Título: Dois réus condenados
Autor: Abreu, Diego ; Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 06/09/2012, Política, p. 3

Maioria dos ministros do Supremo vota a favor da punição de ex-dirigentes de instituição financeira por gestão fraudulenta. Pena será decidida apenas no fim do julgamento

Seis dos 10 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram ontem pela condenação de dois réus que integravam a cúpula do Banco Rural. Embora quatro magistrados ainda tenham direito a voto no item 5 do julgamento, já há maioria pela condenação por gestão fraudulenta dos ex-executivos Kátia Rabello e José Roberto Salgado. A análise terá continuidade hoje à tarde, quando Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ayres Britto ainda se pronunciarão sobre o capítulo em debate. Basta mais um voto para a condenação do atual vice-presidente da instituição bancária Vinícius Samarane, e para que a ex-vice-presidente Ayanna Tenório seja absolvida.

Revisor do processo, o ministro Ricardo Lewandowski, que, na última segunda-feira, havia votado pela condenação de Kátia Rabello e José Roberto Salgado, absolveu ontem os outros dois réus ligados ao Banco Rural. Ele frisou que a ex-vice-presidente da instituição Ayanna Tenório exercia função focada na área de apoio, não sendo responsável por avalisar empréstimos. Lewandowski citou a "candura" de Ayanna, que chegou ao banco em 2004, após ter passado por empresas de diferentes setores.

"Ela exercia uma função claramente de logística. Não se envolveu nos empréstimos que originaram esta ação penal. Não fiquei convencido de que a ré Ayanna Tenório tenha agido de forma fraudulenta e ardilosa na gestão de instituição financeira", destacou o revisor do processo antes de absolvê-la por falta de provas.

Lewandowski também inocentou Vinícius Samarane, que, na época dos fatos, era subordinado a Ayanna Tenório. Segundo o revisor, Samarane era um "mero empregado do Banco Rural, ainda que com o título pomposo de superintendente". Ele acrescentou que o réu não conhecia o empresário Marcos Valério e nem seus ex-sócios e que o poder de decisão em relação aos empréstimos não estava em suas mãos. "Ainda que Vinícius Samarane tivesse se manifestado seria absolutamente inócuo", observou o revisor.

Rosa Weber concordou com Joaquim Barbosa em relação à condenação de três réus, mas seguiu Lewandowski em um único ponto, absolvendo Ayanna Tenório. O voto de Rosa foi seguido por Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. "Foram desacatadas as regras mais elementares. O que ocorreu foge à ordem normal por conta da falta de preocupação com a liquidez. São empréstimos jamais cobrados. Houve um acerto da tese da acusação no sentido de se tratarem de simulacros fraudulentos", afirmou Rosa.

Para absolver Ayanna, Rosa Weber lembrou que a acusada de fato conduziu a área de prevenção à lavagem de dinheiro do Banco Rural, mas só depois de janeiro de 2005. Já para condenar Samarane, a ministra alegou que, embora ele não tenha participado diretamente da concessão e da renovação dos empréstimos, ele teria agido para fraudar relatórios que omitiram os problemas.

Provas Quarto a votar no julgamento, Luiz Fux admitiu que já tinha voto pronto pela condenação dos quatro acusados. No entanto, a partir do posicionamento do revisor, disse ter chegado à conclusão de que não há provas suficientes para a condenação de Ayanna. "Concluo que, infelizmente, a entidade bancária serviu de uma verdadeira lavanderia de dinheiro para se cometer o crime que nem está previsto, o de gestão tenebrosa. São abundantes as provas contra cada um dos acusados, com a partilha de tarefas nessa espécie de delinquência", afirmou Fux, adiantando que deve condenar os réus por lavagem de dinheiro.

Já Dias Toffoli afirmou que o Banco Rural não cumpriu as regras do Banco Central. "Houve inequívoca prática de condutas divorciadas das normas e regulamentos que concernem à atividade bancária", frisou. Mais rápida a votar, a ministra Cármen Lúcia usou apenas 13 minutos para condenar três réus e absolver Ayanna Tenório. Ela seguiu o entendimento de outros magistrados de que os empréstimos concedidos ao PT e às empresas de Valério eram fictícios. "Houve risco banqueiro", decretou a ministra. "Foi possível constatar uma ruptura frontal de regras legais, penais, de normas do Banco Central e de regras internas do próprio Banco Rural com relação à segurança e à garantia das operações", acrescentou.

Advogado de Salgado, Márcio Thomaz Bastos não quis comentar o resultado parcial do julgamento. "Vamos esperar amanhã (hoje) quando tiver tudo definido", disse. O defensor de Kátia Rabello, José Carlos Dias, limitou-se a comentar que a situação ficou "ruim". O advogado de Samarane, Maurício Campos Júnior, alertou que seu cliente não tinha a função de gestor. Ele prefere aguardar o fim da análise do item 5 para comentar os votos dos ministros. A pena para o crime de gestão fraudulenta varia de três a 12 anos. Portanto, não há risco de prescrição, pois as penas superiores a dois anos só vão prescrever em 2015.

"Foram desacatadas as regras mais elementares. O que ocorreu foge à ordem normal por conta da falta de preocupação com a liquidez. São empréstimos jamais cobrados" Rosa Weber, ministra do STF