Valor econômico, v.19 , n. 4666 , 11/01/2019/. Brasil, p. A2

 

'Vamos endurecer e mostrar quem manda', diz governador do Ceará

 

 

 

Marina Falcão

11/01/2019

 

 

 

No nono dia de ataques das facções criminosas, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou que não há a menor possibilidade de recuo em relação às mudanças que estão sendo promovidas no sistema prisional do Estado. "Vamos endurecer cada vez mais e mostrar que quem manda é o Estado", disse ontem ao Valor.

Em tom que se aproxima do usado pelo presidente Jair Bolsonaro, o governador petista, reeleito em primeiro turno com mais de 70% dos votos, disse que vai "tratar criminoso como criminoso", acabando com regalias nos presídios, comunicações ilegais e implementando disciplina e ordem.

Para o petista, o tema da segurança pública foi "comprado" nas últimas eleições. Na avaliação de Santana, a população cearense está apoiando a sua decisão de colocar ordem nos presídios, mesmo com medo diante da onda de ataques a prédios públicos e veículos.

"Essa questão não é do Ceará, é nacional, é algo que ultrapassou as divisas dos Estados. O crime organizado no Rio dá ordem aqui no Nordeste. O de São Paulo dá ordem na região Norte", disse.

O petista disse que cabe ao serviço de inteligência nacional avaliar se há risco de outros Estados serem contagiados pela crise. "Por isso é importante um sistema de inteligência integrado", afirmou. O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), já demonstrou preocupação ao solicitar o envio de um reforço da Força Nacional ao Estado.

"Nunca quis jogar a responsabilidade para a União, mas é preciso alguém coordenar as ações. Os Estados não podem nem legislar na área penal", disse Santana. Ele lembrou que, em 2016, aprovou uma lei obrigando as operadoras de telefonia a bloquear o sinal dos presídios, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não era competência dos Estados legislar sobre isso.

Após quatro anos de investimentos na infraestrutura dos presídios do Estado, período no qual diz ter dobrado o número de agentes penitenciários, o governador avaliou que era chegada a hora de fazer valer a Lei de Execução Penal, uma decisão que define como "difícil". O petista iniciou o segundo mandato com uma secretaria exclusiva para administração penitenciária e nomeou o policial civil Luís Mauro Albuquerque para comandá-la. Ele é considerado o responsável por conseguir controlar a crise no presídio de Alcaçuz, no Rio Grande de Norte, em 2017, episódio em que morreram 26 presos.

As declarações do secretário, de que "não reconhece as facções" - e, portanto, os detentos não devem ser organizados conforme grupo criminosos dentro dos presídios - são consideradas o gatilho para a crise. No Ceará, as maiores facções hoje são o PCC, de São Paulo, o Comando Vermelho, do Rio, e a Guardiões do Estado (GDE), do Ceará.

O Estado, diz Santana, não foi pego desprevenido. "Sabíamos que haveria uma reação forte do crime nas ruas para tentar acuar as ações do Poder Público. Imediatamente, pedi ajuda da Força Nacional, conversei com o ministro Moro [Sergio Moro, da Justiça e da Segurança Pública] e da Defesa. Prontamente fui atendido."

Desde sábado a Força Nacional começou a agir no Estado, em ajuda aos 29 mil homens das forças de segurança cearense. Primeiramente, foram enviados pelo ministro Moro 300 homens. Dias depois, o número subiu para 406.

Da semana passada para cá, já foram transferidos 21 presos identificados como líderes para unidades federais e, nas próximas horas, devem ser remanejados mais 20, informou o governador.

As tropas federais e a ajuda das polícias de outros Estados, como Bahia, São Paulo, Santa Catarina, Piaí e Pernambuco, não foram suficientes para, até agora, conter completamente os ataques. Por questões estratégicas, a Secretaria de Defesa Social não está divulgando o número de ocorrências por dia.

Santana, no entanto, garantiu que há tendência de redução das ocorrências, que já somam em torno de 177 nos nove dias. "Chegamos a ter dia com 50 ocorrências. De ontem [quarta] para hoje [quinta], houve três até agora", disse. Até as 17h de ontem, 287 pessoas haviam sido presas acusadas de envolvimento nos ataques.