O globo, n. 31333, 21/05/2019. País, p. 4

 

Idas e vindas

Bernardo Mello

Gabriel Martins

Marcello Corrêa

Gustavo Maia

21/05/2019

 

 

Bolsonaro critica classe política e, horas depois, afirma que valoriza o Congresso.

O presidente Jair Bolsonaro deu ontem sinais contraditórios sobre sua relação com o Congresso, mas terminou o dia fazendo um esforço para melhorar a articulação política para aprovar a reforma da Previdência. Pela manhã, Bolsonaro afirmou em evento na Federação das Indústrias do Rio (Firjan) que “o grande problema” do Brasil “é a nossa classe política”. À tarde, no Palácio do Planalto, mudou o tom e disse que “valoriza, sim, o Parlamento”.

As falas de Bolsonaro ocorreram três dias depois de o presidente compartilhar um texto, via WhatsApp, em que o país é descrito como “ingovernável” fora de “conchavos políticos”.

A atitude foi alvo de críticas de lideranças partidárias, que vêm impondo dificuldades para a formação de uma base aliada consistente no Congresso.

Com problemas na articulação política, o governo corre o risco de ver caducar a medida provisória (MP) 870, que reduziu o número de ministérios e reorganizou o Executivo. A MP precisa ser votada até 3 de junho, quando perde a validade. Deputados também ameaçam derrubar decretos de Bolsonaro, como o que flexibilizou as regras para o porte de armas.

—[O Brasil] É um país maravilhoso que tem tudo para dar certo, mas o grande problema é a nossa classe política. — disse Bolsonaro, em discurso na Firjan.

O presidente afirmou que está aberto ao diálogo, mas levantou suspeitas sobre a motivação de parte

dos parlamentares:

— O que eu mais quero é conversar. Mas sei que tem gente que não é (quer) apenas conversar.

Horas depois, de volta a

Brasília, o presidente fez um aceno ao Congresso, durante lançamento da segunda fase da campanha publicitária sobre a reforma da Previdência.

—Nós valorizamos, sim, o Parlamento brasileiro, que vai ser quem vai dar a palavra final nesta questão da Previdência, tão rejeitada ao longo dos últimos anos — disse ele.

Bolsonaro afirmou que está disponível para receber deputados e senadores para corrigir possíveis “equívocos” da proposta enviada ao Congresso.

— Aos parlamentares como um todo quero dizer: só não recebo mais por falta de agenda. Mas gostaria de continuar a conversar com o maior número possível de vocês para que possíveis equívocos, possíveis melhoras, nós possamos junto ao Parlamento brasileiro buscar —disse Bolsonaro,

antes de acrescentar:

—Se bem que pretendemos que nossa reforma saia de lá com o menor número possível de emendas aprovadas.

Na última sexta-feira, o presidente da Comissão Especial que analisa a proposta de emenda à Constituição (PEC) na Câmara, Marcelo Ramos (PR-AM), havia dito que o colegiado proporia um texto alternativo, rejeitando mudanças como as novas regras para professores e o regime de capitalização. Parlamentares passaram a defender abertamente que o Congresso assumisse o protagonismo nas reformas necessárias para o país retomar o crescimento.

'Não há briga'

Apesar disso, Bolsonaro afirmou ontem de manhã, na Firjan, que não há briga entre os poderes.

— [As pessoas] Querem agilidade para votar as propostas

na Câmara e no Senado. Se a Câmara e o Senado têm propostas melhores do que as nossas, que coloquem em votação. Não há briga entre os Poderes. O que há é uma grande fofoca que nos inviabiliza por vezes —disse o presidente, em uma crítica à atuação da imprensa.

Em meio às dificuldades na articulação política, Bolsonaro ressaltou a importância da aprovação da reforma:

— Se não fizermos isso (reforma da Previdência), no máximo em 2024 vai faltar dinheiro para pagar quem está na ativa.

O presidente frisou que a falta de recursos trava progressos em diversas áreas:

—O problema agora é dinheiro. Por isso, precisamos da reforma da Previdência . Ela é salgada para alguns, mas estamos atacando privilégios.