Correio braziliense, n. 20461, 29/05/2019. Brasil, p. 6

 

Líderes de massacre no presídio de Brasília

Isa Stacciarini

29/05/2019

 

 

Nove integrantes da facção Família do Norte, responsável pelo assassinato de 55 detentos em cadeias de Manaus, no domingo e na segunda-feira, chegaram ontem à noite à Penitenciária Federal de Segurança Máxima da capital

Pela terceira vez neste ano, a Penitenciária Federal de Segurança Máxima em Brasília recebeu líderes das principais facções criminosas do país. Ontem, bandidos envolvidos no massacre nas cadeias de Manaus desembarcaram na capital da República. A unidade abriu nove vagas para receber os chefes da Família do Norte (FDN), grupo responsável pelos atentados em quatro presídios do Amazonas. Em todo o país, o Departamento Penitenciário (Depen) liberou 20 vagas nas cinco cadeias do sistema federal.
Os presos chegaram em aviões disponibilizados pelo estado amazonense e pousaram por volta das 22h no Aeroporto Internacional de Brasília. Seis dos criminosos devem ser transferidos a outros presídios nos próximos dias. Eles vieram acompanhados por servidores do Depen e foram levados em comboio para a Penitenciária Federal. A estratégia é isolar os presos e deixá-los distantes de onde mantêm influência. Até agora, a matança por disputa de poder na facção deixou 55 vítimas nas cadeias de Manaus. As mortes ocorreram entre domingo e segunda-feira. As vítimas foram asfixiadas ou perfuradas com escovas de dente.
Em 22 de março, a penitenciária de Brasília recebeu o chefe do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Willian Herbas Camacho, o Marcola. Com ele, vieram outros três integrantes da cúpula do PCC. Antes, o irmão de Marcola, Alejandro Juvenal Herbas Camacho Júnior, conhecido como Marcolinha, tinha sido alojado na penitenciária. Ele chegou em 13 de fevereiro com outros dois presos.
A unidade, inaugurada em outubro de 2018, é a quinta de segurança máxima do país. Orçado em R$ 40 milhões, o presídio seria concluído em 2014, mas a construtora responsável faliu e abandonou a obra. O prédio fica na mesma área do Complexo Penitenciário da Papuda e tem vaga para 208 internos. Ao todo, são quatro pavilhões de acesso restrito. Em cada bloco, existem quatro corredores com 13 celas. Os internos ficam sozinhos em um espaço de pouco mais de 6m², com cama de concreto armado, duas prateleiras, pia e vaso sanitário.
Situação dramática
Os outros presídios de segurança máxima ficam em Mossoró (RN); Catanduvas (PR); Porto Velho (RO); e Campo Grande (MS). Para evitar que os presos fiquem em regiões onde cometeram os crimes, a Justiça Federal indica outra unidade. A transferência e inclusão deles em estabelecimentos penais federais são reguladas pela Lei nº 11.671/2008.
Alguns dos principais criminosos do país que estão em penitenciárias de segurança máxima são Luiz Fernando da Costa, conhecido como Fernandinho Beira-Mar, líder da facção Comando Vermelho (CV) no Rio de Janeiro; Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, chefe do tráfico na Favela da Rocinha e o responsável pelo assassinato do jornalista Tim Lopes, Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco.
As 55 mortes ocorridas em Manaus escancaram a situação dramática em que se encontra o sistema penitenciário da região. Por falta de espaço, a maioria dos corpos chegou a ser colocada em um caminhão frigorífico alugado pelo governo do estado. Os massacres de domingo e segunda-feira ocorreram no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), no Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), na Unidade Prisional do Puraquequara (UPP) e no Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM 1). Cerca de 200 detentos ameaçados de morte foram separados dos demais e as visitas foram suspensas.
Na tentativa de conter a crise, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, determinou o envio de uma Força-tarefa de Intervenção Penitenciária ao estado. Ontem em Lisboa, onde participou de uma palestra sobre o combate à corrupção, Moro afirmou que os assassinatos são resultado “de um certo descontrole do poder estatal em relação a essas prisões”.
O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), descartou a possibilidade de o confronto de facções ganhar dimensões maiores. Já para o ex-secretário de segurança do Distrito Federal, Arthur Trindade, “analisando as rebeliões que aconteceram nos anos anteriores, há, sim, uma boa possibilidade de serem replicadas em outros estados.”
O ex-secretário explica ainda que a mesma facção é responsável pelas rebeliões que ocorreram no Pará no início do ano. “Faz parte da área de atuação da mesma facção. A chamada Família do Norte (FDN) atua no Norte do país” ressalta. (Com Ingrid Soares, Marina Torres* e Rafaela Gonçalves*)