Valor econômico, v.19, n.4584, 07/08/2018. Política, p. A8

 

Plenário do STF deve julgar pedido de Lula para validar decisão da ONU

Luísa Martins

Isadora Peron

07/08/2019

 

 

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), deve levar ao plenário recurso em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pede que seja juridicamente reconhecida a decisão do comitê da ONU que valida seu direito de ser candidato à Presidência da República.

Essa é a avaliação de ministros da Corte ouvidos reservadamente pelo Valor. O entendimento é o de que, apesar de Fachin ter sido o único voto pela legitimidade da recomendação da ONU - durante a sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que barrou o registro de Lula -, o magistrado prioriza decisões colegiadas.

Em outras palavras, de acordo com fontes próximas a Fachin, o ministro não contrariaria, sozinho, o que foi assentado pela maioria da Corte eleitoral - o placar, na madrugada de sábado, acabou em seis votos a um.

Embora vencido sozinho no julgamento do TSE, o voto de Fachin não surpreendeu seus pares ou aqueles que acompanharam sua trajetória acadêmica antes de chegar ao Supremo. Como advogado e professor de direito civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR), escreveu artigos defendendo a validade jurídica, no Brasil, de tratados internacionais dos quais o país é signatário. Portanto, segundo fontes próximas ao ministro, deslegitimar a decisão da ONU seria ir contra sua própria palavra.

"Embora inelegível por força da Lei da Ficha Limpa, não há como o Poder Judiciário deixar de reconhecer que a consequência de uma medida provisória do comitê de direito humanos é a de paralisar a eficácia da decisão que nega o registro da candidatura", disse Fachin, na ocasião.

Quando o tema chegar ao plenário, a análise dos ministros ouvidos pelo Valor é de que a decisão do TSE seja mantida - inclusive com Fachin sendo o único voto divergente.

Isso deve se dar em função de duas jurisprudências da Corte, reconhecidas pela maioria dos 11 ministros. A primeira é de que a Lei da Ficha Limpa é pacificada e, portanto, condenados em segunda instância - como é o caso de Lula - não podem disputar as eleições. A segunda é de que o pacto internacional não foi promulgado por decreto presidencial e, mesmo se fosse, não seria capaz de alterar decisões judiciais brasileiras - os únicos efeitos possíveis seriam sanções morais e pecuniárias.

Em outra ofensiva jurídica no STF, a defesa de Lula na área eleitoral também pediu a suspensão da decisão do TSE que barrou seu registro de candidatura. O relator é o ministro Celso de Mello.

No documento de 164 páginas, os advogados dizem que a Corte Eleitoral agiu com "movimentos excepcionais" e "desprezou" sua própria jurisprudência ao decidir que Lula sequer é considerado candidato subjudice.

"Em termos legais e segundo jurisprudência consolidada, antes do caso era possível seguir em campanha enquanto o registro estivesse sub judice. Isso simplesmente acabou no julgamento do caso Lula", diz o texto, que acusa o TSE de "casuísmo dirigido".

No jargão jurídico, o pedido é para atribuir efeito suspensivo a recurso extraordinário protocolado no TSE, que aguarda juízo de admissibilidade da ministra Rosa Weber, presidente da Corte eleitoral. A defesa de Lula alega que os atos processuais pendentes no processo podem ultrapassar o prazo legal para a substituição da candidatura, em 11 de setembro. Se os ministros decidirem que há efeito suspensivo, Lula segue como candidato registrado à Presidência da República até decisão de mérito pelo STF.

A recomendação do Comitê de Direitos Humanos da ONU também foi reforçada neste pedido. Para os representantes de Lula, a recomendação deve ser respeitada pelo Judiciário brasileiro.

Posição contrária tem o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio Noronha, para quem o parecer é mera opinião. "Comissões da ONU são políticas e dão decisões absurdas, como essa. Este país não é uma colônia. É independente e tem Justiça estruturada. Não precisa se curvar a comissões,

Segundo ele, a defesa de Lula insiste que o petista está preso injustamente, mas não consegue desconstituir provas do caso do tríplex, que levou à condenação do petista no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), sentença que os advogados também tentam reverter.

O recurso de Lula contra a condenação foi impetrado em abril e admitido em junho pelo tribunal de segunda instância, mas apenas hoje deve, de fato, chegar ao STJ. A defesa de Lula tem criticado a demora do TRF-4 em enviá-lo à Corte superior, atrasando a possibilidade de reversão da sentença. Em nota, o tribunal com sede em Porto Alegre disse que os prazos foram "rigorosamente cumpridos". Noronha disse que a Quinta Turma do STJ, responsável pela Operação Lava-Jato, deve levar até 40 dias para julgar o processo.