Título: CPI mira patrimônio de laranjas de Cachoeira
Autor: Caitano, Adriana; Kleber, Leandro; Valadares, João
Fonte: Correio Braziliense, 17/09/2012, Política, p. 2

Parlamentares querem impedir que integrantes da quadrilha do bicheiro vendam imóveis comprados com o lucro da jogatina

Apesar de as atividades da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira estarem suspensas oficialmente até o primeiro turno das eleições, seus integrantes pretendem agir, ainda no início desta semana, para que os bens de parentes, empresas e laranjas ligados aos membros da organização criminosa do bicheiro sejam bloqueados. Reportagem do Correio publicada ontem revelou que José Olímpio de Queiroga Neto, um dos principais braços do esquema no Distrito Federal, preso pela Operação Monte Carlo em fevereiro, tenta vender o patrimônio da quadrilha às pressas, pela metade do preço de mercado, para voltar a ter recursos e, possivelmente, fugir do país. Queiroga está livre desde junho por força de um habeas corpus e atua para se livrar de imóveis comprados por meio de atividade ilícita nas regiões administrativas do DF e cidades do Entorno.

Na reportagem de domingo, o Correio relatou a ação de corretores para vender, por exemplo, um terreno em Santa Maria por R$ 1,5 milhão, já com alvará de construção e preço estimado de R$ 3 milhões. "Tá mais barato porque o cara tá precisando de dinheiro, acabaram com a fonte de lucro dele", contou um corretor, citando o comparsa de Cachoeira. O lote está em nome da MZ Construtora Ltda., apontada pela Polícia Federal como um canal para "movimentar ou fazer trânsito do dinheiro arrecadado com os jogos de azar no interesse e na manutenção da estrutura criminosa organizada" e de propriedade de Diego Wanilton da Silva Queiroga e Fernanda da Silva Queiroga, filhos de José Olímpio de Queiroga Neto. "Essa corrida para vender é um sintoma de que a parte financeira da organização está sendo estrangulada, ninguém vende um terreno pela metade do preço assim", comenta o vice-presidente da CPI, deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

O petista é um dos parlamentares que defendem a indisponibilidade dos bens de laranjas e empresas ligadas ao contraventor. "O Correio aponta um novo braço do esquema e contribui para cercar a organização. Vou conversar com o presidente da CPI (senador Vital do Rêgo, do PMDB-PB) para que solicitemos à Justiça esse bloqueio até o fim das investigações", anunciou o deputado. Em 12 de maio, o Tribunal de Justiça do DF reteve os bens dos integrantes da organização de Cachoeira e quebrou os sigilos bancário e fiscal do contraventor e da Delta Construções. No entanto, nada havia sido feito em relação às empresas cujos donos têm relação com a quadrilha.

Na última reunião administrativa da CPI, alguns parlamentares pediram a aprovação do requerimento da quebra de sigilo de 12 empresas fantasmas que teriam recebido R$ 421 milhões da Delta. No entanto, o pedido não chegou a ser votado. "A reportagem do Correio agora mostra que o receio do relator (deputado Odair Cunha, do PT-MG) de quebrar o sigilo dessas empresas é injustificável, pois ficou muito claro que, por meio das empresas laranjas, o fluxo do dinheiro era muito maior que o oficial da organização", destaca o deputado Carlos Sampaio (PSDB-PR), integrante do colegiado. Ele afirma que vai acionar o departamento jurídico do partido hoje para instar o Ministério Público a solicitar à Justiça o bloqueio dos bens de parentes e laranjas dos membros da quadrilha.

Polícia O chefe da Delegacia de Combate ao Crime Organizado (Deco) da Polícia Civil do DF, delegado Henry Peres, responsável pela Operação Jackpot, que apontou o envolvimento direto do bicheiro Carlinhos Cachoeira na migração do jogo ilegal do Entorno para Brasília, disse que a comercialização dos terrenos do bicheiro pode ser investigada por órgãos federais. Segundo ele, as vendas dos lotes em nome de terceiros podem ser apuradas pela Polícia Federal, no âmbito da Operação Monte Carlo, e pela Justiça Federal em Goiás, onde tramita o processo.

O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que também compõe a CPI, diz acreditar que o próprio MP vai tomar alguma atitude diante das revelações do Correio. "Como o MP está atuando nos inquéritos sobre o caso, pode fazer isso de imediato e de forma mais direta, o que dá mais velocidade à decisão do juiz de conceder facilmente uma liminar nesse sentido. Mas, se isso não ocorrer, nós, parlamentares, podemos fazer uma petição para que o órgão tome essa iniciativa", argumenta.

Ainda nesta semana, a CPI deve compartilhar documentos sobre as investigações do esquema criminoso com o Ministério Público de Goiás. "O MP está fazendo uma triagem sobre o que é mais importante. Nós conseguimos quebrar sigilos que eles não conseguiram, então temos muito a contribuir", ressalta Miro Teixeira. "Tenho a convicção de que, diante dos dados novos revelados pelo Correio e dos documentos a que terá acesso, o Ministério Público avançará mais nas investigações e vai fazer o que a CPI se recusou quando suspendeu seu dever de investigar", acrescenta o senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP).