Correio braziliense, n. 20414, 12/04/2019. Brasil, p. 6

 

Superfaturamento de pedágios na mira da PF

Renato Souza

12/04/2019

 

 

Corrupção/ Investigações da Polícia Federal mostram que fraude ocorre com anuência da ANTT, agência que deveria zelar pela lisura de processos de licitação e fiscalizar rodovias concedidas. Suspeita recai sobre preços cobrados em Goiás, Bahia e Espírito Santo

Investigações da Polícia Federal levaram a um esquema de superfaturamento de pedágios em rodovias de pelo menos três estados. As diligências apontaram que as fraudes ocorreram com anuência da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que deveria zelar pela isonomia de licitações e garantir que motoristas não fossem lesados pelo preço e pelos serviços oferecidos por concessionárias que gerenciam estradas em Goiás, Bahia e Espírito Santo. Durante a manhã de ontem, agentes da PF foram até a sede da agência, em Brasília, para cumprir mandados de busca e apreensão.

Entre os alvos da operação estava o diretor-geral da ANTT, Mário Rodrigues Júnior. Ele está no cargo desde o ano passado e tem mandato até 2020. No gabinete dele, os investigadores recolheram arquivos em computadores, documentos físicos e informações que podem ajudar a desvendar o tamanho do esquema que envolve a entidade e empresas privadas. Essa não é a primeira vez que Mário Rodrigues é alvo das autoridades. Ele já foi investigado por desvios das obras do Rodoanel, em São Paulo, e foi citado por delatores da OAS e da Andrade Gutierrez.

Além do mandado contra o diretor-geral da agência, os investigadores cumpriram outros 15 mandados de busca e apreensão em endereços ligados aos acusados de integrarem o esquema criminoso. A operação, batizada de Infinita Highway, é fruto de uma colaboração da PF com o Tribunal de Contas da União (TCU) e mobilizou 85 agentes. De acordo com informações da PF, a investigação apontou que “com a anuência da ANTT, uma das concessionárias envolvidas aumentou indevidamente o valor cobrado a título de pedágio, sob a falsa alegação de elevação dos custos de manutenção de rodovias, baseando-se, para isso, em orçamentos fictícios, emitidos por empresas que não existiam”.

Além disso, ainda de acordo com as diligências, “empresas concessionárias contratavam a emissão de laudos fraudulentos que atestavam a qualidade das rodovias, evitando, assim, a aplicação de multas e outras penalidades pela agência”. Os mandados foram emitidos pela Justiça Federal da Bahia.

Em nota, a agência informou que está colaborando com as investigações. “A ANTT se coloca à disposição das autoridades para os esclarecimentos que se fizerem necessários. Cabe enfatizar que a agência realiza seus trabalhos e toma suas decisões respaldadas em estudos e pareceres técnicos de seus servidores e procuradores jurídicos, dentro da legalidade e lisura, respeitando todos os princípios éticos da administração pública, e em permanente contato com os órgãos de controle”, diz o comunicado da empresa.

Outras denúncias

Associações de servidores da ANTT denunciam que está em processo de alteração uma resolução que trata do transporte nacional e internacional de passageiros por via terrestre. Análises técnicas realizadas por técnicos da própria autarquia revelam que se implementadas, as propostas da superintendência da agência podem facilitar fraudes em contratos com empresas de ônibus. Um ofício, enviado pela Associação dos Servidores da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ASEANTT), no dia 5 deste mês, pede que as alterações pretendidas sejam repensadas, sob o risco de serem concedidas concessões de uso do serviço com a “validade da autorização, contrariando a lei” e a “minimização da possibilidade de ingresso de novos operadores”, o que representaria benefício para as empresas que já atuam no sistema de transporte.

Ontem, o Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação “Sinagências” enviou outro ofício, contestando a pretensão da ANTT de fazer mudanças na mesma resolução apontada pela ASEANTT. Após a saída dos agentes da PF do prédio da entidade, as atividades continuaram normalmente. O diretor Mário Rodrigues Júnior foi citado nas delações de Carlos Henrique Barbosa Lemos, ex-diretor da OAS, e de Flávio David Barra, ex-presidente da Andrade Gutierrez Engenharia. Ambos afirmam que ele recebeu propina desviada dos recursos destinados às obras do Rodoanel.