Valor econômico, v.19, n.4603, 04/10/2018. Política, p. A9

 

Haddad hesita em definir nome para a Fazenda 

Fabio Graner 

Andrea Jubé 

04/10/2018

 

 

Às vésperas do primeiro turno da eleição, a campanha de Fernando Haddad vive o desafio não só de se viabilizar para o segundo turno, mas também de delinear mais claramente para a sociedade e o mercado financeiro o perfil do futuro condutor da economia. Na cúpula da campanha, há quem defenda que o petista anuncie já na segunda fase - se chegar lá - o nome de seu ministro da Fazenda. Mas há resistência a isso do próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que aconselha o candidato sobre a tática de campanha.

Nos bastidores da campanha, nomes e perfis para o comando da economia são ventilados, como o do banqueiro Luiz Carlos Trabuco, e do ex-ministro e candidato ao Senado pela Bahia, Jaques Wagner, entre outros. Mas a realidade é a falta de definição, que decorre de um importante dilema: a necessidade de evitar de pronto a pecha de estelionato eleitoral e a perda de sua base na esquerda, como o cometido por Dilma em 2014, que somente depois de reeleita anunciou o fiscalista Joaquim Levy para a Fazenda; e ao mesmo tempo, sinalizar uma postura que, sem desagradar a base petista, atraia o centro político e evite um quadro de pânico nos mercados, que pioraria a economia e atrapalharia o início da próxima gestão.

Enquanto Bolsonaro, a despeito das trombadas recentes, já deixou claro que a economia será dirigida pelo ultra privatizante Paulo Guedes, o que arrebatou os formadores de preço do mercado financeiro, Haddad tenta construir a ideia de que ele mesmo, com seu perfil moderado e bom relacionamento com representantes mais à direita no mundo econômico (como Marcos Lisboa e Samuel Pessoa), é a referência que deve ser observada para conduzir a economia.

Vale lembrar que em 2012, logo depois de eleito prefeito de São Paulo, ele escolheu para secretário de Finanças Marcos Cruz, da consultoria McKinsey, que o empresário Jorge Gerdau lhe havia apresentado. Fontes que têm conversado com investidores, sobretudo estrangeiros, apontam que de fato o temor com o PT estaria um pouco menor, mas ainda assim há uma preocupação com o que viria a ser um quinto governo petista na economia.

Nesse sentido, uma saída ao estilo "Trabuco", que foi sugerida pelo ex-presidente Lula em 2014 e tentada sem sucesso por Dilma, volta a ser mencionada por fontes ligadas ao PT. O banqueiro formado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFLCH) da USP - um reduto esquerdista, e do próprio Haddad -, sempre teve uma boa relação com os governos de Lula e Dilma, mostrando-se como alguém fora do perfil ultra ortodoxo de nomes de peso do mercado.

Mesmo assim, além de não se saber se haveria alguma disposição da parte dele (em 2014 ele não quis) também de pronto surgem objeções contundentes ao nome do banqueiro ou a alguém com seu perfil, dado que uma das bandeiras da campanha de Haddad é o combate ao spread bancário e soaria estranho ter um ex-banqueiro fazendo isso. Além disso, ainda ressoam ecos do "Fora Levy" na base petista, e foi Trabuco quem indicou Levy para Dilma.

Por isso, mesmo com as ponderações sobre a boa relação dele com os governos petistas, a militância poderia ver em uma eventual indicação de Trabuco (ou de alguém com seu perfil) como um novo estelionato eleitoral. Isso, em um ambiente até mais acirrado politicamente do que em 2014, poderia enfraquecer muito uma eventual gestão Haddad.

É nesse contexto que o nome de Jaques Wagner tem sido aventado: homem de diálogo e com trânsito em todos os setores, ele teria o condão de dar um verniz petista para a área econômica. Poderia ser uma nova versão da dupla Palocci/Meirelles, que marcou o primeiro governo Lula. Palocci, político neófito em economia, se cercou de quadros ortodoxos e o rumo da economia só foi alterado em 2006. O problema é que Wagner não quer, e já avisou que cumpriu todas as "missões" de que o PT lhe incumbiu em 40 anos de militância partidária.

Nesse quadro, ideias como anunciar um nome entre o primeiro e o segundo turno, que foi ventilada há algumas semanas, têm chance menor de acontecer, dados os riscos para ambos os lados. Mas, se conseguir vencer a disputa com Bolsonaro, Haddad não poderá adiar por muito tempo o anúncio do titular da Fazenda, para que a incerteza não se torne em prejuízo para sua eventual gestão.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Petista diz ser vítima de boatos e 'fake news'

Luiz Henrique Mendes 

Malu Delgado 

Marina Falcão

04/10/2018

 

 

Na fase mais delicada de sua campanha eleitoral até aqui, o candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, disse ontem ser vítima de uma onda de boatos e "fake news" disseminadas pelo aplicativo de mensagens WhatsApp. O petista, que viu os índices de rejeição ao seu nome dispararem, acusou a campanha de Jair Bolsonaro (PSL) de agir "fortemente" para distribuir mensagens de teor "muito vulgar".

Em entrevista à Rádio Jornal, de Recife, na manhã de ontem, Haddad afirmou que Bolsonaro promove a "baixaria" no WhatsApp. "Se ele fosse valente como diz que é, enfrentaria olho no olho e não no WhatsApp, que é coisa de covarde", afirmou Haddad à rádio.

Mais tarde, em entrevista coletiva na capital paulista, o candidato avaliou que a disseminação das fake news atinge sobretudo o público evangélico. A avaliação é que esses boatos ajudam a explicar o avanço o de Bolsonaro junto às mulheres da região Nordeste.

Nos últimos dias, "milhões" de mensagens com boatos e notícias inventadas foram enviadas, disse Haddad. "Isso está crescendo muito", ressaltou. Entre as mensagens, ele citou correntes com imagens de crianças sendo abusadas e mulheres nuas. No site da campanha de Haddad, há uma página dedicada ao combate de boatos. Uma das "fake news" que mais chamam a atenção é a da falsa entrega da mamadeiras eróticas para creches de São Paulo.

Durante a entrevista à rádio pernambucana, Haddad tentou afastar o espectro do ex-ministro José Dirceu de sua campanha e de seu governo. Haddad disse que o ex-ministro não terá "nenhum papel" em eventual governo. Questionado por um repórter sobre as recentes declarações de Dirceu sobre retirar os poderes do Supremo Tribunal Federal (STF), ele desconversou. "Aí você tem que entrevistar o José Dirceu", acrescentou Haddad.

Segundo o professor da USP, Pablo Ortellado, coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai), é pelo whats app é que é feito o "jogo sujo" eleitoral, exatamente pela impossibilidade de monitoramento. "São redes fechadas, monitoramos pouco mais de uma centena de listas públicas, mas isso é um universo pequeno, pouco representativo ", explicou.

O professor acredita que o PT, nesta guerra, leva desvantagem. "A grande diferença é que os apoiadores de Bolsonaro têm redes com penetração bem heterogênea, construídas há mais tempo, bem antes da eleição", afirma. O candidato do PSL teria, segundo Ortellado, construído suas redes de whats durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff e também ao longo da greve dos caminhoneiros.

_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Estagnado, Ciro tenta manter militância acesa 

Fabio Murakawa 

04/10/2018

 

 

Estacionado nas pesquisas de intenção de voto, o presidenciável Ciro Gomes (PDT) e o núcleo de sua campanha tentam manter a militância acesa até domingo, na esperança de uma improvável virada que o coloque no segundo turno da eleição.

"O medo se espalhou de um jeito que eu não posso aceitar. É preciso que o povo brasileiro tenha ao menos o direito de votar com esperança", disse ele ontem a jornalistas, ao chegar para evento com militantes na sede estadual do PDT em São Paulo. "É hora de inflamar a militância. A ordem agora é de descer para a rua até as 17 horas do dia 7 de outubro. A eleição está completamente aberta."

Ao fim da entrevista coletiva, ouviu apelos de um simpatizante: "Ciro, não desiste! Não desiste!"

Em levantamento do Ibope ontem, Ciro apareceu com 10% das intenções de voto. Manteve-se, portanto, no mesmo patamar das últimas oito pesquisas do instituto desde 20 de agosto. Nesse período, seu principal concorrente no campo da esquerda, Fernando Haddad (PT), subiu de 4% para 23%. E Jair Bolsonaro (PSL), de 20% para 32%.

No evento no PDT paulista, diante de dezenas de apoiadores que se espremiam em uma pequena sala para ver Ciro, o candidato do PDT ao Senado em São Paulo, Antonio Neto, cometeu um sincericídio ao microfone. "Está uma cara de velório aqui. Está uma cara de velório isso aqui", disse.

Depois, explicitou uma outra tática, já utilizada por Ciro, para manter o ânimo dos militantes: desacreditar os institutos de pesquisa. "Nós não acreditamos nessas conversa mole de pesquisas."

Ciro, por sua vez, apelou aos eleitores que "não entreguem seu voto" aos institutos que fazem esses levantamentos.

"Neste país, até o presidente da República foi processado por corrupção", disse. "Será que os institutos de pesquisa estão acima, protegidos como verdadeiros anjos, dessa onda de corrupção que não guarda limite?"

Ciro também partiu ao ataque contra Bolsonaro, a quem chamou de falso como "nota de R$ 3". Ele desafiou o candidato do PSL a comparecer hoje ao debate da TV Globo, o que o rival já sinalizou que não fará por estar se recuperando de uma facada no abdômen. "Eu estou avisando a vocês: esse Bolsonaro é uma cédula de R$ 3", disse, antes de lembrar que "atestado médico falso é crime".

Ciro Lembrou que Bolsonaro "há 28 anos é deputado federal pelo Rio, epicentro da corrupção" e "meteu na política todos esses esquisitíssimos filhos dele, tudo ovinho de serpente de nazistoide". Ele criticou os questionamentos feitos por Bolsonaro às urnas eletrônicas como "papo furado".

Ciro também fez um mea culpa sobre o movimento "ele não", liderado por mulheres contra Bolsonaro, mas que em sua opinião acabaram beneficiando o rival.

"Chega de 'não', é preciso dizer 'sim' agora a quem você quer. É isso que eu quero pedir para as mulheres brasileiras, que fizeram à manifestação mais linda do país nesta campanha", disse. "Eu estava junto e depois percebi que, quando nós demos a ideia do 'ele não', acabamos trazendo uma polarização que não ajudou a nossa causa. Não tem 'ele não' na urna. O que tem na urna é 12, é 13, é 18."