Valor econômico, v.19, n.4680, 31/01/2019. Empresas, p. B4

 

Projetos de lei pós-Mariana são 'esquecidos' na Câmara 

Daniel Rittner 

31/01/2019

 

 

O lobby das mineradoras conseguiu deter o avanço de três projetos de lei que buscavam aumentar a responsabilidade das empresas pela segurança de barragens e agravar a punição por desastres ambientais. As propostas foram apresentadas em meados de 2016, após o rompimento da barragem da Samarco em Mariana (MG), como resultado dos trabalhos de uma comissão especial da Câmara formada por 18 deputados para acompanhar as investigações e as medidas adotadas pelos diversos órgãos públicos.

Nenhum dos projetos chegou ao plenário para votação. Todos seguem tramitando em comissões permanentes e chegaram ao fim da última legislatura sem manifestação conclusiva de seus relatores. Não há, portanto, qualquer perspectiva de aprovação.

Das três propostas, a mais enxuta é a que permite elevar em "até cem vezes" o valor máximo de multas aplicadas pela Lei de Crimes Ambientais (9.605/98) para desastres que causem "significativos danos humanos, materiais e ambientais" - em referência indireta aos acidentes com barragens. Hoje o limite permitido é de R$ 50 milhões por multa.

"O valor das cinco multas ambientais aplicadas [por causa da tragédia em Mariana], de R$ 250 milhões, seria equivalente a apenas 32 dias do lucro das atividades da Samarco", diz trecho do relatório final da comissão. No caso de Brumadinho, os autos de infração emitidos pelo Ibama contra a Vale somam a mesma cifra.

Outro projeto busca mudar a Política Nacional de Segurança de Barragens, instituída pela Lei 12.334/10, para tornar obrigatória a entrega de um "Plano de Ação de Emergência" para cada represa - independentemente do potencial de dano. O texto prevê que o PAE deve ser elaborado "com a participação de representantes das populações situadas a jusante da barragem", sirenes de alerta sejam instaladas nas comunidades para alertar sobre o risco de perigo e exercícios simulados sejam realizados periodicamente.

Para justificar a proposta, os deputados escreveram o seguinte: "Como muito bem demonstrado em alguns depoimentos já colhidos até o momento, não existe risco zero de vazamento ou rompimento da barragem, razão pela qual as comunidades situadas a jusante devem ser conscientizadas e treinadas para essa possibilidade, mesmo que remota".

O terceiro projeto apresentado pela comissão especial equipara a "resíduos perigosos", conforme definição da Lei 12.305 de 2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos) os rejeitos de mineração depositados em barragens que possam afetar alguma comunidade. A mudança de terminologia forçaria as mineradoras, por exemplo, a contratar seguro de responsabilidade civil para eventuais danos causados ao meio ambiente ou à saúde pública.

Com essa classificação, as empresas também ficariam obrigadas a adotar medidas para reduzir o volume e a periculosidade dos resíduos, além de terem que comprovar capacidade técnica e econômica para prover os cuidados necessários ao gerenciamento dos dejetos. Como os demais projetos, tramita em comissão e não tem qualquer perspectiva de votação no plenário da Câmara.

Nesta semana, o senador Otto Alencar (PSD-BA) informou que já existe acordo entre os parlamentares para reunir o número mínimo de 27 assinaturas para pedir a instalação de uma CPI no Senado sobre o desastre em Brumadinho.