Valor econômico, v.19, n.4668, 15/01/2019. Brasil, p. A4

 

População envelhece depressa e pressiona contas dos Estados 

Arícia Martins 

15/01/2019

 

 

O rápido envelhecimento populacional no Brasil vai ganhar mais fôlego na próxima década, mudando a estrutura etária de localidades onde ainda há maior predomínio de jovens em comparação à média do país. Segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), o número de pessoas em idade ativa (de 15 a 64 anos) para cada idoso vai cair mais de 25% no Norte e no Nordeste de 2020 a 2030, enquanto, no Centro-Oeste, a retração será superior a 30%. Essa trajetória vai elevar o grau de dependência de quem gera renda e impor mais dificuldades na gestão orçamentária dos Estados.

Além de indicarem alta das despesas com Previdência, que já consome quase 40% da folha de pagamento na média dos governos estaduais, as estimativas apontam que a alocação de recursos públicos vai ficar mais ineficiente, porque os Estados precisam gastar mais com educação do que com saúde devido a vinculações constitucionais.

Estimados com base nas novas projeções de população do IBGE, os dados do órgão ligado ao Senado mostram que as outras três regiões vão se aproximar num curto período de tempo da demografia do Sul e do Sudeste, onde mais de 11% da população já é idosa - mais do que a média do país, de 9,8%. Na média dos três Estados da região Sul, haverá em 2020 seis pessoas em idade ativa para cada idoso com mais de 65 anos, menor razão de dependência do país. No Sudeste, essa relação será um pouco maior no próximo ano, de 6,3.

Dentro de dez anos, o contingente de pessoas em idade economicamente ativa vai encolher mais em todas as regiões. O recuo mais forte será no Sul, onde o número de pessoas em idade para trabalhar por idoso vai diminuir 32,7% entre 2020 e 2030, para 4,1. Em igual comparação, a queda será de 30,7% no Sudeste, região em que estão três dos entes federados com população mais velha do país: Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Entre eles, apenas São Paulo não está em colapso fiscal. Os outros dois Estados já têm déficit nas finanças públicas.

O Centro-Oeste também terá forte redução, de 31,5%, no número de pessoas em idade para trabalhar por idoso em uma década. Norte e Nordeste vão envelhecer em ritmo um pouco menor, mas também veloz. Mais jovem, a primeira região terá 8,6 pessoas em idade ativa por idoso em 2030, redução de 26,8% ante 2020. Para a média do Nordeste, a retração prevista é de 25,4%, para 5,8.

A quantidade de pessoas com mais de 65 anos no país deve mais do que triplicar em 2030 sobre 2000, para 30,5 milhões, observa Gabriel Leal de Barros, um dos diretores do IFI, movimento que reforça a urgência necessária para reformar a Previdência.

Nos Estados e municípios, entes em que parcela relevante do Orçamento é destinada ao pagamento de aposentadorias de servidores inativos, a existência de regimes especiais representa um fator adicional de pressão, afirma o pesquisador.

Além da questão previdenciária, o rápido ritmo de envelhecimento é igualmente importante para a gestão das contas públicas nos Estados, acrescenta Barros, uma vez que a velocidade de queda da população jovem será diferente entre eles. Em sua visão, os dados mostram que a já elevada rigidez orçamentária nas unidades da federação vai aumentar ainda mais caso sejam mantidas as atuais regras e vinculações.

Em especial, o diretor do IFI destaca a vinculação definida na Constituição de 1988 que obriga governos estaduais e prefeituras a gastarem no mínimo 25% da receita líquida de impostos em educação. Na saúde, o piso é de 12% para Estados e 15% para municípios. Quando a população envelhece, aumentam as despesas públicas com saúde e previdência, diz Barros. Já os gastos com educação seguem relevantes, mas não precisariam continuar crescendo no mesmo ritmo, uma vez que a demanda por ensino básico, por exemplo, num Estado já envelhecido será menor.

Se o mesmo gasto nominal em educação for mantido nos próximos anos, à medida que o contingente de crianças e jovens cair, o gasto per capita com alunos vai subir, aponta o diretor do IFI, enquanto o contrário vai ocorrer com os recursos destinados à população idosa na área da saúde. Por isso, afirma ele, não faz sentido manter as regras de vinculação iguais para todos os Estados. "Elas são ineficientes".

Secretário de Fazenda de Alagoas, George Santoro avalia que pisos definidos por lei para gastos em saúde e educação são importantes, mas pondera que os percentuais atuais têm que mudar. "O Brasil está mudando sua demografia completamente e é preciso refazer essas análises. Esses percentuais foram fixados há muito tempo", diz.

Segundo Santoro, os dados demográficos regionais são preocupantes principalmente devido à perspectiva de alta expressiva do gasto público com aposentadorias. Hoje, o déficit previdenciário no Estado é de R$ 1,2 bilhão, aponta o secretário, ou cerca de 15% da receita corrente própria estadual. Em Alagoas, a quantidade de pessoas em idade ativa por idoso deve recuar de 8,7 em 2020 para 6,4 em 2030, enquanto a proporção de idosos na população vai subir de 7,9% para 10,8% no período, calcula o IFI.

Para Ana Carla Abrão, sócia da consultoria Oliver Wyman, a velocidade de queda da proporção entre jovens e idosos mostrada pela instituição é surpreendente, sobretudo no Nordeste. "A taxa de envelhecimento brasileira é muito acelerada, principalmente se a compararmos com a de outros países, mas eu esperava uma diferença maior entre as regiões."

Ex-secretária de Fazenda de Goiás, Ana Carla afirma que, independentemente do aumento da idade da população, a vinculação de gastos gera ineficiências. "O que o envelhecimento faz é deixar ainda mais claro que a vinculação está descolada das reais necessidades de cada Estado", diz ela, para quem os mínimos constitucionais para gastos em determinadas áreas deveriam ser derrubados. "O correto é exigir que Estados e municípios tenham um planejamento."