Correio braziliense, n. 20416, 14/04/2019. Política, p. 3

 

"Uma conversa conserta tudo", diz Paulo Guedes

Gabriela Vinhal

Vicente Nunes

14/04/2019

 

 

Governo/ Ministro da Economia afirma que presidente interferiu na política de preços da Petrobras por causa dos efeitos políticos da alta do diesel. Preço mínimo dos fretes é outra preocupação

Após o presidente Jair Bolsonaro interferir na política de preços da Petrobras e suspender o reajuste de 5,7% no preço do diesel, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ontem que é possível “consertar” uma decisão do chefe do Executivo “que não seja razoável” na economia do país. “Uma conversa conserta tudo”, disse, em Washington, enquanto deixava o Fundo Monetário Internacional (FMI), onde cumpria agenda. Após interceder na gestão da empresa, as ações dela caíram 8,5% na Bolsa de Valores de São Paulo e o valor de mercado teve uma redução de
R$ 32 bilhões em um dia.

Segundo o ministro, Bolsonaro já havia dito que não era um especialista em economia e que o presidente só tomou a decisão porque deve ter se preocupado com os efeitos políticos de uma alta no preço do diesel. “O presidente já disse para vocês que ele não era um especialista em economia, então, é possível que alguma coisa tenha acontecido lá. Ele, ao mesmo tempo, é preocupado com efeitos políticos, estamos falando em greve de caminhoneiro, esse tipo de coisa, então é possível que ele esteja lá tentando manobrar com isso”, disse.Questionado sobre qual mensagem o governo quis passar com a decisão, Guedes afirmou que não sabia, mas se informaria. “E eu concordo com suas preocupações”, acrescentou. Entretanto, o economista ressaltou o bom trabalho que o presidente da República tem feito à frente do Palácio e declarou que ele tem “muitas virtudes”.

Telefonema

A interferência da política de preços ocorreu em meio à pressão dos caminhoneiros, que não esperavam pelo aumento. Ao serem informados do reajuste, líderes da categoria ligaram para o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para demonstrar o descontentamento em torno do aumento do valor do litro do combustível. Foi quando Bolsonaro telefonou para o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, para pedir para suspender o aumento. Agora, o grupo quer conversar com o setor do agronegócio para fazer com que a lei dos preço mínimos do frete seja cumprida. Essa é uma das medidas compensatórias que fazem parte das demandas dos caminhoneiros desde a paralisação de 2018, que causou uma crise de desabastecimento no país. A fim de evitar uma nova greve, Bolsonaro se reuniu ontem com a titular da Agricultura, Tereza Cristina, no Palácio do Alvorada, para discutir a questão. Mesmo com um tom apaziguador de Guedes, integrantes da equipe econômica passaram o sábado trocando mensagens e questionaram até onde o ministro estaria disposto a continuar no cargo. Segundo os técnicos, não há dúvidas de que Guedes foi “desmoralizado”: “Uma decisão tão grave como essa deixa o ministro numa situação muito ruim.”

Eles asseguram ainda que, dada à repercussão negativa da intervenção de Bolsonaro, certamente o presidente já deve ter falado com o ministro por telefone. Mas é difícil acreditar que Guedes esteja tranquilo. “O ministro sabe que muito da credibilidade do governo vem dele. Portanto, se começa a ter a imagem arranhada, não deixará isso barato”, destacou outro técnico. Para integrantes da equipe econômica, a decisão do presidente sem consultar o ministro pode ameaçar a credibilidade do governo dentro e fora do país.