O globo, n. 31330, 18/05/2019. Opinião, p. 2

 

Polêmica sobre leis de drogas volta com força

18/05/2019

 

 

Aprovação de projeto no Senado que torna compulsória internação de dependentes esquenta debate

A eleição de Jair Bolsonaro, conduzida por uma onda conservadora, mas também por forte sentimento antipetista, leva para a agenda do país temas no mínimo polêmicos, em torno dos quais pesquisas não detectam consenso. A recente decretação da liberalização da posse e do porte de armas é forte exemplo, rejeitada por ampla maioria da população, segundo sondagens de opinião pública. Em nada reduza legitimidade concedida pelas urnas ao presidente para tentar executar sua pauta. Mas cabe às instituições da República examinarem propostas e medidas com base na Constituição. O caso das armas recebeu pareceres jurídicos do Congresso contrários ao uso do instrumento do decreto presidencial para alterar lei aprovada pelo Legislativo, o Estatuto do Desarmamento. É assim que funciona o sistema de freios e contrapesos. Outro tema, também da pauta conservadora, reacende debates, e com um envolvimento direto do Judiciário,

havendo risco de choque entre Supremo e Congresso. Éaqu estão do problema das drogas vistada perspectivado usuário. Na quarta, foi da doum passo para este possível choque, coma aprovação pelo Senado de projeto do ex-deputado Osmar Terra, para instituir a internação compulsória de dependentes químicos, método rejeitado por especialistas. A terapia da abstinência forçada tem pareceres contrários, de defensores do método de redução de danos, que busca apoiar o dependente químico no abandono paulatino dou soda droga— até mesmo com o fornecimento dela para ser usada em local seguro e com atendimento profissional. Por óbvio, há casos que requerem abordagem mais forte, porém transformara internação compulsória em política pública não parece aconselhável. Conhecido defensor de ações duras contra tráfico e consumo, Osmar Terra, hoje ministro da Cidadania, conseguiu com seu projeto também elevar de cinco para oito anos de reclusão a pena mínima de chefes do tráfico. O problema é que se volta a deixar em aberto, a depender da decisão do juiz, o enquadramento do preso como usuário ou traficante.

Este ponto é central em um julgamento suspenso no Supremo, a ser retomado em 5 de junho, sobre a descriminalização do porte de drogas. Trata-se de um processo que era relatado pelo ministro Teori Zavascki, morto em acidente aéreo e substituído por Alexandre de Moraes. Este pediuvistado caso, quevol ta agoraà pauta. Dos 11 ministros da Corte, três— Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso — já votaram pela descriminalização. Há nuances nos votos. Gilmar Mendes, por exemplo, considera inconstitucional criminalizar o próprio porte de drogas.

A Corte discute a definição de quantidades que caracterizem consumidor e traficante, como fazem outros países. Este parâmetro é fundamental para impedir que policial e juiz decidam sobre a prisão de pessoas sem qualquer base concreta formal. A retomada do julgamento no STF é oportuna.