Correio braziliense, n. 20407, 05/04/2019. Política, p. 4

 

A batalha solitária de Paulo Guedes

Hamilton Ferrari

Rodolfo Costa

05/04/2019

 

 

Poder/ Técnicos do governo analisam como positivo o desempenho do ministro na CO, mas reclamam da base aliada, que deixou o titular da Economia exposto a ataques da oposição

A leitura da equipe econômica é a de que a última audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) sobre a reforma da Previdência expôs, de forma clara, a má articulação da base aliada, o que possibilitou as provocações da oposição. A atuação do ministro da Economia, Paulo Guedes, na avaliação de técnicos do governo, cumpriu as expectativas dos parlamentares, mas ele acabou exposto a ataque devido à ausência de apoiadores.
Mesmo após o episódio de enfurecimento de Guedes, ao ser chamado de “tigrão” e “tchutchuca”, parlamentares e integrantes da equipe econômica não viram a participação do ministro como negativa. Os deputados entendem que ele respondeu as perguntas durante mais de sete horas com argumentos técnicos e precisos, apesar do enfrentamento da oposição.
O problema foi a sensação de falta de “guarda-costas”, segundo um integrante da equipe econômica. Interlocutores que estiveram com o ministro ontem disseram que ele ficou devastado com o constrangimento ao qual foi submetido. Mas, apesar do aborrecimento, não entregará os pontos. “Quem conhece o ministro sabe o quanto ele está comprometido com os projetos de mudanças no país, a começar pela reforma da Previdência”, diz um amigo.
Guedes ficou surpreso com a organização da oposição e com a falta da ação da base. Ele reconhece que errou em alguns momentos, ao aceitar as provocações. Mas não se arrepende de ter partido para o confronto com o deputado Zeca Dirceu (PT-PR), que o chamou de “tigrão” e “tchutchuca”.
Para um integrante da equipe econômica, ficou claro que a equipe tem um grande centroavante, mas parece que não há defesa. “O time que está aí ainda não está bom. Não deu cobertura. O adversário (oposição) soube jogar contra, e nós precisamos reforçar a nossa defesa”, lamentou. “Nós ainda não temos base. O PSL é um partido novo, que ainda não se acertou ainda. A oposição, marota e experiente que é, tomou conta da CCJ. A oposição cresceu, porque estava morta, com essa estratégia de ocupar os espaços vazios da base. É uma questão de inexperiência”, acrescentou.
“Leões”
Guedes, porém, não jogou a toalha. “Pelo contrário. Tem certeza de que esse é o caminho e que é preciso ajudar Onyx (Lorenzoni, ministro da Casa Civil) na formação dessa base. Não podemos esperar que eles façam. Temos de atuar junto”, afirmou. Esse tem sido o papel do ministro. Nas últimas semanas, ele se reuniu com parlamentares e, especialmente, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). De certa forma, a articulação de Guedes é feita para suprir a falta de organização do Palácio do Planalto.
Quem conhece o ministro espera que a reação do governo, mais precisamente do presidente Jair Bolsonaro, seja contundente em defesa do ministro. “O Palácio do Planalto precisa mostrar, de forma enfática, que não deixará o ministro sozinho, entregue aos leões”, assinala um outro técnico da equipe econômica. Entre os auxiliares de Guedes, a determinação é para que a “guerra pela nova Previdência” seja levada adiante.
O presidente do DEM, ACM Neto, avalia que a oposição “passou dos limites na provocação”. “Fui parlamentar durante 10 anos. Era de oposição, muito combativo, mas eu tinha respeito. A institucionalidade da função de quem estava diante de mim, no caso, estava diante da oposição o ministro da Fazenda, que, por sua própria vontade, foi à CCJ tratar da reforma da Previdência”, afirmou. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, entende que o ministro se saiu bem, mostrando coragem e conhecimento.
Descontentamento
“Ele sabia que ia enfrentar os deputados da oposição. Foi lá, todos sabem, para conversar com todos da oposição. Alguns que combatem o programa por convicções e outros politicamente”, disse Kassab. “É um brasileiro que vai trabalhar pelas reformas. Acredito que sua ida deu contribuição significativa para que possamos ter o projeto aprovado”, completou.
Na interpretação do cientista político Cristiano Noronha, analista da Arko Advice, Guedes não está sendo um articulador, pois é natural que o ministro idealizador da reforma da Previdência se encontre com os parlamentares. “O ministro demonstrou que domina o tema e apresentou, durante sete horas, argumentos sólidos em defesa da proposta”, ressalta. “A maior parte dos parlamentares com quem eu conversei, com exceção da oposição, disse que ele cumpriu as expectativas.”
Noronha também entende que o Palácio do Planalto tem falhado na articulação política, deixando a equipe econômica descoberta. “A ida deixou evidente que existe um descontentamento de alguns partidos que potencialmente podem ser aliados e que não estavam presentes. Eles não se sentem devidamente atendidos pelo governo, como o PP, PR e MDB. Formalmente, não se consideram da base e entendem que não vale a pena se expor num tema negativo, como a reforma, se não sabem qual é avaliação do governo. Isso provocou o predomínio de parlamentares de oposição”, frisa. “O recado que o Centrão deu é que pode votar a favor, mas não vai assumir o ônus de imagem negativa sem ser tratado de forma adequada pelo governo.”