Valor econômico, v.19 , n.4581 , 01/09/2018. Brasil, p.A2

 

Governo condiciona meio Bolsa Família à aprovação de crédito pelo Congresso

 

 

 

Edna Simão

Fábio Pupo 

 

​02/09/2019

 

 

Na proposta de Orçamento enviada ao Congresso, o governo condicionou R$ 258,1 bilhões em despesas à aprovação de um crédito adicional a ser solicitado pelo próximo presidente aos parlamentares. No valor, está incluído metade do orçamento sugerido para o Bolsa Família - o que corresponde a R$ 15 bilhões.

Esse montante em despesas foi colocado como condicional porque o governo não viu como cobri-las sem endividamento. O problema é que elas estão acima do limite previsto para cumprir a "regra de ouro" das contas públicas - que visa impedir que o país se endivide para pagar despesas correntes. Como a Constituição permite o descumprimento somente com um crédito adicional autorizado pelo Congresso, o próximo governo terá que pedir aos parlamentares aval para a despesa.

 

Na peça orçamentária de 2019, o governo montou sua proposta de orçamento tendo que identificar quais seriam as despesas a serem cobertas com os recursos "extras" a serem autorizados pelos parlamentares. Na hora de escolher quais itens entrariam no "orçamento condicional", o governo e a equipe econômica colocaram o Bolsa Família na conta. Com isso, metade do programa de transferência de renda, assim como outros itens incluídos no "orçamento condicional", deixam de ficar assegurados pelo Orçamento proposto pelo Executivo - já que não há garantia de que os recursos vão ser, de fato, aprovados pelo Congresso.

Também ficaram condicionados na proposta itens como aproximadamente R$ 200 bilhões para a Previdência, além de R$ 30 bilhões (praticamente toda a despesa) com Benefício de Prestação Continuada (BPC) - pago a idosos carentes e pessoas com deficiência.

Os consultores do Congresso já alertaram anteriormente que é um fator de "instabilidade política" o fato o governo jogar para o próximo presidente da República a responsabilidade pela aprovação dos créditos especiais, já que não há como saber de antemão o ambiente político do próximo ano.

"O presidente eleito terá que, praticamente como um de seus primeiros atos, encaminhar ao Parlamento os referidos créditos, os quais precisam ser aprovados por maioria absoluta. Como não é possível realizar qualquer previsão acerca do ambiente político do próximo ano, tampouco do grau de harmonia que haverá entre Executivo e Legislativo, a lógica embute riscos de instabilidade política", diz relatório elaborado pelos técnicos das consultorias de Orçamento do Senado e da Câmara dos Deputados.

Ao ser questionado na sexta-feira durante apresentação dos números do Orçamento à imprensa, o ministro do Planejamento, Esteves Colnago, afirmou que não vê riscos para a aprovação do crédito especial pelo Congresso. "Nós não visualizamos nenhuma resistência política com relação a essas medidas que estão aqui. Então não vemos por que um presidente no seu primeiro ano de mandato nessas despesas não consiga aprovar o PLN [Projeto de Lei do Congresso Nacional]. Então não vemos esse risco", afirmou.

Segundo ele, o governo usou três critérios para selecionar quais despesas ficariam condicionadas. Primeiro, escolheu-se apenas despesas primárias que, além disso, já eram financiadas em parte com dívida. Outra condição era que as despesas não fossem realizadas no começo do exercício, para dar tempo da busca de aval do Legislativo.

Na mesma peça orçamentária em que deixa metade do programa social sob aval do Congresso, o governo decidiu manter nas contas o reajuste para os servidores do Executivo. O impacto previsto é de R$ 4,7 bilhões. O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, afirmou que mesmo assim o governo vai enviar uma medida provisória para postergar o aumento para 2020. A MP deve ser publicada nesta segunda-feira no Diário Oficial da União (DOU).

A opção por manter o reajuste nas contas é decorrente de uma opção "conservadora" e "transparente", de acordo com Guardia. Na visão dele, o governo não poderia tirar das previsões orçamentárias o reajuste porque ainda não conquistou o adiamento - que tem que ser aprovado pelo Congresso.