistas que participaram do encontro, uma tradição adotada há vários governos. —Muita gente não queria estar aqui nessa foto não — riu.