Valor econômico, v.19, n.4591, 18/09/2018. Brasil, p. A4

 

IBC-BR surpreende, mas recuperação deve continuar fraca

Isabel Versiani

Estevão Taiar

18/09/2018

 

 

A retomada da economia deve continuar lenta e instável neste ano, apesar de o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) ter surpreendido positivamente. O indicador teve alta de 0,57% em relação a junho, na série com ajuste sazonal.

O resultado ficou acima da projeção média de 21 instituições financeiras ou consultorias ouvidas pelo Valor Data, que apontava para alta de 0,05%. Ainda assim, fatores como a eleição presidencial, principalmente, e a piora do cenário externo indicam uma recuperação econômica mais lenta do que a sugerida pelo índice de julho, dizem economistas.

Alberto Ramos, diretor do departamento de pesquisas econômicas para a América Latina do Goldman Sachs, afirma que o IBC-Br não desafia a avaliação, sustentada por vários outros dados, de que a economia está "muito, muito débil". "Até porque, infelizmente, esse dado do Banco Central não tem sido muito fidedigno ultimamente", diz.

Para o economista, indicadores antecedentes ao Produto Interno Bruto (PIB), como o próprio IBC-Br, não têm aderência perfeita ao resultado trimestral efetivo, já que contam com metodologias diferentes. Mas, para ele, as discrepâncias observadas no caso do índice do BC desvalorizam o indicador. Ele destaca a "diferença enorme" entre a variação da atividade apontada pelo IBC-Br no segundo trimestre do ano (queda de 0,8%, revisada de recuo de 1%) e o resultado apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o PIB (alta de 0,2%).

Em julho, já feitos os ajustes sazonais, a produção industrial recuou 0,2%, o volume de serviços prestados no país teve queda de 2,2% e as vendas no varejo encolheram 0,5% frente a junho, segundo dados do IBGE. As três pesquisas são usadas como base para o IBC-Br, que também incorpora outros dados sobre a atividade da economia. O fato de o índice do BC ter apresentado crescimento, enquanto as três sondagens foram negativas, pode ser explicado por efeitos estatísticos do cálculo de ajuste sazonal, segundo Fábio Ramos, economista do UBS Brasil.

Para a Tendências, o indicador divulgado ontem ainda está contaminado pelos efeitos do movimento de paralisação dos caminhoneiros no fim de maio. "Por isso, ainda é difícil ver com clareza qual o movimento subjacente da atividade econômica no último trimestre", diz Thiago Xavier, economista da consultoria.

Dada essa distorção causada pela greve, Ramos não descarta que mais para frente o BC revise o número de julho para baixo. "Isso [alta de 0,57%] não quer dizer nada de especial", afirma o economista, que não vê perda de qualidade do indicador do BC.

Em maio, o IBC-Br havia registrado queda de 3,35%. A retração foi mais do que compensada por uma alta de 3,42% (dado revisado de 3,29%) do indicador em junho. No ano, o IBC-Br acumula alta de 1,19%. Nos 12 meses até julho, o crescimento é de 1,46% na série sem ajuste. Na comparação com julho de 2017, houve avanço de 2,56%, sem ajuste.

Mesmo assim, a maior parte dos analistas ainda não vê motivos para otimismo. Desde a greve dos caminhoneiros, a Icatu Vanguarda calcula crescimento de 1% do PIB neste ano. Mas Ana Flávia Soares, economista-chefe da gestora de recursos, não descarta uma expansão ainda menor, no caso de vitória de um candidato não alinhado à agenda de reformas. Ela lembra que a herança estatística do PIB do primeiro semestre para o resto do ano é de 0,8%.

Ou seja: se a atividade permanecer até dezembro no mesmo patamar que estava em junho, o PIB terá alta de 0,8% em relação a 2017. Eventuais desempenhos fracos no terceiro e quarto trimestres, portanto, podem fazer com que a atividade cresça menos do que o 1% calculado pela Icatu.

Ramos lembra que a recuperação, além de frágil, acontece a partir de uma baixa base de comparação. Como exemplo, ele cita o fato de o IBC-Br estar de 4% a 5% abaixo do nível verificado entre 2012 e 2014.

Além disso, o comportamento atual das variáveis financeiras, como juros e câmbio, apontam para um quarto trimestre de PIB mais fraco, segundo ele.

Índices de confiança da indústria e do consumidor também mostraram desempenhos ruins recentemente, segundo Ana Flávia, o que reforça esse cenário de uma lenta recuperação.

Já Xavier, da Tendências, destaca que, além das incertezas relacionadas às eleições, outros obstáculos à recuperação da economia são o alto endividamento das famílias e das empresas e o grave quadro fiscal do setor público.