Valor econômico, v.19, n.4653, 19/12/2018. Brasil, p. A2

 

Mudança no sistema de pagamento põe fim às 'pedaladas', diz Mansueto 

Ribamar Oliveira 

19/12/2018

 

 

O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, anunciou ontem uma mudança na sistemática de pagamentos de despesas da União que, na prática, acabará com as chamadas "pedaladas fiscais".

O pagamento das despesas será feito no mesmo dia em que o Tesouro emitir a ordem bancária aos beneficiários dos recursos. Assim, a quitação ocorrerá pelo sistema D+0.

Até agora, levava entre dois e seis dias para o dinheiro de pagamento de despesas do Tesouro cair na conta bancária do beneficiário, depois de emitida a ordem bancária. O sistema funcionava, na prática, como D+2 ou até mesmo D+6.

A sistemática atual permitia ao governo adiar o pagamento efetivo de uma despesa, emitindo uma ordem bancária no último dia do ano ou do mês. Assim, a despesa só impactava o caixa do Tesouro no primeiro dia útil do exercício seguinte ou no mês seguinte, melhorando artificialmente o resultado primário do ano ou do mês.

Deu-se o nome de "pedalada fiscal" a essa prática, que foi denunciada pela primeira vez pelo Valor , no início de 2014. Embora tenha sido adotada por outros governos no passado, o uso desse expediente se intensificou no governo Dilma Rousseff e foi uma das razões apontadas para o impeachment da ex-presidente.

"Vamos ganhar muito em transparência, pois não haverá mais diferença entre os dados do resultado do Tesouro e os do Siafi [sistema eletrônico que registra todas as despesas e receitas da União]", explicou Mansueto. Os dados do resultado do Tesouro refletem o impacto sobre o caixa, ou seja, os pagamentos efetivos. Os dados do Siafi se referem às ordens bancárias. Com a nova sistemática, não haverá mais a diferença entre a emissão da nota bancária e o impacto na conta única (pagamento efetivo), pois todos os dois eventuais acontecerão no mesmo dia.

Segundo Mansueto, o novo sistema vai proporcionar uma economia de R$ 35 milhões para o Tesouro, por meio da melhora na utilização dos recursos da conta única. Os recursos não ficarão mais depositados por alguns dias no Banco do Brasil, agente financeiro do Tesouro, antes do pagamento efetivo, como ocorre atualmente.

A nova sistemática abrirá, também, um espaço adicional de R$ 32,9 bilhões no teto de gasto da União de 2018. Isto ocorrerá porque para calcular o teto de gastos o governo utiliza o critério da ordem bancária, e não do pagamento efetivo.

Todo fim de ano, pela sistemática atual, o governo emite uma quantidade considerável de ordens bancárias para pagar benefícios previdenciários e pessoal da União, mas o pagamento efetivo só ocorre no exercício seguinte. Inicialmente, estava programada para este mês de dezembro a emissão de ordens bancárias para pagar despesas com benefícios previdenciários e com pessoal no montante de R$ 32,9 bilhões que só seriam efetivamente pagas em janeiro do ano que vem.

Com a nova sistemática adotada pelo Tesouro, que entrará em vigor a partir do próximo dia 1º de janeiro, as ordens bancárias no valor de R$ 32,9 bilhões não serão mais emitidas neste mês, mas sim em janeiro de 2019, com o respectivo pagamento sendo feito pelo sistema D+0. Assim, o teto de gastos de 2018 ficará com uma "margem" de R$ 32,9 bilhões. Isto não ocorrerá mais a partir de 2019, como explicou Mansueto, porque já no próximo ano a emissão de ordens bancárias e o pagamento efetivo ocorrerão na mesma data.

Mansueto garantiu, porém, que o espaço aberto no teto de gastos não vai ser usado para mais despesas. "Não será gasto um centavo a mais", afirmou. Segundo o secretário do Tesouro, as mudanças foram negociadas com o Tribunal de Contas da União (TCU) e com a Controladoria-Geral da União (CGU). "As alterações foram mantidas em segredo para evitar pressões por mais gastos", disse o secretário.

A nova sistemática de pagamento do Tesouro resultará em um aumento do montante de restos a pagar processados em 2018, que serão inscritos no Orçamento de 2019. As despesas com benefícios previdenciários e com pessoal, no montante de R$ 32,9 bilhões, serão empenhadas (ou seja, autorizadas) e liquidadas, mas a emissão de ordens bancárias e os pagamentos só serão feitos em janeiro do próximo ano. Assim, essas despesas se tornarão restos a pagar em 2019.

O secretário explicou ainda que não haverá impacto no resultado primário do governo.