Correio braziliense, n. 20426 , 24/04/2019. Política, p.2

Aprovada na CCJ

Alessandra Azevedo

Gabriela Vinhal

 

 

O resultado de um dos encontros mais tumultuados e barulhentos da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara foi positivo para o governo. Após quase nove horas de sessão, o colegiado aprovou ontem, por 48 votos a 18, o parecer pela admissibilidade da reforma da Previdência. Ou seja, a maioria concordou que, com alguns ajustes, a proposta do presidente Jair Bolsonaro respeita a Constituição e pode avançar para a próxima fase antes de ir ao plenário. A decisão foi tomada às 23h45, em meio a aplausos dos governistas e queixas da oposição.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerou a aprovação na CCJ uma “vitória daqueles que têm responsabilidade com o futuro dos brasileiros”. A tarefa, entretanto, não foi tão fácil quanto o governo esperava no início da tarde, quando a equipe econômica fez um acordo com o Centrão para retirar alguns “jabutis” do relatório do deputado Marcelo Freitas (PSL-MG), em troca do apoio do grupo na comissão.

As mudanças foram essenciais para a aprovação, mas são apenas uma prévia das dezenas de emendas que deve ser apresentadas na etapa seguinte, na Comissão Especial. Responsável por analisar oficialmente o conteúdo da reforma, ela deve ser instalada amanhã por Maia e começa a funcionar na semana que vem. Depois, ainda precisa ser votada em dois turnos no plenário. Ontem, foi “a primeira das três vitórias que teremos”, ressaltou o presidente da Câmara.

A base governista se prepara para encarar as críticas dos deputados contrários à reforma. Embora não tenham conseguido impedir a votação ontem, eles atrasaram em horas o processo, com a apresentação de seis requerimentos: um para retirar o assunto de pauta e cinco para adiar a sessão. Todos foram negados pelo plenário. O grupo também tentou suspender a tramitação até que o governo apresentasse dados sobre o impacto financeiro e atuarial da reforma.

Os deputados argumentaram que, desde 2016, quando foi aprovada a emenda do Teto de Gastos, todas as propostas que possam gerar aumento ou renúncia de receitas precisam vir acompanhadas da estimativa das perdas. Sem a apresentação dos números, a análise pode ser suspensa por até 20 dias, desde que um quinto dos membros da Casa (103 deputados) assinem o requerimento “para análise de sua compatibilidade com o Novo Regime Fiscal” instituído pelo ex-presidente Michel Temer.

Mesmo com 110 assinaturas, o presidente da Câmara ignorou o pedido. O governo entende que a reforma não traz nenhum impacto negativo às contas públicas e, portanto, não se encaixa na exigência. Além disso, a equipe econômica já havia garantido que apresentará os cálculos que embasam a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019 às lideranças partidárias amanhã, antes que ela seja encaminhada à Comissão Especial.

Votação

Após a derrota da semana passada, Felipe Francischini (PSL-PR), presidente da CCJ, abriu a sessão de ontem decidido a votar o relatório e a inibir as tentativas da oposição de adiar novamente a discussão. Várias vezes, ele disse que os parlamentares poderiam “fazer o barulho que quisessem”, que não o tirariam do sério. Alguns criticaram a postura “autoritária” do deputado que, logo no início dos trabalhos, avisou que seria “bastante duro na questão do tempo regimental”.

O presidente chegou a ser vaiado após reclamar das questões de ordem que pediam que a votação fosse suspensa. “Eu não vou aceitar que fiquem gritando. Isso aqui não é feira. Isso é estratégia dos senhores. Não abrirei mais os microfones”, ameaçou Francischini. Em alguns momentos, reclamou que os deputados ficavam “o tempo todo lamentando” as decisões dele. “Parem de lamentar. O choro é livre. Recorram das decisões”, sugeriu.

O relator, Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), apresentou as mudanças no parecer por meio de complementação de voto, como uma forma de resposta aos 13 votos em separado apresentados na CCJ. Pelo regimento, a alteração do texto não permitia reabertura do prazo para discussão nem para pedido de vista. Para conseguir apoio do Centrão, Freitas retirou do parecer a obrigatoriedade de recolhimento de FGTS de quem já for aposentado e continua trabalhando, além do pagamento da multa de 40% na rescisão contratual caso essas pessoas sejam demitidas. Dessa forma, ficam mantidas as regras atuais, que permitem que esses benefícios continuem sendo pagos aos trabalhadores que já se aposentaram.

O relator também aceitou excluir do texto a concentração de ações judiciais sobre a reforma da Previdência em Brasília e a exclusividade do Executivo de propor alterações na área. Além disso, mudanças na idade de aposentadoria compulsória não poderão ser feitas por lei complementar, como previa o texto inicial. Continua a exigência de emenda constitucional. Outras demandas dos deputados, como a restrição ao pagamento do abono salarial e a criação de um sistema de capitalização, serão discutidos na Comissão Especial. Segundo o relator, esses pontos não dizem respeito à constitucionalidade da matéria, que é o objeto de avaliação da CCJ.