O globo, n. 31330, 18/05/2019. Sociedade, p. 27

 

Papa aceita renúncia de bispo de Limeira acusado de acobertar assédio

Gustavo Schmitt

Henrique Gomes Batista

18/05/2019

 

 

Religioso também é investigado por cobrar dinheiro e favores de padres para mantê-los nas paróquias que desejam; Vaticano quer usar caso como exemplo de tolerância zero contra corrupção

Investigado por extorsão de padres e por acobertar casos de assédio sexual e pedofilia em Limeira, no interior de São Paulo, o bispo diocesano Dom Vilson Dias de Oliveira decidiu renunciar ontem às suas funções eclesiásticas. Segundo a Santa Sé, o Papa Francisco aceitou a renúncia. Oliveira, que comandava 102 igrejas, também está sob investigação do próprio Vaticano, assim como o padre Leandro Ricardo, que é acusado de assédio sexual, inclusive de menores. O padre foi afastado em janeiro, logo após a polícia abrir o inquérito para apurar o caso. O padre Leandro e o bispo negam as acusações. No lugar de Dom Vilson, segundo o Vaticano, Dom Orlando Brentes, da Arquidiocese de Aparecida, assumirá a Diocese de Limeira por um período de até um ano. No último sábado, cerca de cem fiéis fizeram um protesto contra o sacerdote em frente à basílica Santuário Santo Antônio de Pádua, em Americana. No ato, os manifestantes exibiram faixas e cartazes com os dizeres “chega de abuso”, “Fora Vilson” e “Fora Leandro”.

Em março, O GLOBO revelou denúncias de seis padres que afirmaram que o bispo condicionava a pagamentos em dinheiro a permanência ou a transferência de subordinados em determinadas igrejas, sobretudo as de regiões mais ricas. De acordo com os padres, o sacerdote não escondia que seus “pedidos” eram para uso pessoal, como móveis, despesas de obras e melhorias nos dez imóveis que possui e até festas. Em fevereiro, outra reportagem antecipou que o Vaticano usaria as denúncias de abusos de menores e corrupção na Diocese de Limeira como exemplo da nova política de tolerância zero da Igreja contra esse tipo de crime. Isso levaria ao afastamento do bispo e à expulsão do padre, punição mais severa antes da excomunhão.

No último dia 8, a Polícia Civil decidiu pedir a prorrogação da investigação que envolve o bispo e o padre Leandro.

Em uma das acusações contra o sacerdote, o padre Edson Tagliaferro disse à polícia em 22 de março que repassou R$ 4 mil do

caixa de sua paróquia para a construção de um poço artesiano numa casa de praia de Dom Vilson, em Itanhaém, na Baixada Santista. O repasse foi feito em 2015.

Pedido para mudança de depoimento

Ao GLOBO, o padre afirmou que foi procurado por Dom Vilson pós o depoimento para tratar da possibilidade de um novo testemunho à Justiça. O bispo, segundo Tagliaferro, teria lhe explicado que a motivação do repasse caracterizaria uso pessoal do dinheiro e que poderia prejudicá-lo. Perguntou então a Tagliaferro se este poderia acrescentar no depoimento que os R$ 4 mil seriam usados no projeto de uma horta comunitária em sua casa de praia, onde são plantados legumes e verduras para abastecer o seminário de Limeira, a 280 quilômetros de Itanhaém.

—Eu fui ao encontro do bispo na casa paroquial da igreja de Artur Nogueira. Ele (Dom Vilson) explicou que, na verdade, não poderia fazer um poço em sua casa porque não teria autorização ambiental. O dinheiro seria para uma horta comunitária. A intenção dele era que eu procurasse o seu advogado e que a gente colocasse isso no depoimento como um adendo —contou o padre. Tagliaferro reiterou que em 2015, quando o bispo lhe solicitou os R$ 4 mil, justificou que o destino era um poço artesiano.

— Eu deixei claro pra ele (Dom Vilson) que não inventei nada, só falei o que o dinheiro era para o poço artesiano — completou Tagliaferro, que não foi à polícia prestar um novo depoimento.

Dom Vilson foi ouvido pela reportagem sobre o caso no dia 1º de maio, quando participou de evento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Aparecida. O bispo disse que conversou com o padre Tagliaferro, mas negou que tenha pedido mudança na versão do depoimento para se livrar das acusações. Ele confirmou que não tem poço artesiano em sua casa de praia, e disse que tem um projeto de uma horta comunitária para abastecer o seminário de Limeira. A reportagem foi à delegacia seccional de Limeira para perguntar se a polícia tinha informações sobre a possibilidade de o bispo pedir mudança do depoimento do padre. No entanto, ninguém quis comentar o caso, sob a alegação de que corre em segredo de Justiça.

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Salles questiona gestão do Fundo Amazônia, mas tem a análise contestada

Renato Grandelle

Silvia Amorim

18/05/2019

 

 

Em um diagnóstico divulgado ontem sobre contratos do Fundo Amazônia, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, indicou supostas irregularidades no contrato entre o programa e as organizações não governamentais (ONGs). Segundo ele, não há comprovação de que os recursos aplicados na iniciativa ajudaram a reduzir o desmatamento ilegal na Amazônia.

A equipe do ministro analisou 25% dos 103 contratos assinados, em sua maioria, de 2013 a 2015. Entre as “disfuncionalidades” estão prestações de contas incompletas, relatórios de desempenho sem comprovação e gasto excessivo com folha de pagamentos. Salles defendeu mudanças na gestão do fundo, cuja responsabilidade é do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e não de sua pasta. —Essa informação de que reduziu o desmatamento em função dos contratos do Fundo Amazônia é uma mera interpretação. Não há nenhum indicativo no relatório do fundo que leve a essa conclusão —afirmou o ministro. Horas depois, no entanto, a Embaixada da Noruega no Brasil exaltou o programa em um comunicado, definindo a redução do desmatamento na Amazônia como uma “inspiração para o mundo”. Também aprovou o modo como o programa é administrado. O país é o maior doador do Fundo Amazônia: desembolsou R$ 1,2 bilhão, seguido por Alemanha (R$ 68 milhões) e Petrobras (R$ 7 milhões): “A Noruega está satisfeita com a robusta estrutura de governança do Fundo Amazônia e os significativos resultados que as entidades apoiadas pelo fundo alcançaram nos últimos 10 anos. Não recebemos nenhuma proposta das autoridades brasileiras para alterar a estrutura de governança ou os critérios de alocação de recursos do fundo”.