O globo, n. 31341, 29/05/2019. Economia, p. 27

 

Privatizações

Carolina Brígido

Martha Beck

Bruno Rosa

Ramona Ordoñez

29/05/2019

 

 

Julgamento do STF pode afetar venda de US$ 32,3 bi em subsidiárias da Petrobras

O Supremo Tribunal Federal (STF) incluiu em sua pauta de julgamentos de amanhã duas ações que definirão o andamento do programa de privatizações do governo Jair Bolsonaro e têm o potencial de travar vendas de US$ 32,3 bilhões em ativos da Petrobras.

No primeiro caso, o plenário decidirá se mantém liminar concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski em junho do ano passado determinando que a privatização de estatais só seja feita com autorização do Congresso. No segundo,a Corte julgará liminar concedida na segunda-feira pelo ministro Edson Fachin suspendendo a venda de 90% das ações da Transportadora Associada de Gás (TAG), subsidiária da Petrobras.

O impacto potencial para a Petrobras considera o efeito sobre a venda do controle da TAG e de empresas como BR Distribuidora, Liquigas, Gaspetro e oito refinarias, com base nos valores de operações estimados no mercado.

Segundo a decisão de Lewandowski, para cada estatal, deve haver lei específica, aprovada pelo Legislativo, para vender mais de 50% das ações à iniciativa privada. Ele entendeu que alienações de bens públicos devem ser feitas mediante licitação que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes.

O problema é que a Petrobras vende seus ativos por meio de processo competitivo, num modelo de venda debatido com o Tribunal de Contas da União (TCU). Se o entendimento de Lewandowski for mantido pelo plenário do STF, haverá atraso nas operações.

Interferência preocupa

Integrantes da equipe econômica admitem que a interferência do Supremo no processo de privatização de estatais pode atrapalhar os planos do governo de levantar R$ 1 trilhão com a venda de empresas e participações acionárias. Isso, no entanto, só será definido quando a Corte tiver um posicionamento sobre as liminares.

Num primeiro momento, afirmam os técnicos, o impacto maior é sobre a estratégia de negócios da Petrobras.

Técnicos do governo aguardam a decisão que o plenário do STF vai tomar em relação às liminares de Fachin e Lewandowski para avaliar o impacto sobre o restante do plano de privatizações do governo como um todo.

— Há expectativa de que a decisão do STF gere um efeito para todas as estatais que pretendem vender subsidiárias —diz Mário Cabral, professor da Mackenzie e advogado do escritório José Del Chiaro.

Ainda não está claro esse efeito porque, segundo os técnicos, há operações que não são abrangidas pela decisão dos ministros. O governo quer, por exemplo, privatizar os Correios e a Casa da Moeda. O plano para essas duas companhias é incluí-las no Plano Nacional de Desestatização (PND), o que as deixaria fora do alcance do entendimento de Lewandowski. A inclusão de uma empresa no PND é por meio de decreto.

No caso da Caixa, por exemplo, que quer abrir o capital das empresas responsáveis por sua área de seguros e loterias, também não haveria impacto, pois a operação não implica em perda do controle acionário. Também ficariam fora do alcance da Corte empresas como Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb), uma vez que o plano do governo é fazer concessões.

Petrobras deve recorrer

A liminar de Lewandowski foi dada em uma ação direta de inconstitucionalidade de autoria da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf ), na qual questionam trechos da Lei da Estatais. Para Lewandowski, da mesma forma que a Constituição exige lei específica para se instituir empresa pública, autarquia, sociedade de economia mista e fundação, o mesmo requisito deve ser observado no caso das privatizações.

Da mesma forma, o plenário do STF poderá manter ou revogar a decisão de Fachin, que suspendeu a venda de 90% da TAG, que controla gasodutos no Norte e Nordeste, para a francesa Engie,po rUS $8,6 bilhões.Segundo fontes, a Petrobras deve recorrer da decisão e ainda analisa se entrará com recurso antes da sessão de quinta-feira do STF ou depois. Procurada, a empresa não comentou o assunto.

Segundo analistas, o impasse pode afetar o caixa da estatal já no segundo trimestre, pois a empresa esperava concluir a operação em junho. A Petrobras deve alegar em seu recurso no STF que toda a sistemática de venda foi acordada com o TCU, num modelo que prevê anúncio ao mercado para atrair interessados e permite que os concorrentes reavaliem sua proposta com base no preço oferecido pelo ganhador.

Segundo o TCU, porém, a decisão do STF prevalece, já que é a última instância jurídica do país. “Qualquer avanço no processo de venda vai depender de nova manifestação do Supremo”, disse, em nota.

Após a decisão do STF, a Engie reafirmou seu interesse na compra da TAG. Para Felipe Perez, diretor da consultoria internacional IHS Markit, o mercado de combustíveis no país é atraente, e os investidores não querem perder o timing das operações:

— Esse vaivém de liminares não só atrasa o processo, como também gera incerteza e preocupação entre os investidores interessados.

O ideal

A PEC, em tramitação na Câmara, que permite ao governo reduzir jornada de trabalho de servidores e até demiti-los, caso a folha de pessoal ultrapasse determinado limite, é uma dessas medidas que complementam a reforma da Previdência, a grande trava do crescimento autônomo dos gastos. O que propõe a PEC já está na Lei de Responsabilidade Fiscal, sob contestação no Supremo.

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Câmara aprova MP que cria órgão para proteger dados pessoais

Bruno Góes

29/05/2019

 

 

Texto segue para o Senado e precisa ser votado até o dia 3 de junho

A Câmara dos Deputados aprovou ontem a medida provisória (MP) que criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). O órgão será responsável por fiscalizar a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados. Segundo o texto da legislação, os estados deverão consultar a ANPD antes de repassar dados de cidadãos a empresas privadas. Agora, o texto segue para o Senado, onde precisa ser votado até 3 de junho para que não perca a validade.

Uma emenda aprovada pelo plenário da Câmara garante autonomia à ANPD ao longo de dois anos, transformando-a em autarquia. O texto original da medida previa que a instituição fosse imediatamente vinculada à Presidência da República, para driblar um entrave da Constituição.

Isso porque cabe ao Poder Executivo, e não ao Congresso, criar autarquias ou agências, que seriam mais independentes. Em dezembro, a vinculação à Presidência foi criticada por especialistas, que citaram riscos de ingerência política. Assim, criou-se uma transição de dois anos.

A Câmara também aprovou um destaque do PCdoB e manteve na lei de proteção de dados a exigência de que a ANPD e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) sejam obrigados a ter regulamentos específicos para o acesso a dados de estudantes que prestaram os exames do ensino médio (Enem) e do ensino superior (Sinaes).

De acordo com as regras da nova autarquia, as multas aplicadas pela autoridade serão direcionadas para o Fundo de Direitos Difusos, que já recebe, por exemplo, o dinheiro de sanções aplicadas sobre empresas que violam o Direito do Consumidor.

O texto aprovado garante autonomia técnica e de decisão à autoridade e estabelece que ela seja criada sem aumento de despesas, passando por “autorização (...) financeira na lei orçamentária anual e permissão na lei de diretrizes orçamentárias”.