Valor econômico, v.19, n.4626, 08/11/2018. Brasil, p. A4

 

Moreira ainda quer MP para destravar gasodutos 

Daniel Rittner 

Fabio Graner 

08/11/2018

 

 

A menos de dois meses da troca de governo, o Ministério de Minas e Energia está encaminhando ao presidente Michel Temer uma medida provisória para destravar investimentos em gasodutos no país. O objetivo da MP, conforme antecipou ao Valor o ministro Moreira Franco, é permitir que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) dê aval para novos projetos por meio de autorizações. Pela lei atual, os empreendedores têm que aguardar leilões da agência para construir dutos sob o regime de concessão.

De acordo com Moreira, a equipe do presidente eleito, Jair Bolsonaro, não foi consultada sobre o assunto, mas isso não constitui problema. "Não existe começo ou fim de governo. Pensamos o país com continuidade e o presidente [Temer] trabalha até o dia 31 de dezembro", disse o ministro. "Se eles não quiserem, retirem a MP [do Congresso Nacional]. É direito deles, mas também é obrigação nossa resolver os problemas."

Mudar o regime pelo qual os gasodutos são construídos parece uma filigrana técnica, mas pode ter efeito direto na velocidade com que novos projetos saem do papel. Com a Lei do Gás, sancionada em 2009 pelo ex-presidente Luiz Inácio do Lula da Silva, os dutos precisam ser incluídos no Plano Decenal de Expansão da Malha de Transporte Dutoviário para serem leiloados pela ANP.

No novo modelo, bastará ao transportador interessado pleitear à agência uma autorização para o projeto. "Não há por que fazer leilão de gasoduto. A agência precisa de autonomia para fazer autorização. Em qualquer país do mundo é assim", disse Moreira.

Ontem à noite, o plenário do Senado aprovou projeto de lei que cria um programa chamado Brasduto, cujo objetivo é aumentar a malha de transporte de gás com financiamento por 20% da receita obtida com a venda de petróleo do pré-sal pertencente à União. A proposta segue agora para a Câmara dos Deputados.

Em referência indireta ao projeto, Moreira lamentou que investidores busquem articular soluções no Congresso Nacional para garantir subsídios. "E subsídio, no Brasil, não tem prazo. Quando se consegue um, é para sempre."

O projeto tem outro ponto rejeitado pelo ministro, que é uma solução legislativa para o risco hidrológico das usinas hidrelétricas, uma novela que se arrasta há anos e tem levado à paralisia da liquidação financeira das operações de compra e venda de energia. "É a Aneel quem deve resolver. É uma questão regulatória."

Com isso, Moreira sinaliza que, se o projeto for aprovado pela Câmara nas próximas semanas e chegar ao Palácio do Planalto para sanção de Temer antes da virada do ano, esse ponto deverá receber recomendação de veto pela pasta.

Em entrevista na terça-feira para fazer um balanço de sua gestão, o ministro apontou a necessidade de reforma do setor elétrico como uma agenda necessária. "Temos no Brasil um modelo soviético, que precisa ser desmontado." Segundo ele, não só o peso do Estado em sua concepção foi muito grande, como há falta de transparência, multiplicação de conselhos e comitês, uma enormidade de subvenções embutidas nas tarifas. "Nenhum consumidor sabe que 51% do que ele paga é subsídio e imposto."

No meio do núcleo decisório do governo Temer, Moreira revelou ter se impressionado com a dificuldade da máquina pública em resolver situações. Um dos exemplos que ele menciona é a revisão do contrato de cessão onerosa de blocos do pré-sal à Petrobras. Ainda não houve acordo entre as partes - por detalhes.

"A Constituição de 1988 foi extremamente positiva, mas trouxe uma tendência de diminuir a ação do Poder Executivo. A experiência da ditadura militar parece ter feito os constituintes enxergarem no Poder Executivo algo prejudicial aos interesses da sociedade. Daí o fortalecimento dos órgãos de controle, que passam a ser um empecilho. As pessoas [no Executivo] têm medo."