Título: Processos travados na Justiça
Autor: Mader , Helena
Fonte: Correio Braziliense, 02/09/2012, Política, p. 4

Ao contrário do processo criminal, que está prestes a ser encerrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), as ações de improbidade administrativa contra os acusados do mensalão se arrastam com lentidão. Cinco anos depois de o Ministério Público Federal (MPF) ter apresentado à Justiça o pedido para processar os réus na esfera cível, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) ainda não decidiu sequer se acolhe as ações propostas pelos procuradores da República. Em 2007, o MPF abriu processo para apurar o enriquecimento ilícito de 37 pessoas, quase todas denunciadas também criminalmente por envolvimento no mensalão. Ao todo, foram cinco ações de improbidade, separadas por partidos políticos. Alguns dos acusados, como José Dirceu, Delúbio Soares e Marcos Valério, aparecem nos cinco processos. A Justiça Federal ainda não analisou o mérito de nenhuma das ações, mas há divergências do ponto de vista formal entre o TRF e o Ministério Público. Por conta disso, um dos casos foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Se condenados por improbidade, os réus poderão ter os direitos políticos suspensos por até 10 anos, terão que ressarcir integralmente os valores desviados e ficarão proibidos de contratar com o poder público. O montante a ser devolvido aos cofres públicos só é definido ao fim do processo, em caso de condenação. Toda a investigação que embasou a Ação Penal 470, em andamento no Supremo, servirá de prova para os processos na área cível.

As cinco ações apresentadas pelo MPF abrangem ex-deputados e representantes do PMDB, do PL, do PT, do PP e do PTB, além de integrantes dos chamados núcleos político, financeiro e publicitário. Elas foram apresentadas ao TRF-1 em agosto de 2007 e distribuídas a varas diferentes. Em uma das ações, a Justiça decidiu excluir parte dos réus, como José Dirceu e Anderson Adauto, por "atipicidade das condutas atribuídas aos acusados". Como eles eram ministros à época, o Judiciário entendeu que pessoas com prerrogativa de foro não poderiam responder concomitantemente a ações de improbidade e também por crime de responsabilidade e, por isso, não acatou a ação contra esses réus. Mas o MP entende que o acusado pode responder, ao mesmo tempo, cível, penal e administrativamente e, por isso, recorreu.

Irregularidade

O tribunal recusou o recurso com o argumento de que havia uma irregularidade formal no pedido. Segundo o TRF, o MP apresentou um recurso de apelação, quando a medida adequada seria um agravo de instrumento. Os procuradores da República recorreram então ao STJ para rever o tema com relação à questão formal. O relator do caso, ministro Humberto Martins, que em maio havia rejeitado o recurso apresentado pelo MP, reviu o posicionamento e admitiu a possibilidade de manter todos os réus na ação. O ministro César Asfor Rocha seguiu o relator e, em sessão realizada na última terça-feira, o ministro Mauro Campbell pediu vista do processo, que pode ser retomado na próxima sessão da 2ª Turma. Por conta desse recurso, a 9ª Vara Federal suspendeu o andamento de outras ações de improbidade até que o STJ se posicione sobre o processo questionado.

A procuradora da República Anna Carolina Resende, que, com outros dois colegas, assinou as ações de improbidade em 2007, explica que esse tipo de processo cível costuma demorar mais do que os criminais, já que normalmente as ações envolvem número alto de acusados e é preciso notificar todos a apresentarem defesa prévia. Mas, no caso dos cinco processos de improbidade contra os réus do mensalão, a procuradora conta que a lentidão está maior do que o habitual. "A Justiça não costuma levar mais do que dois anos para receber uma ação de improbidade. Mas, nesse caso, já faz cinco anos. Essas ações tiveram uma dificuldade especial e o trâmite está mais lento do que a média", comentou.

A procuradora está otimista de que a Justiça vai acatar todas as ações. "Quando deixou de receber, o magistrado não fez juízo de valor sobre os fatos, só alegou a questão da prerrogativa de foro e argumentou que os réus respondiam a outras ações e que, por isso, os processos estavam sendo pulverizados", comenta Anna Resende. Os processos estão na Justiça Federal do DF, mas a maioria dos acusados mora fora da capital federal. Nesses casos, é preciso comunicar os réus por carta precatória. Depois de cinco anos, a Justiça não conseguiu até hoje notificar pelo menos um dos réus: Lúcio Funaro, que escapou da ação penal do mensalão no Supremo porque fez acordo de delação premiada, ainda não foi oficialmente comunicado a apresentar defesa prévia na ação de improbidade que envolve réus do PL.

"A Justiça não costuma levar mais do que dois anos para receber uma ação de improbidade. Mas, nesse caso, já faz cinco anos" Anna Carolina Resende, procuradora da República

Cinco anos Não há mais risco de os processos de improbidade administrativa prescreverem. Segundo a legislação, o Ministério Público Federal teria cinco anos a partir dos fatos para apresentar a ação. Como o caso chegou à Justiça em 2007, o trâmite no Tribunal Regional Federal pode se alongar pelo tempo que for, que as acusações de improbidade não correm risco de prescrever.

Interpretação

Veja o que diz o Ministério Público

» Os atos de improbidade administrativa teriam sido perpetrados por agentes públicos federais, no exercício de suas funções, e por terceiros, principalmente deputados e líderes particulares, que concorreram para a prática dos atos.

» Esses atos teriam sido adotados em detrimento de bens da União — poderes Executivo e Legislativo — além de toda a coletividade e, por isso, adequa-se ao disposto no artigo 109 da Constituição Federal.

» O embolso de vantagem econômica em razão da atividade pública constituiria conduta irregular e, por isso, seria sempre ilícito o enriquecimento relacionado ao desempenho de função pública que não seja resultado de contraprestação paga pelo seu regular e legítimo exercício.

» Para o MP, os documentos que instruem a ação comprovariam que os réus praticaram atos de improbidade que importaram em enriquecimento ilícito e que atentaram contra os princípios da administração.