O globo, n. 31337, 25/05/2019. Economia, p. 21

 

Bolsonaro alerta que, sem reforma, país viverá caos econômico e poderá perder Paulo Guedes

Gustavo Maia

Marcello Corrêa

Daniel Gullino

Bárbara Nóbrega

25/05/2019

 

 

Guedes pode sair se reforma não for aprovada, diz Bolsonaro
Presidente e ministro negam atrito e alertam Congresso e governadores de risco de caos econômico

Após o ministro da Economia, Paulo Guedes, dizer à revista Veja que poderia “ir embora” caso a reforma da Previdência não fosse aprovada, o presidente Bolsonaro fez, no Nordeste, defesa enfática da proposta de reforma enviada ao Congresso, que prevê economia de R$ 1 trilhão. Bolsonaro negou atrito: “Se for uma reforminha ou não tiver reforma, não precisa mais de ministro da Economia, porque o Brasil pode entrar em caos econômico”. No fim do dia, disse em rede social que ‘‘o casamento segue mais forte que nunca’’. Guedes soltou nota expressando confiança no Congresso.
Opresidente Jair Bolsonaro fez ontem, em três momentos diferentes, uma defesa enfática da reforma da Previdência e deu um recado claro ao Congresso: se as mudanças não forem aprovadas, será uma catástrofe para o país e o ministro da Economia, Paulo Guedes, poderá deixar o cargo. As declarações foram dadas dois dias antes de manifestações convocadas em favor do governo.
Pela manhã, em sua primeira visita ao Nordeste como presidente da República, Bolsonaro comentou em Recife uma entrevista de Guedes à revista Veja, na qual o ministro disse que poderia ir embora para casa se só ele quiser a reforma. “Se eu sentir que o presidente não quer a reforma, a mídia está a fim só de bagunçar, a oposição quer tumultuar, explodir e correr o risco de ter um confronto sério... pego o avião e vou morar lá fora”. Questionado sobre as declarações, Bolsonaro disse que Guedes está “no direito dele” e não é obrigado a continuar no governo caso não sejam feitas as mudanças necessárias no sistema de aposentadorias: —Ele está no direito dele. Ninguém é obrigado a continuar como ministro meu. Logicamente, ele está vendo uma catástrofe. E é verdade. Concordo com ele, se nós não aprovarmos uma reforma realmente próxima da que nós enviamos para o Parlamento. 

Reforma de Japônes

O presidente aproveitou uma reuniãocomgovernadoresdo Nordeste para fazer um apelo pela aprovação da reforma. Ele afirmou que Guedes “não é nenhum vidente, mas não precisa ser para entender que o Brasil vai viver um caos econômico sem a aprovação dessa reforma”. Maistarde,emvisitaaPetrolina,Bolsonarovoltouaalertar
para o risco de seu principal ministrodeixarogovernocaso areformanãosejaaprovadaou caso ela seja aprovada pelos parlamentares com uma economiamuitoinferioràesperada pelo governo, que é de R$ 1 trilhão em dez anos. —Se for uma reforma de japonês, ele vai embora, é isso? Eu já respondi. Pequenininho. Lá (no Japão) é tudo miniaturizado — disse o presidente, que acrescentou ainda: —Ele (Guedes)tematérazão,emuita. Se for uma reforminha ou não tiver reforma, não precisa mais de ministro da Economia, porque o Brasil pode entrar em um caos econômico. Ele vai ter que ir para a praia, vai fazer o que em Brasília? Bolsonaro ainda fez referência às manifestações marcadas por seus apoiadores para ocorrer amanhã. Ele disse esperar que elas ocorram “dentro da normalidade”: —Não estou participando das manifestações. É uma manifestação espontânea. Tenho certeza que ocorrerá dentro da normalidade,
sem qualquer agressão a instituições ou a pessoas. Os comentários do presidente sobre Guedes geraram especulações sobre se o ministro — principal fiador da política econômica — estaria de saída do governo. Bolsonaro, então, recorreu às redes sociais para esclarecer a situação: “Peço desculpas por frustrar a tentativa de parte da mídia de criar um virtual atrito entre eu e Paulo Guedes. Nosso casamento segue mais forte
que nunca kkkkk. No mais, caso não aprovemos a Previdência, creio que deva trocar o Min. da Economia pelo da Alquimia, só assim resolve”, publicou o presidente. Guedes também decidiu se manifestar e fazer um afago ao Congresso. O Ministério da Economia divulgou nota em que “reafirma o total compromisso do ministro Paulo Guedes com a retomada do crescimentoeconômicodopaíserechaça qualquer hipótese de que possa se afastar desse propósito”. A pasta também disse que confirma “absoluta confiança no trabalho do Congresso Nacional, instituição com a qual mantém excelente diálogo, para garantir a aprovação da Nova Previdência com economia superior a R$ 1 trilhão”.

‘Não me sinto pressionado’

Na Câmara, as declarações de Guedes provocaram reações. O presidente da Casa, Rodrigo Maia, disse que acha que o ministro se expressou mal: — Ninguém acerta sempre no que fala. Eu acho que foi uma frase que ou está mal colocada ou está errada, e eu tenho certeza que o ministro, pela capacidade que tem, por ser uma pessoa muito preparada, já deve ter percebido isso e vai ajustar o discurso para que a gente volte a fazer nas próximas semanas o que ele tem feito nas últimas semanas. O relator da reforma da PrevidêncianaCâmara,deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), minimizou a turbulência. Para ele, as falas não são uma pressão sobre o Congresso. — Não me sinto nem um pouco pressionado, e tenho certeza que os deputados da Câmara não se sentem pressionados. São poderes independentes, que devem ter harmonia. Especialmente nesse aspecto da reforma, devem trabalhar juntos. Após encontro com Guedes no Rio, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, disse que espera a aprovação da reforma da Previdência na Câmara ainda neste primeiro semestre, com o projeto sendo votado no Senado no segundo semestre. Segundo ele, as mudanças nas aposentadoriasserãoapenasoinício do processo de retomada do crescimento no país.
— A Previdência não é uma panaceia que irá resolver os problemas econômicos do país. Agora, é o início desse ciclo virtuoso. Na hora em que o déficit deixar de aumentar, naturalmente você terá condições para que haja uma crença na retomada do crescimento.

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FMI reduz previsão de crescimento para entre 1% e 1,5%

Rennan Setti

25/05/2019

 

 

Resultados no primeiro trimestre, incerteza sobre reformas e crise na Argentina levaram órgão a diminuir projeção para o Brasil

O Fundo Monetário Internacional (FMI) reduziu ontem sua projeção de crescimento para a economia brasileira este ano, de 2,1% para entre 1% e 1,5%, citando frustração com o desempenho nos primeiros três meses do ano, incerteza sobre reformas e a crise na Argentina. O órgão disseaindaqueessasprojeções correm “riscos significativos”

de não se concretizar. O fundo também condicionou a aceleração do PIB em 2020 à aprovação de uma reforma da Previdência “robusta”.

O FMI se une a instituições como a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a agência de classificação de risco Fitch na redução das expectativas sobre o desempenho da economia brasileira. Na semana passada, a OCDE diminuiu sua projeção para este ano de 1,9% para 1,4%, enquanto a Fitch cortou sua estimativa para avanço do PIB de 2,1% para 1,5%. A revisão das projeções do FMI se deu após missão oficial do órgão em Brasília. “O crescimento em 2019 é estimado entre 1% e 1,5%, com riscos significativos de queda. Dependendo da aprovação de uma reforma da Previdência robusta e de condições financeiras favoráveis, o crescimento deve acelerar em 2020, apoiado pela recuperação do investimento privado”, disse o FMI em comunicado oficial divulgado na noite de ontem.

Previdência é 'crucial'

Segundo o texto do FMI, a reforma da Previdência “é o passo crucial” para “colocar a dívida pública em uma trajetória sustentável, elevando, assim, a confiança do investidor”, acrescentando que o Congresso precisa preservar a idade mínima e as alíquotas de arrecadação previstas no texto encaminhado pelo governo. “Para entregar o ajuste fiscal necessário, o Congresso deve preservar o aumento proposto nas idades de aposentadoria e diminuir os benefícios relativamente altos, sobretudo para funcionários públicos”, disse. O FMI observou, porém, que “medidas adicionais” de impacto fiscal também são necessárias “para cumprir o teto de gastos e estabilizar a dívida pública.” A missão do FMI observou que vê com bons olhos “a ambiciosa agenda de reformas” do governo, citando medidas como privatizações e simplificação tributária. Segundo o fundo, a taxa básica de juros de 6,5% está em nível que estimula a economia, situação “favorável no momento”. Alguns economistas têm defendido a redução dos juros por causa da lentidão econômica. O FMI sustenta que isso pode ser feito no futuro “à medida que a consolidação fiscal for contracionista” e “desde que as expectativas de inflação permaneçam bem ancoradas”.