Correio braziliense, n. 20414, 12/04/2019. Política, p. 3

 

O 13° no lugar de um reajuste

Vera Batista

Bernardo Bittar

12/04/2019

 

 

O governo confirmou a criação do 13º salário para os beneficiários do Programa Bolsa Família como uma das metas consolidadas nos primeiros 100 dias da gestão de Jair Bolsonaro. O anúncio da inclusão dessa parcela — ao custo estimado de R$ 2,58 bilhões, para 4,1 milhões de famílias — foi uma estratégia para manter o valor mensal do benefício congelado em R$ 41 por pessoa (até o limite de R$ 205 por família). Mesmo sem reajuste, o efeito no bolso dos mais pobres será significativo. Nos cálculos do economista Marcelo Neri, diretor do FGV Social, essa 13ª parcela, na prática, equivale a um reajuste nominal de 8,33%. “Descontada a inflação dos últimos 12 meses (3,89%), resulta em ganho real de 4,3%”, destacou.

Para se ter uma ideia do retorno, explicou Neri, de 2015 a 2017, quando não houve incentivo algum ao programa, a extrema pobreza aumentou em 40%. “Estudos apontam que para cada R$ 1 incluído no programa há um impacto três vezes maior no Produto Interno Bruto (PIB). Por isso, essa despesa não atrapalha nem o ajuste fiscal nem a reforma da Previdência, porque fará o dinheiro circular na economia”, destaca. “Não há contradição. Se a reforma da Previdência é a operação tão necessária ao futuro do país, o Bolsa Família é uma espécie de anestesia”, reforçou.

A medida do governo faria ainda mais efeito se o dinheiro caísse na conta dos mais pobres no momento que eles mais precisassem. “Em vez do depósito em dezembro, quando a economia está aquecida e é mais fácil conseguir emprego, poderia ser quando fosse necessário comprar, por exemplo, material escolar. Ou em caso de doença”, ensina Neri. “É muito importante destacar que a medida produz ganhos em pobreza, desigualdade e no PIB, preservando as contas públicas. Mulheres, crianças e nordestinos são os principais beneficiados”, confirmou.

A medida foi divulgada por meio do Twitter do presidente Jair Bolsonaro, logo no início da manhã de ontem. “Oficializamos hoje, junto ao Ministério da Cidadania, a criação do 13º salário para os beneficiários do Bolsa Família, recursos oriundos em sua esmagadora maioria de desvios e recebimentos indevidos. Grande dia!”, escreveu o chefe do Planalto. Em compensação, o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, também afirmou que não haverá reajuste para os beneficiários, exatamente por causa da parcela extra, mas que o aumento pode vir depois, por exemplo, da aprovação da reforma da Previdência. “Com o equilíbrio fiscal que será obtido com a nova Previdência, não há nenhum problema de se trabalhar com isso, porque estamos com orçamento em elaboração para o ano que vem”.

De acordo com o Ministério da Cidadania, responsável pelo repasse, o Planalto deve enviar ao Congresso uma medida provisória em outubro, a fim de que ela entre em vigor em dezembro. Esse planejamento foi feito, porque o texto de uma MP tem prazo de 60 dias, que podem ser prorrogáveis por mais 60. Ou seja, se fosse mandado agora para o Congresso, a medida corria o risco de não ser votada e acabar perdendo a validade. Osmar Terra, ministro da Cidadania, garantiu que o dinheiro para o pagamento do benefício está garantido no Orçamento, depois que a Junta Orçamentária aprovou a iniciativa, com o aval do Ministério da Economia.

Crítica

A presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada Gleisi Hoffmann (PR), criticou a iniciativa. Lembrou que o Bolsa Família foi criado no primeiro governo petista, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003. E alfinetou Bolsonaro, ao falar que a novidade dos 100 dias de governo do pesselista seria “uma fraude” ao Bolsa Família. “Até o anúncio de hoje (ontem), sobre o 13º salário, não é positiva. Ela é um engano e tenta fraudar o Bolsa Família, um projeto complementar de renda, para a população pobre. Temos 50% da população ganhando até dois salários mínimos por mês e, grande parte, não recebe nem um salário porque trabalha na informalidade. Só conseguimos combater isso com valorização do mínimo e criação de empregos”, disse Gleisi.