O globo, n. 31328, 16/05/2019. Economia, p. 15

 

Piora nas projeções de crescimento

Cássia Almeida

Martha Beck

Daiane Costa

16/05/2019

 

 

 Recorte capturado

Prévia do PIB traz queda de 0,68%, e analistas veem saída por corte nos juros

A divulgação do indicador de atividade do Banco Central (IBC-Br) mostrando queda de 0,68% no Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre levou a uma nova rodada de cortes nas projeções de como vai ser o desempenho na economia brasileira este ano. Há previsões de até 0,8%, como a do BNP Paribas, inferior a o 1,1% registrado em 2018. Com essa estagnação, o risco de nova recessão cresce, afirmam economistas. O corte de juros é um caminho apontado por analistas, que julgam que a taxa ainda estaria alta para fazer a economia crescer. Alguns defendem uma Selic de 5,75% no fim deste ano.

Já o governo avalia que não há bala de prata para reanimar a atividade acurto prazo e aposta nas reformas, especialmente na da Previdência, para fazer o PIB reagir. Enquanto isso, no entanto, prepara um plano para melhorar o ambiente de negócios. Mais de 40 ações estão sendo tocadas pelo Ministério da Economia. Responsável por cer cade 20 delas, o secretário de Política Econômica da pasta, Adolfo Sachsida, afirmou que o principal plano é aprimorar o mercado de crédito. O conjunto de medidas, cujo nome é inspirado na política liberal do governo Ronald Reagan, se chamará “Economia pelo lado da oferta ”. Ele inclui ações para reduzira rigidez do mercado e melhoraras garantias.

—Um proprietário rural hoje pode tomar um empréstimo de R$ 100 mil para comprar insumo sedar sua propriedade,que vale R $1 milhão, como garantia. Mas essa propriedade não pode ser dada como garantia em mais nada. Por que não? Isso tem que ser aperfeiçoado —disse Sachsida.

Também estão nos planos mudanças na tributação de debêntures incentivadas (que financiam empreendimentos em infraestrutura), de modo que o benefício do imposto seja dado a quem emite e não a quem compra esses papéis

— Hoje, o incentivo tributário está na ponta errada. Tem muita pessoa física entrando nisso, quando o ideal é que as empresas cresçam —comentou o secretário.

Risco de recessão

Além disso, o governo quer colocar em prática um fundo de aval fraterno para o setor rural, no qual pequenos produtores possam tomar financiamentos de forma solidária. Outra frente é aprimorar a utilização das regras de patrimônio de afetação (quando o patrimônio do fundo fica separado do da empresa) para fundos de Previdência.

— São medidas que não estimulam artificialmente a demanda, como ocorreu em governos anteriores. Isso jogou o Brasil na recessão. São medidas que melhoram o ambiente de negócios sem onerar os cofres públicos. É uma política liberal pró-mercado —afirmou Sachsida.

Em relatório, o Banco Fator informa que espera dois cortes na Taxa Selic, que encerraria 2018 em 6%.“Aquedados juros, caso repassada pelo sistema bancário, pode ajudar empresas ase refinanciarem e melhorarem seus balanços, ajudando na recuperação de alguma confiança ”, afirma o texto.

O Itaú Unibanco revisou a projeção para o PIB de 2019 de 1,5% para 1% e prevê queda de 0,2% no primeiro trimestre. Também reviu o desempenho de 2020 de 2,5% para 2%. Segundo Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco, os juros reais estão em um nível (6,5% ao ano) que não estimula a economia. Por isso, prevê corte de 0,75 ponto percentual na taxa Selic, que cairia para 5,75% até o fim do ano. Mas ele só vê queda dos juros a partir de setembro, após a aprovação da Previdência.

Barbosa considera boa a medida provisória da liberdade econômica, lançada no início deste mês pelo governo eque retira entraves à abertura de negócios, mas diz que os efeitos são de longo prazo:

—São medidas importantes, mas os impactos são de longo prazo. Não há uma medida de curto prazo que resolva as questões como um passe de mágica. É um pouco de tudo, aprovação da reforma (da Previdência), que aumenta a confiança; corte de juros, que ajuda o crédito.

Já Zeina Latif, economista chefe da XP Investimentos, não acredita em estímulo vindo de juros menores. Diz que os cortes feitos — a taxa caiu para menos da metade desde outubro de 2016, quando estava em 14,25% —não surtiram o efeito desejado na economia. E diz que é necessário melhorara articulação política para reduzira incerteza:

—Mesmo que o Banco Central encontre espaço para cortar juros, não vai ativar muito a economia. Ajudaria mui tose o governo se mostrasse mais focado. Estamos num momento de ajuste fiscal, e o presidente Jair Bolsonaro fala em corrigir a tabelado Imposto de Renda e aumentar as deduções de saúde e educação, enquanto o governo pede ao Congresso mais recursos para pagar os benefícios.

Erros que são cometidos no lado da política minam a confiança do empresário.

Segundo Zeina, o quadro é de estagnação, mas o risco de recessão não está afastado:

—O crescimento vai ser inferior ao do ano passado. O risco de recessão é concreto. Com crescimento tão baixo, a economia fica muito vulnerável a acidentes de percurso.

Segundo Sachsida, as políticas em estudo terão efeito gradual no desempenho da economia e na geração de empregos.

“Mesmo quem tem emprego consome como se estivesse desempregado, porque não sabe o dia de amanhã. Se liberar PIS/Pasep e FGTS, as pessoas vão pagar dívida ou economizar”

Luís Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil

“São medidas que não estimulam artificialmente a demanda, como ocorreu em governos anteriores. Isso jogou o Brasil na recessão”

Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica

“O crescimento vai ser inferior ao do ano passado. O risco de recessão é concreto. Com crescimento tão baixo, a economia fica muito vulnerável a acidentes de percurso”

Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimento

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Liberar FGTS e PIS/Pasep teria um efeito reduzido

Daiane Costa

Cássia Almeida

16/05/2019

 

 

Incerteza tende a levar trabalhador a poupar o dinheiro em vez de consumir. Economista sugere antecipar 13º do Bolsa Família

O governo tem falado em liberar recursos das contas inativas do FGTS e do PIS/ Pasep para ativar a economia, como fez o governo Michel Temer. O economista chefe do Banco ABC, Luís Otávio Leal, porém, diz que, mesmo com essas medidas, a economia não vai deslanchar sem a aprovação da reforma da Previdência:

—Como sua aprovação (da reforma da Previdência) ficou para o segundo semestre, a expectativa de retomada foi jogada para 2020. Essas medidas até podem ajudar, mas primeiro é preciso ultrapassar a montanha da reforma.

Segundo o economista, nesse cenário de incerteza, o empresário não investe nem contrata, e o consumo cai.

— Mesmo quem tem emprego consome como se estivesse desempregado, porque não sabe como será o dia de amanhã. Se liberar recursos do PIS/Pasep e do FGTS, as pessoas vão usar para pagar dívida ou vão economizar. E isso não movimenta a economia. Para Silvia Matos, da Fundação Getulio Vargas (FGV), a liberação de FGTS teve pouco impacto no PIB em 2016, mas fez subir o consumo das famílias:

—O consumo cresceu 1,4%, mas são medidas paliativas. O que está preocupando mais é a falta de confiança de que o governo vai tomar as rédeas do que está acontecendo. O governo está sem rumo.

O economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social, afirma que mais eficiente que liberar o FGTS é aumentar o Bolsa Família:

—O FGTS tem um quarto do impacto que tem o Bolsa Família na economia. O governo já anunciou 13º salário para os que ganham o benefício. Poderia antecipar esse dinheiro. Se o real estiver na mão do mais pobre, ele vai consumir mais.

Segundo Neri, a extrema pobreza cresceu 23% em 2015 e voltou acrescer 17% em 2017, quando a economia estava tentando se recuperar.

— Precisa ser feito um ataque frontal em todos os momentos à extrema pobreza.Is sovai ajudara economia. A desigualdade aumentou, oque joga areia nas engrenagens da economia.

O economista Marcelo Kfouri, professor da USP, diz que acalmar o ambiente políticoéimp rescindível para a economia voltar acrescer:

— É mais uma questão de não fazer do que fazer. Não gerar tanta crise e sair da frente para o setor privado produzir. A economia voltaria a funcionar senão vivêssemos um acrise atrás da outra. Isso cria muita insegurança. O poder no Brasil é dividido com o Congresso. A capacidade de ação depende de negociação.