Título: Nova identidade não passou do lançamento
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 11/09/2012, Política, p. 9

Com orçamento de R$ 11,1 milhões previstos no orçamento de 2013, o Registro de Identidade Civil - substituto dos atuais RGs - ainda nem saiu da gaveta. Cartão seria fundamental no auxílio à segurança pública

Lançado em dezembro de 2010 como último programa oficial do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Registro de Identidade Civil, chamado pela sigla RIC, substituiria a ultrapassada carteira de identidade atual dos brasileiros. O cartão magnético com chip reunindo todas as informações pessoais do cidadão — desde impressão digital a características físicas — passaria a ser gerenciado por uma central única, evitando que uma mesma pessoa possa obter 27 documentos de identificação — já que hoje em dia é possível tirar uma carteira, com numeração diferente, em todas as Unidades da Federação. A iniciativa, fundamental para o sistema de segurança pública, na medida em que dificulta a prática de fraudes e diminui as chances de a polícia e a Justiça serem induzidas ao erro devido a carteiras múltiplas de um mesmo criminoso, ficou só na promessa. Cerca de 10 milhões de brasileiros já deveriam ter o novo RG. Mas a emissão parou no RIC 001 e RIC 002, entregues, durante a cerimônia de lançamento, a Lula e à então primeira-dama, Marisa Letícia.

O governo chegou a anunciar, com campanhas no rádio e na televisão, que 2 milhões de RICs seriam emitidos em 2011, 8 milhões em 2012 e 20 milhões por ano a partir de 2012, até cobrir o passivo. Quase dois anos após a publicidade oficial, o Ministério da Justiça, responsável pelo projeto, é lacônico ao responder sobre o andamento da ação. E se nega a informar quanto já foi gasto no desenvolvimento do novo RG do brasileiro. Dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal revelam, porém, que dos R$ 35,4 milhões reservados para pagamentos, de um orçamento de R$ 50 milhões no ano passado, só R$ 2.622 foram efetivamente pagos. Neste ano, o projeto não tem recursos disponíveis, embora na proposta orçamentária o governo tenha previsto R$ 100 milhões. No orçamento para o ano que vem, atualmente no Congresso, são R$ 11,1 milhões. "O programa está passando por uma reestruturação, por adequações de ordem técnica. Mas ainda não temos um cronograma", afirmou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, na última semana.

Questionada, a assessoria de imprensa da pasta destaca que representantes de instituições envolvidas na implementação do RIC estão fazendo "um amplo processo de revisão do projeto, em virtude da identificação de necessidades de aperfeiçoamento em questões técnicas durante a primeira fase do piloto". Na atual etapa, continua a nota, estão sendo revistas "necessidades de homologações do cartão, do aparelhamento dos ambientes, dos processos de coleta de dados e de entrega dos cartões". A Casa da Moeda do Brasil (CMB) informou que já fez cerca de 10 mil documentos em uma fase do projeto piloto. Os novos RICs estariam sendo ajustados, informou o órgão. "São feitos testes e ajustes de equipamentos, sistema, impressão etc., e há fases em análise crítica", diz a CMB, em nota. Pelo cronograma inicial, as primeiras cidades que participariam, já em 2011, do projeto eram Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Hidrolândia (GO), Ilha de Itamaracá (PE), Nísia Floresta (RN) e Rio Sono (TO).

CPF Integrante do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Ignácio Cano ressalta as dificuldades impostas por sistemas de identificação estaduais ou regionais. "Acontece de a pessoa ter um mandado de prisão aqui e outro estado não saber, para citar um problema real que o país enfrenta", afirma o especialista. Embora destaque a importância do RIC, Cano ressalta a complexidade operacional para substituir as carteiras de identidade dos brasileiros. "Você tem que contar com o apoio dos estados para essa migração. É algo complicado de fazer, que vai levar anos."

Cano acredita que, se o governo utilizasse o CPF como documento para identificação, o procedimento seria menos complexo. "Como o sistema econômico não permite falhas, caso contrário um devedor em um estado poderia comprar em outro, o CPF é um documento muito seguro atualmente. Ele é federal, desenvolvido pela área da Fazenda, ligado a uma central única. É uma excelente experiência já existente", diz.

"Acontece de a pessoa ter um mandado de prisão aqui e outro estado não saber, para citar um problema real que o país enfrenta" Ignácio Cano,especialista do Laboratório de Análise da Violência da Uerj