Título: Sem medo de comprar briga
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 02/09/2012, Política, p. 8
O "filho alemão" do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como é chamado desde que assumiu a Advocacia-Geral da União (AGU) em 2009, Luís Inácio Lucena Adams assumiu o papel de protagonista do governo nas últimas semanas. Apesar de afirmar que a AGU deve agir mais nos bastidores por não ser um ministério formulador de projetos e propostas, Adams virou notícia com a greve dos servidores, a divulgação dos salários do funcionalismo público federal e os protestos contra a construção da usina de Belo Monte. E foi lembrado, mais uma vez, para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) — no lugar de César Peluso, que se aposentou, ou de Carlos Ayres Britto, que deixará o posto em novembro. "Ele vai para o STF, Dilma o adora. Só não se sabe quando", assegurou ao Correio um colega de Esplanada de Adams.
Nada que tire a calma desse gaúcho, conhecido por ser intransigente nas negociações. "Se eu não fosse duro, não teria conseguido as vitórias de que o governo precisava", disse ele ao Correio. Incorpora, assim, o espírito de zagueiro do Grêmio, clube pelo qual torce esperando que o atual bom momento no campeonato brasileiro — o time gaúcho está em terceiro, a quatro pontos do líder Atlético Mineiro — não seja passageiro. "Firme, mas se entrar com o pé por cima da bola, é falta. E isso não pode", garantiu ele.
Adams acostumou-se com as provocações diante da semelhança de seu nome com o do ex-presidente. No dia da posse, teve que ouvir de Lula a justificativa de que não estava praticando nepotismo ao chamar um parente para o governo. "Eu acostumei. Meu pai é que está ameaçando fazer um teste de DNA para apurar de verdade essa história", ironizou.
A importância do advogado-geral da União cresceu no período recente. Quando o Paraguai foi expulso do Mercosul e os presidentes do Brasil, da Argentina e do Uruguai queriam aproveitar o momento para incluir a Venezuela no grupo comercial, pairavam dúvidas de como fazer isso. Dilma já tinha desembarcado em Mendoza, na Argentina, na madrugada de quinta, 28 de julho. Quando deparou-se com o impasse, não teve dúvidas: ligou para Adams, no meio da noite. "Preciso de você, aqui, às 9h, com um parecer para resolver isso. Um avião da FAB vai lhe pegar aí", disse Dilma, bem ao seu estilo direto. Apesar das dificuldades que envolvem o direito internacional, a Venezuela foi aceita no clube. A saída jurídica foi divulgada apenas entre os chefes de Estado, mas recebeu duros ataques do ex-chanceler Celso Lafer. "Pode espernear, mas a medida está valendo. O Paraguai continua suspenso e Chávez está no Mercosul, como queria Dilma", disse um ministro presente ao encontro.
O advogado-geral não tem medo de comprar brigas. E não esconde as divergências em relação ao seu antecessor, José Dias Toffoli. Oriundo dos quadros do PT, Toffoli sempre teve uma trajetória próxima à do partido. Quando foi nomeado para a Advocacia-Geral da União — já vislumbrando a possibilidade de tornar-se, no futuro, ministro do STF — Toffoli tentou descolar-se da imagem de petista e governista. O atual ministro do STF sempre defendeu que a AGU é carreira de Estado, não de governo. Adams pensa diferente. "Eu não defendo o Estado, eu defendo o governo", afirmou Adams ao Correio.
Corte de ponto
Que o digam os servidores públicos que cruzaram os braços em uma das greves mais longas da história recente. O advogado conseguiu o corte de ponto e a substituição dos agentes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal por militares do Exército, para evitar um caos nas fronteiras e em algumas cidades mais violentas. "Alguns sindicatos ainda carregam essa perspectiva de aumentos reais, sempre", lamentou.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores Federais (Anpaf), Rogério Filomeno Machado, disse que a sua associação foi uma das poucas que não aderiu ao "Fora Adams", por achar que não adianta personalizar um problema que é do governo como um todo. "A presidente Dilma é centralizadora e técnica. O perigo disso é deixar de ousar. Adams abre as portas para o diálogo, mas cumpre ordens e deixa claro quando não pode ceder", declarou Rogério.
Aos 47 anos, Adams não pode reclamar. Chegou ao topo da carreira por duas vezes. Tornou-se Procurador da Fazenda Nacional em 1993 e, em 2006, virou procurador-geral da Fazenda Nacional. Em 23 de outubro de 2009, foi nomeado por Lula como advogado-geral da União (AGU). O Supremo Tribunal Federal parece ser uma consequência natural dessa ascendência. Na mais alta Corte do país estão dois ex-AGUs — além de Toffoli, Gilmar Mendes exerceu a função durante o governo Fernando Henrique Cardoso.
A indicação bateu na trave no início do governo Dilma, mas a presidente preferiu indicar Luis Fux. Agora, com a aposentadoria de Peluso, o nome de Adams veio novamente à baila. O Correio apurou que ainda não é desta vez, mas ele deve ser indicado para a vaga de Ayres Britto, que se aposenta em novembro. "Não estou preocupado. Trabalhei com cinco ministros ao longo de três governos e assessorei diretamente dois presidentes. Não posso reclamar", contabiliza.
Por enquanto, Adams vai se distraindo com a família, com os jogos do Grêmio e o com Cinema de Quinta: uma reunião mensal com um grupo de seis amigos cinéfilos. O último filme em cartaz foi Doze Homens e uma sentença. Ele não sabe dizer se advogados preferem filmes de júri. "Pode ser. Ou pode ser apenas coincidência", desconversou.
Currículo
Cargo: Advogado-Geral da União
Idade: 47 anos
Natural de: Porto Alegre (RS)
Trajetória profissional: » Procurador-geral da Fazenda Nacional (PGFN) até 2009
» Secretário executivo do Ministério do Planejamento em 2004
» Consultor jurídico do Ministério do Planejamento em 2003
» Professor de direito tributário na Universidade Vale do Itajaí (SC)
» Professor de teoria geral do Estado na Fundação Educacional de Brusque (SC)