O globo, n. 31337, 25/05/2019. País, p. 6

 

Queiroz pagou R$ 133 mil em espécie por internação no Einstein

Chico Otavio

Gustavo Schmitt

25/05/2019

 

 

Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), Fabrício Queiroz pagou R$ 133,58 mil em espécie ao Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, onde foi internado em janeiro para retirar um câncer no cólon. Queiroz é investigado desde que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou que, entre 2016 e 2017, passou R$ 1,2 milhão pela sua conta bancária. O MP-RJ suspeita da prática de “rachadinha” — devolução de parte do salário de funcionários — no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) quando ele era deputado estadual. O pagamento ao Einstein foi feito em 14 de fevereiro. Desde que o assessor de Flávio recebeu alta do hospital, nunca se soube o valor das despesas pagas pelo procedimento médico. Na nota fiscal eletrônica das despesas de serviços hospitalares e diagnósticos à qual O GLOBO teve acesso, a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein informa que Queiroz ficou internado de 30 de dezembro de 2018 a 8 de janeiro de 2019. O tipo de internação foi “clínica médica”. N anota fiscal, o valor total da despesaédeR $86 mil. Lá, consta um desconto de R$ 16 mil, o equivalente a 20% dos custos hospitalares. Queiroz sustenta que conseguiu o abatimento eque o total da despesa com o hospital ficou por R$ 70 mil. Procurado por O GLOBO, o advogado de Queiroz, Paulo Klein, informou que o seu cliente pagou R$ 64,5 mil ao hospital em dinheiro vivo e outros R$ 5,42 mil foram quitados por meio de cartão de crédito.

Além disso, Klein disse que Queiroz pagou em espécie mais R$ 60 mil para a equipe médica e outros R$ 9 mil ao oncologista. Ele alega que o dinheiro vivo estava guardado na casa de Queiroz para amortizar o financiamento de um apartamento na Taquara, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio. O montante, segundo Klein, foi entregue à tesouraria do hospital pela mulher de Queiroz, Márcia Oliveira de Aguiar. Procurado, o Hospital Israelita Albert Einstein informou que “não abre informações sobre seus pacientes por questões de sigilo e privacidade”. O advogado de Queiroz, Paulo Klein, disse que o cliente tem como comprovar a origem do dinheiro utilizado. —A defesa vê com naturalidade o fato do Ministério Público investigar a origem dos recursos utilizados para pagamento das despesas médicas do Fabrício Queiroz. De outro lado, a comprovação dos pagamentos com recursos próprios e dentro da sua capacidade econômica só reforçam que ele jamais cometeu qualquer crime.

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) investiga movimentações financeiras de outros integrantes do antigo gabinete

de Flávio. Oito assessores transferiram recursos a Queiroz em datas próximas ao pagamento de servidores da Alerj. Segundo o Coaf, o então deputado estadual recebeu 48 depósitos no valor de R$ 2 mil.

Após faltar a quatro depoimentos ao MP, alegando problemas de saúde, Queiroz afirmou, em dezembro do ano passado, que a “movimentação atípica” revelada pelo Coaf teve origem na compra e venda de veículos.

Em março deste ano, Queiroz admitiu, em depoimento, que os valores recebidos de servidores do gabinete eram usados para “multiplicar a base eleitoral” de Flávio. Um ex-funcionário afirmou que repassava quase 60% do salário.

Quebra de sigilos

No mês passado, a Justiça do Rio autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Queiroz e outras 85 pessoas e nove empresas. Além de Flávio e Queiroz, terão suas informações bancárias averiguadas a mulher do senador, Fernanda Bolsonaro, a empresa de ambos, Bolsotini Chocolates e Café Ltda, as duas filhas de Queiroz, Nathalia e Evelyn, e a mulher do ex-assessor.

O Ministério Público do Rio aponta indícios da existência de uma “organização criminosa” no gabinete de Flávio na Alerj, para desviar recursos públicos, e descreve detalhes de movimentações financeiras suspeitas envolvendo o ex-deputado estadual e assessores parlamentares desde o ano de 2007. O material, com 87 páginas, foi apresentado à Justiça do Rio para pedir as quebras de sigilos, sob suspeita dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. No último sábado, a defesa de Queiroz entrou com um habeas corpus para anular as quebras de sigilo bancário e fiscal na investigação, sob o argumento de que a decisão judicial não tinha “embasamento legal”.

Flávio tem atacado o Ministério Público, questionando a legalidade das investigações e afirmando que está sendo usado para atingir seu pai, o presidente Jair Bolsonaro. Quando o relatório do Coaf veio à tona, em dezembro do ano passado, Flávio disse que não sabia “nada sobre o assunto” e que Queiroz trabalhou por mais de dez anos como seu segurança e motorista.