Valor econômico, v.19 , n.4601 , 02/10/2018. Empresas, p.B6

 

OMS cobra rigor do Brasil contra aditivo em cigarro

Assis Moreira

02/10/2018

 

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) cobra do Brasil, segundo produtor mundial de tabaco e maior exportador, que garanta de vez a proibição de aditivos de aroma e sabor em cigarros e de novos dispositivos eletrônicos de fumar, e continue a aumentar muito os impostos e preços do produto que mata 150 mil pessoas por ano no país e 7 milhões no mundo.

O combate ao tabagismo se acelera, em reunião esta semana da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, com participação de 137 países em Genebra para definir um roteiro visando reforçar e expandir o escopo desse tratado global.

A delegação brasileira é uma das maiores do evento, com 25 representantes do governo, incluindo a ministra da Advocacia-Geral da União, Grace Mendonça, além de um bom número de representantes de associações de produtores e prefeitos da região Sul, ilustrando o protagonismo do país nesse debate.

Uma das questões que envolvem o país é o uso de aditivos em cigarros. O Supremo Tribunal Federal manteve uma norma da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que proíbe a venda de cigarros com aroma e sabor no país. Mas deixou uma brecha para a indústria do tabaco entrar com ações nos tribunais dos Estados.

"O Brasil tem espaço para resolver essa questão dos aditivos, porque na prática a ameaça continua e as crianças ficam em perigo", afirmou a secretária-geral da Convenção-Quadro, Vera da Costa e Silva.

Para ela, "outra ameaça" no país são os novos dispositivos eletrônicos de fumar, como cigarro eletrônico e produtos de tabaco aquecido. "A indústria faz muita pressão e felizmente a Anvisa não cedeu e continua a proibir sua entrada, e esperamos que isso se mantenha até que tenhamos conclusão científica de reais benefícios e danos".

Para Vera da Costa e Silva, o Brasil tem que continuar "aumentando muito os impostos e preços e se engajar no combate ao comércio ilícito que é muito grande". O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, conclamou mais governos a "aumentar impostos (e) proibir propaganda" de cigarros.

Consumo de fumo no país caiu 36% de 1990 a 2015, mas doenças ligadas ao tabagismo custam, por ano, US$ 56,9 bi ao SUS

Com relação aos aditivos, a ministra Grace Mendonça admitiu que a questão seja tratada "através de lei para trazer a segurança jurídica tão esperada", mas não se comprometeu com projeto de lei nem prazos, até porque o governo está chegando ao fim de mandato.

Em sua intervenção na sessão de abertura do encontro, a ministra observou que aditivos de aroma e sabor estimulam e facilitam o consumo e têm ainda mais importância quando se sabe que 90% dos fumantes no Brasil iniciaram o consumo entre 5 e 19 anos de idade.

Conforme a ministra, o consumo de fumo no Brasil diminuiu 36% entre 1990-2015, mas ainda assim o tabagismo é responsável pela morte de 400 pessoas por dia e 150 mil por ano no país. E doenças relacionadas ao uso de cigarro custam US$ 56,9 bilhões por ano ao Sistema Único de Saúde (SUS).

De seu lado, o presidente do Sinditabaco, do Rio Grande do Sul, Iro Shuenke, rejeitou a ideia de mais impostos, alegando que essa é uma das razões do enorme contrabando do Paraguai para o Brasil.

"No Paraguai, o imposto sobre cigarro é de 16% e no Brasil de 80%", afirmou. "O contrabando para o Brasil passou de uns 30% do total do consumo para cerca de 50%. O cigarro paraguaio no Brasil custa a metade do preço do cigarro nacional mais barato". Vera Costa e Silva retruca que o Paraguai prometeu aumentar impostos e o preço do produto.

O representante da indústria defendeu também que o governo libere e regulamente novos dispositivos eletrônicos de fumar, e deixe para o consumidor a opção por usá-los ou não. Um grupo de 70 especialistas em tabaco e nicotina enviou carta à OMS pedindo para a entidade ser mais positiva sobre novas tecnologias como o cigarro eletrônico que "podem reduzir muito as mortes e doenças causadas pelo fumo". Alegam que, com proibição ou excesso de regulamentação, os fumantes vão continuar com o cigarro normal "e morrendo, em vez de mudar" para os novos produtos.

Vera da Costa e Silva deixou claro que será tomada uma decisão esta semana sobre novos produtos de fumar.

Conforme o presidente do Sinditabaco, a produção brasileira se mantém estável e as exportações devem crescer 5% e alcançar US$ 2,2 bilhões neste ano. "Estamos aqui monitorando contra restrições à produção e ao comércio", afirmou.