O globo, n. 31328, 16/05/2019. País, p. 4

 

Fogo amigo

Amanda Almeida

Bruno Góes

Marco Grillo

Natália Portinari

16/05/2019

 

 

Líderes do PSL no Congresso desafiam Onyx e atacam secretário de Moro

As dificuldades na relação entre o Palácio do Planalto e o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, atingiram novo grau ontem, com críticas diretas de lideranças do partido no Congresso a integrantes do governo. Na Câmara, os líderes da legenda, Delegado Waldir (GO), e do governo, Major Vitor Hugo (GO), reprovaram falas do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Já no Senado, o líder do PSL, Major Olímpio (SP), afirmou que o secretário nacional de Segurança Pública, Guilherme Thoephilo, um dos principais auxiliares do ministro Sergio Moro, não tem “qualificação para o cargo”.

Os sintomas de desarticulação na base do governo aparecem uma semana após derrotas consecutivas lideradas pelo centrão, co mona tramitação da MP da reforma administrativa ena transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) do ministério da Justiça para a Economia.

Enquanto os deputados ouviam ontem o ministro da Educação, Abraham Weintraub, Delegado Waldir defendeu a convocação de Onyx para dar explicações ao plenário. A origem da insatisfação está em uma reunião no Palácio do Planalto, na terça-feira, com 12 líderes e Bolsonaro, que dá dimensão da desconfiança mútua que tem marcado a relação do governo com o Congresso.

Parlamentares presentes deixaram o encontro afirmando que o presidente havia desistido do corte de verba na educação, o que foi desmentido por Onyx e pela líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), que não estavam na reunião. O chefe da Casa Civil disse que o anúncio sobre o recuo de Bolsonaro era uma tentativa de tirar “vantagem política” do episódio, enquanto Joice chamou a situação de “boato barato”.

— O ministro (Onyx) vai ter que explicar isso. Vamos convocá-lo aqui para explicar quem queria levar vantagem. Os líderes partidários foram convocados pelo líder do governo (Major Vitor Hugo). Ele (Onyx) vai ter que dizer quais líderes queriam levar vantagem. Vai ter que explicar qual “troca lá” que nós ganhamos para conversar com o presidente. Ele não nos acusou disso, de estar atrás de vantagem? Então tem que explicar qual vantagem. Ou pede desculpa e diz que falou asneira. Eu não aceito manchar minha moral e honra. Ele falou besteira — disse o deputado Delegado Waldir.

"'Incômodo' e 'provocação'"

Já Major Vitor Hugo avisou que a postura de Onyx causou “incômodo em diversos parlamentares”:

— A declaração do ministro (Onyx) foi infeliz. Tive que ligar para vários deputados para dizer “não se volte contra o governo”.

Joice rebateu os colegas de partido, e classificou a possibilidade de convocação de “provocação”:

— Eu acho que não ajuda em nada. O presidente falou hoje (ontem) de novo sobre a questão do contingenciamento. Ele disse: “Não tem dinheiro. Eu recebi um orçamento arrebentado”. Então, acho que o partido do presidente, convocando um ministro, não leva alugar nenhum. Melhor atravessara rua, sentar e conversar.

No Senado, Major Olímpio encaminhou dois ofícios ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, reclamando de suposta “perseguição a militares estaduais” pelo secretário nacional de Segurança Pública (Senasp), Guilherme Theophilo.

No texto, Olímpio diz que o secretário “carece de qualificação para o exercício de tão importante mister da Segurança Pública do Brasil”. Em outro ofício, os deputados Guilherme Derrite (PP-SP), Capitão Alberto Neto (PRB-AM), Sargento Fahur (PSL-RJ), Policial Katia Sastre (PR-SP) e Daniel Silveira (PSL-RJ) acusam Theophilo de “insegurança”, falta de “postura”, “compostura”, “inteligência emocional” e “estratégia”.

Os parlamentares se dizem insatisfeitos com relatos de uma reunião em 9 de maio, entre o secretário e funcionários da Senasp,“comoú nico propósito de afirmar que os policiais militares estavam querendo‘ derrubá-lo’ do cargo ”. Olímpio acrescenta que Theophilo o acusou de fazer parte do movimento.Nos dois ofícios, os parlamentares reclamam de suposta falta de representação de militares estaduais na pasta.

“Ele (Onyx) vai ter que dizer quais líderes queriam levar vantagem. Ou pede desculpa e diz que falou asneira

Delegado Waldir, líder do PSL na Câmara

(Guilherme Theophilo) “carece de qualificação para o exercício de tão importante mister da Segurança Pública”

Major Olímpio, líder do PSL no Senado

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Militares e ‘ideológicos’ acirram disputa pela comunicação

Jussra Soares

Gustavo Maia

Jailton de Carvalho

16/05/2019

 

 

Santos Cruz vira pivô de intriga; excluído de viagem, Rêgo Barros é novo alvo

A disputa entre as alas ideológica e militar do governo Jair Bolsonaro tem como pano de fundo o controle do discurso e da estratégia de comunicação do Palácio do Planalto. Auxiliares do presidente ligados ao ideólogo Olavo de Carvalho afirmam que militares são um entrave para posições mais “conservadoras e de direita” do Executivo e promovem uma ofensiva para desgastar o grupo de generais. Os militares, por sua vez, prometem resisti renão ceder a qualquer radicalismo.

O último alvo dos olavistas foi o ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz, chefe da Secretaria de Governo, pasta a qual está subordinada a Secretaria de Comunicação (Secom), chefiada por Fábio Wajngarten. O próximo adversário já foi escolhido: o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros.

Nos bastidores, integrantes do grupo comemoraram o fato de Rêgo Barros, que também é general do Exército, ter ficado de fora da viagem de Bolsonaro aos EUA. No lugar, embarcou Wajngarten, que disputa o controle do relacionamento com a imprensa com o porta-voz e é desafeto de Santos Cruz.

Os militares, em outra frente, defendem a moderação ao afirmar que têm no “centro” a sua virtude e não cederão à pressão para tomar posturas consideradas por eles radicais. Segundo fontes ligadas às Forças Armadas, uma mudança de conduta só será avaliada diante de uma determinação expressa do presidente, que até o momento não tomou partido publicamente na briga.

Conversa no whatsapp

Internamente, no entanto, Bolsonaro estaria emitindo sinais de “irritação” com a reação em grupo dos militares às críticas de Olavo de Carvalho, que comandou os disparos contra Santos Cruz e o vice-presidente Hamilton Mourão. De acordo com auxiliares do presidente, Bolsonaro teria aumentado seu descontentamento ao ver a imagem de uma conversa por Whatsapp, supostamente escrita por Santos Cruz, na qual o ministro o chamaria de “imbecil” e sinalizaria aprovar a “solução Mourão”.

Ao GLOBO, o ministro negou ser autor das mensagens. Ainda assim, segundo um interlocutor de Bolsonaro, o presidente estaria incomodado com o auxiliar. Dois motivos, no entanto, protegem Santos Cruz. O primeiro deles é que o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, entrou em cena e está tentando achar uma saída para o impasse. Heleno é, hoje, o único militar do alto escalão que Bolsonaro escuta e em quem confia plenamente.

O outro motivo é de natureza política. Bolsonaro não quer melindrar ainda mais parte do PSL simpática a Santos Cruz, num momento de fragilidade do governo no Congresso. Bolsonaro sabe que uma eventual demissão de Santos Cruz é explosiva e poderia tornar ainda mais explícitos os entraves nas relaçõescada vez mais tensas que mantém com boa parte do núcleo militar do governo.

Ontem, Santos Cruz se fortaleceu. Um decreto de Bolsonaro conferiu à Secretaria de Governo, chefiada pelo militar, a atribuição de avaliar indicações para postos de segundo e terceiro escalão, reitores de instituições federais de ensino e para funções no exterior. O decreto entra em vigor em 25 de junho.

Um dia antes, na terça-feira, Bolsonaro se reuniu na com Santos Cruze Heleno. Na conversa, segundo um auxiliar do presidente, ele pediu para os ministros “aprenderem a engolir sapo, serem mais políticos e menos militares e entenderem que o governo é de direita e que ele pretende levar adiante todas as pautas que o elegeram”. Heleno conseguiu depois que Santos Cruz integrasse a comitiva presidencial na viagem a Dallas.