O globo, n. 31342, 30/05/2019. País, p. 6

 

Bolsonaro descarta editar decreto sobre Coaf

Jussara Soares

Eduardo Bresciani

30/05/2019

 

 

Um dia depois de dizer que ‘com a caneta, tem muito mais poder’ do que o Legislativo, presidente nega que lançará mão desse expediente para devolver órgão ao Ministério da Justiça. Maia minimizou a declaração

Sem crise. O presidente da Câmara contemporizou a frase de Bolsonaro: ‘Não vamos criar maldade onde não existe’

Um dia depois de dizer que “com a caneta, tem muito mais poder” do que o Legislativo, referindo-se à sua prerrogativa de editar decretos, o presidente Jair Bolsonaro disse ontem que não pretende lançar mão desse expediente para levar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) de volta ao Ministério da Justiça.

Na noite anterior, o Senado manteve a transferência do órgão, aprovada pela Câmara, para o Ministério da Economia. A decisão foi tomada na votação da medida provisória (MP) que reestruturou o governo, reduzindo de 29 para 22 pastas. Bolsonaro indicou ainda que sancionará o texto sem vetos.

—O Parlamento agiu legitimamente corrigindo o que eles achavam que tinham que corrigir. O Coaf continua no governo —disse Bolsonaro ao deixar a sede da Marinha, onde esteve para parabenizar o comandante da força, almirante Ilques Barbosa, pelo aniversário de 65 anos.

Como a MP perderia a validade na próxima segunda-feira, Bolsonaro havia feito um apelo para que o Senado não fizesse modificações no texto. Caso isso ocorresse, a medida provisória teria que voltar para a Câmara.

Questionado se poderia fazer um decreto para devolver o Coaf a Moro, o presidente sinalizou com a cabeça que não.

Panos quentes

Nas redes sociais, o presidente considerou a aprovação da MP com a redução dos ministérios um “saldo positivo”, mas não comentou a transferência do Coaf para a pasta da Economia, considerada uma derrota para o governo.

“Aprovada ontem, no Senado, a MP 870. Redução dos ministérios mantida. Saldo positivo! Demos um passo importante para a redução do estado, compromisso que assumimos desde o início. Parabéns a todos pela consciência do momento de mudança e renovação que estamos vivendo”, escreveu.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), minimizou ontem a declaração de Bolsonaro sobre seu poder de editar decretos:

— Ele fala da questão do decreto na importância que um bom decreto tem na regulamentação da lei. Não tem maldade nenhuma. Não vamos criar maldade onde não existe — disse Maia após participar, ao lado de Bolsonaro, de sessão da Câmara em homenagem ao humorista Carlos Alberto de Nóbrega.

Questionado sobre como estão as relações com o Executivo, voltou a minimizar a frase:

— Não vou entrar numa frase que eu sei em qual contexto ele falou pra mim e não teve maldade nenhuma. Vamos manter o ambiente distensionado — disse o presidente da Câmara. — Precisa mais de diálogo e proximidade do que conflito.

A declaração de Bolsonaro foi dada em uma solenidade horas depois de se reunir co m os chefes dos outros Poderes para articular um “pacto republicano”. O gesto do presidente ocorreu dois dias após atos de rua favoráveis a seu governo e com críticas ao Legislativo e ao Judiciário.

Apesar de ser um dos principais defensores da reforma da Previdência, Maia foi um dos alvos dos manifestantes. Ele já teve bate-bocas públicos com Bolsonaro por divergências quanto à articulação política do governo para aprovar a proposta.

‘Eu disse para ele, Maia: com a caneta, eu tenho muito mais poder do que vocês, apesar de você fazer leis. Tenho o poder de fazer decretos’

Jair Bolsonaro, anteontem, após reunião com Rodrigo Maia

‘Ele fala da importância que um bom decreto tem na regulamentação da lei. Não vamos criar maldade onde não existe’

Rodrigo Maia, presidente da Câmara