Valor econômico, v.19, n.4620, 30/10/2018. Brasil, p. A4

 

Bandeira amarela na conta de luz pode levar a deflação em novembro 

Aricia Martins 

30/10/2018

 

 

A melhora do cenário hidrológico deve propiciar um quadro atipicamente tranquilo para a inflação no fim do ano, especialmente em novembro. A troca da bandeira tarifária vermelha patamar 2 para a amarela, anunciada na última sexta-feira pela Aneel, pode levar o IPCA à deflação no próximo mês. Isso não ocorre desde novembro de 1998 (-0,12%). Alguns economistas já cortaram as projeções para o IPCA de 2018, e a hipótese de que o índice supere a meta de 4,5% no ano voltou a se afastar.

Divulgado ontem pelo Banco Central, o boletim Focus mostrou ligeira redução no consenso de mercado para a alta do indicador oficial de inflação neste ano, de 4,44% para 4,43% entre a semana passada e atual. Economistas ouvidos pelo Valor, no entanto, já trabalham com variação um pouco menor, na ordem de 4,2%. Para 2019, a previsão mediana dos analistas no Focus ficou estável, em 4,22%. Os economistas consultados também mantiveram as projeções para o período, que estão próximas às do boletim.

Nas estimativas de Fabio Romão, da LCA Consultores, o IPCA vai diminuir 0,03% em novembro. A projeção anterior, que contava com a entrada em vigor da bandeira vermelha patamar 1, era de aumento de 0,09%. Para o ano, a consultoria cortou a projeção de alta do indicador de 4,4% para 4,2%. A bandeira amarela acrescenta R$ 1 nas contas de luz a cada R$ 100 quilowatts-hora (kWh) consumidos. A cobrança extra com a bandeira vermelha 2, nível mais caro, é de R$ 5 por 100 kWh.

Com o acréscimo menor, a tarifa de eletricidade residencial, que tem peso de 4,1% no indicador oficial de inflação, deve registrar deflação de 4,14% no próximo mês, calcula Romão, principal influência de baixa no IPCA. Como a energia é o item de maior participação em habitação, esse grupo deve cair 0,89% em novembro, diz. "A mudança do patamar 2 da bandeira vermelha para a amarela foi uma surpresa, é uma queda de dois degraus", observa.

Em relatório, a equipe econômica do Bradesco informa que também considerava em seu cenário a alteração para o patamar 1 da bandeira vermelha no próximo mês. "Incorporando essa surpresa, estimamos que o IPCA de novembro apresente uma variação próxima de zero", diz o departamento econômico.

A mudança para a bandeira amarela também não era esperada por Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos, que ajustou de 0,09% para zero a projeção para a trajetória do IPCA em novembro. "Não é difícil que o indicador entre em deflação no mês", disse, o que depende, em sua avaliação, da evolução dos preços de alimentos. Em 2018, a expectativa para a inflação oficial é de 4,2%.

Segundo Rosa, vai ajudar o comportamento dos preços no penúltimo mês do ano, além da energia elétrica, o arrefecimento dos combustíveis, devido à valorização cambial e à estabilização dos preços de petróleo no mercado internacional. A grande dúvida reside na variação dos alimentos, que devem refletir a recomposição ocorrida no atacado, ainda como resultado da alta do dólar antes de outubro, diz. Fora isso, afirma, "não há nenhum problema estrutural que possa afetar a inflação".

Menos otimista, Breno Martins, da Mongeral Aegon Investimentos, acha pouco provável que o IPCA entre no campo negativo em novembro, mas também reviu sua estimativa de alta para o mês em razão das contas de luz, de 0,22% para 0,09%.

Se a melhora no nível dos reservatórios prosseguir, observa Martins, é possível que a bandeira verde - que deixa as tarifas de eletricidade livres de cobranças extras por nível de consumo - seja acionada em dezembro. Neste caso, a previsão para o aumento do IPCA no último mês do ano passaria dos atuais 0,49% para 0,42%. Hoje, em seu cenário, há 50% de chances de que a bandeira amarela seja mantida após novembro, ante 25% de alteração para a cor verde.

Caso a hipótese de bandeira verde se confirme em dezembro, a projeção atual do Bradesco para a alta do IPCA no ano será cortada em 0,07 ponto percentual, diz a instituição. O número hoje está em 4,4%.