Valor econômico, v.19, n.4680, 31/01/2019. Brasil, p. A2

 

País quer ênfase econômica na relação com Brics e deixar a geopolítica de lado 

Assis Moreira 

31/01/2019

 

 

O governo de Jair Bolsonaro quer dar ênfase eminentemente econômica ao grupo Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) a partir de agora, sem busca de alinhamento ou articulação geopolítica, segundo fontes próximas da visão de Brasília.

Por sua vez, a orientação é de aproximar posições com os Estados Unidos onde puder e ser suficientemente pragmático para evitar acirramento de eventuais discordâncias com Washington.

O acompanhamento do Brics será feito a partir de agora pela Secretaria de Política Externa Comercial e Econômica, pela nova estrutura do Itamaraty.

Fontes em Brasília não descartam choques com a China e a Rússia agora por questão de valores como a democracia, por exemplo no caso da Venezuela.

A coordenação na área econômica também tem seus limites. A China sempre defende um acordo de liberalização comercial no grupo, algo que o Brasil e a Índia descartaram até agora, pelo evidente temor que a competitividade chinesa provoca nas indústrias locais.

Até o ano passado, as reuniões ministeriais do Brics cobriam um crescente número de temas e busca de posições comuns.

Em setembro, os ministros das Relações Exteriores do bloco realizaram uma reunião à margem da 73ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, quando trocaram pontos de vista sobre questões de importância global nos âmbitos político, de segurança, econômico, financeiro e de desenvolvimento sustentável.

Os ministros defenderam uma reforma ampla da ONU, incluindo seu Conselho de Segurança. Sublinharam a necessidade de continuar a trabalhar em conjunto nas áreas de desarmamento, prevenção de uma corrida armamentista no espaço exterior e de enfrentar os desafios à segurança e estabilidade internacionais por meios políticos e diplomáticos.

Prometeram fazer esforços coordenados para combater o terrorismo sob os auspícios da ONU. Reiteraram que o status de Jerusalém era uma das últimas questões a serem definidas no contexto das negociações entre Israel e Palestina. Abordaram o conflito na Síria e reafirmaram seu apoio ao processo de paz e reconciliação nacional no Afeganistão "conduzido e liderado pelos afegãos". Defenderam a completa desnuclearização da Península Coreana para manter a paz e a estabilidade no nordeste da Ásia.

Sobre a mudança do clima, manifestaram vontade de continuar trabalhando construtivamente com outros países para concluir as negociações relacionadas ao plano no âmbito da convenção-quadro das Nações Unidas sobre mudança do clima (UNFCCC, na sigla em inglês).

Apoiaram a conclusão do Pacto Global para Migração Segura, que o governo Bolsonaro já abandonou. E reafirmaram na ocasião compromisso de fortalecer o papel dos países do Brics na governança global em saúde, especialmente na Organização Mundial da Saúde e nas Nações Unidas.

Agora, a nova postura do Brasil em relação ao Brics coincide com um ano em que o país vai sediar a cúpula do grupo em novembro, em Brasília. É também quando deve haver um debate sobre o Banco do Brics. Um brasileiro deve assumir a presidência do banco em 2020. Em 2021, o banco vai se transferir para sua nova sede, de 34 andares, em Xangai, ilustrando a ambição chinesa em relação à instituição.