Valor econômico, v.19, n.4621, 31/10/2018. Empresas, p. B2

 

Cinco grupos vão disputar único leilão de rodovia de Temer 

Fernanda Pires

31/10/2018

 

 

Cinco grupos entregaram proposta para disputar o leilão da Rodovia de Integração do Sul (RIS). As operadoras de infraestrutura CCR e Ecorodovias, o fundo de investimentos Pátria, a companhia espanhola com atuação em construção e concessões Sacyr e um consórcio de três empreiteiras médias da região Sul concorrem para arrematar o único ativo rodoviário a ser licitado no governo Michel Temer (MDB).

O certame marca a retomada das licitações federais no setor após um jejum de mais de três anos - a ponte Rio-Niterói foi relicitada em março de 2015. Os envelopes foram depositados ontem no prédio da B3 e serão abertos amanhã, às 10 horas, no saguão da bolsa de valores, em São Paulo.

O número de concorrentes traduz a relevância da RIS, encarada como uma oportunidade escassa. Não é todo dia que se oferece ao mercado uma concessão de 30 anos de uma rodovia federal em uma região de tráfego consolidado, o que ajuda a explicar o interesse de estrangeiros. A Sacyr está em consórcio com uma subsidiária brasileira para tentar o seu primeiro ativo rodoviário no país.

A RIS reúne um lote de rodovias com 473,4 quilômetros e corta o Rio Grande do Sul em uma região em crescimento. Inclui a antiga Freeway, rodovia de 121 quilômetros da Concepa, concessionária da Triunfo Participações e Investimentos (TPI), que administrou o trecho por 21 anos até julho, quando o prazo de exploração terminou. A própria TPI olhou o ativo, mas a empresa está em recuperação extrajudicial.

Vence quem der o maior desconto sobre a tarifa-teto do pedágio fixada pelo governo em R$ 7,24 (referenciada a julho de 2018). Serão sete praças de pedágio. Quem oferecer deságio acima de 10% terá de apresentar um capital social adicional. Com o mecanismo, o governo cria uma trava para afastar lances "aventureiros" que, na prática, podem se mostrar inviáveis de cumprir. A taxa interna de retorno (TIR) do projeto é de 9,2% ao ano.

As obrigações de investimento são de R$ 7,8 bilhões, sendo que 30% devem ser feitos até 2022 sobretudo em obras de ampliação da capacidade e recuperação do sistema viário. Menos da metade do traçado - 225,2 quilômetros - terá de ser duplicada e isso poderá ser feito em até 18 anos. "Essa é uma vantagem em relação aos editais da terceira etapa", disse Fábio Sertori, sócio da equipe de infraestrutura do Cascione, Pulino, Boulos & Santos Advogados.

As últimas concessões rodoviárias feitas pelo governo Dilma Rousseff (PT) estipulavam prazo máximo de cinco anos para duplicações. Com exceção de uma, as empresas que arremataram ativos naquela rodada não conseguiram cumprir o prazo por problemas diversos, como dificuldades de financiamento e atrasos no licenciamento ambiental.

Além dos investimentos, a RIS exigirá do concessionário desembolso de aproximadamente R$ 5,6 bilhões a título de custos operacionais para conservação, operação e monitoramento ao longo dos 30 anos.

Vence a concorrência quem der o maior desconto sobre a tarifa-teto do pedágio fixada em R$ 7,24

O modelo da concessão traz modernizações contratuais, entre as quais regras rígidas para inclusão ou exclusão de obras, compartilhamento de parte dos ganhos de receita da concessionária por meio de investimento em faixas adicionais e imposição, pela agência reguladora, de obras de melhoria.

"Houve preocupação em reforçar o rigor do cumprimento das obrigações da concessionária, fechando lacunas para futuros pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro. Isso, a meu ver, reflete a busca do regulador por um resultado mais efetivo do programa de concessões rodoviárias", avalia o especialista em infraestrutura Paulo Cesena em análise feita a investidores.

Para ele, seria importante que estes aperfeiçoamentos viessem junto com um maior rigor no fortalecimento da segurança jurídica, o que não ocorreu. Cesena cita, por exemplo, custo de adequação das obras do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), risco de o licenciamento ambiental demandar compensações financeiras não previstas e risco de redução automática da tarifa por descumprimento do cronograma de investimentos - mesmo quando a concessionária não tiver dado causa e sem a garantia de uma compensação concomitante por eventuais custos adicionais.

"Há também o risco da indefinição da fórmula de indenização em caso de término antecipado da concessão [por caducidade, ou rescisão amigável ou judicial]", destaca.

Forte candidata a entrar na disputa, a Arteris desistiu de participar da concorrência, o que chamou atenção do mercado. A empresa, controlada da espanhola Abertis e do fundo canadense Brookfield, informou, por meio de nota, que a decisão decorreu de uma "uma avaliação interna de riscos e de rentabilidade do projeto". Disse ainda que "preferiu concentrar sua atuação nas próximas oportunidades do setor rodoviário, diante da carteira de projetos de concessões de rodovias a vir ao mercado nos próximos anos".