Valor econômico, v.19, n.4633, 21/11/2018. Brasil, p. A4

 

Brasil e Chile fecham acordo bilateral em questões não tarifárias 

Francisco Góes 

21/11/2018

 

 

Brasil e Chile assinam hoje, na presença dos presidentes Michel Temer e Sebastián Piñera, um amplo acordo de livre comércio (ALC), incluindo temas não tarifários em áreas como serviços, telecomunicações, medidas de facilitação comercial, propriedade intelectual e micro, pequenas e médias empresas. Ao todo, fazem parte desse acordo bilateral, o maior já assinado pelo país na área não tarifária, 17 temas distribuídos em 24 capítulos. O entendimento potencializa os benefícios do Acordo de Complementação Econômica (ACE 35), de 1996, que eliminou as tarifas de importação no comércio entre o Mercosul e o Chile.

"O acordo é importante porque revela a estratégia de reforçar a parceria entre os dois países", disse o ministro Michel Arslanian, diretor do departamento de integração econômica regional do Itamaraty. A liberalização do comércio prevista pelo ACE 35 foi gradual e atingiu 100% de redução tarifária em 2014, algo que não aconteceu ainda no Mercosul.

Arslanian disse que reduzir tarifas dinamiza o comércio, mas reconheceu que não é suficiente porque, apesar da eliminação de impostos de importação, muitas vezes os países aplicam barreiras não tarifárias. Daí, portanto, a importância do novo acordo, que reúne em um só documento todo o marco não tarifário.

O Chile é o segundo principal parceiro comercial do Brasil na América do Sul, e também importante destino de investimentos brasileiros. Em 2017, comércio bilateral alcançou US$ 8,5 bilhões, com alta de 22% sobre 2016. De janeiro a setembro de 2018, o intercâmbio chegou a US$ 7,21 bilhões, mais de 13% acima que no mesmo período de 2017. O Brasil é o principal destino de produtos e investimentos chilenos na América Latina, segundo o Itamaraty.

O presidente Michel Temer é esperado em Santiago esta manhã para o evento de assinatura do acordo, no Palácio de la Moneda, sede do governo, onde será recebido pelo mandatário chileno, Sebastián Piñera. A assinatura será dos chanceleres Aloysio Nunes Ferreira e Roberto Ampuero, do Chile. A implementação dependerá da aprovação pelos parlamentos dos dois países.

O acordo começou a ser negociado em abril por ocasião da visita de Piñera a Brasília. As negociações se estenderam entre junho e outubro e houve quatro rodadas negociadoras até a conclusão, no mês passado. O objetivo é que o novo acordo permita impulsionar os fluxos de comércio e investimentos.

Na área de facilitação de comércio, o acordo prevê mecanismos para agilizar o processo comercial com a adoção, por exemplo, de um certificado de origem digital [para comprovar a origem do produto]. Por ser digital, o custo desse certificado será cerca de 35% menor, nas contas do Ministério da Indústria e Comércio (Mdic), e o prazo de emissão cai de três dias para 30 minutos.

Na parte regulatória, uma medida que terá impacto direto para os usuários será a eliminação das tarifas de roaming internacional para dados e telefonia móvel. Será a primeira vez que o Brasil assume em acordo bilateral compromissos em matéria de comércio eletrônico, boas práticas regulatórias e transparência em anticorrupção, entre outros temas. O acordo tem um anexo sobre produtos orgânicos e na área de propriedade intelectual reconhece a indicação geográfica da cachaça brasileira e do pisco chileno.

Arslanian disse ainda que o acordo pode funcionar como um vetor de aproximação entre o Mercosul e a Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, Peru e México) e reforçar a integração regional. De acordo com o diplomata, os países da região vão chegar a janeiro de 2019 com uma "virtual" área de livre comércio em matéria tarifária na América do Sul.

Para especialistas, será preciso observar como irá se comportar o Brasil na relação com seus vizinhos, a partir do governo Bolsonaro, que tem sinalizado interesse em privilegiar a relação com os Estados Unidos.