Valor econômico, v.19, n.4668, 15/01/2019. Empresas, p. B1

 

Petrobras terá chairman militar

André Ramalho 

Rodrigo Polito 

Juliana Machado 

Rita Azevedo 

15/01/2019

 

 

O governo Jair Bolsonaro iniciou o processo de renovação do conselho de administração da Petrobras, ao indicar, ontem, três novos membros para o colegiado. O almirante Eduardo Leal Ferreira foi o escolhido para a presidência do conselho. Já o ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP) John Forman e o ex-presidente da Claro João Cox se juntam ao grupo de conselheiros independentes indicados pela União.

Os militares voltam ao conselho da Petrobras depois de quase quatro anos. O último representante havia sido o general Francisco Albuquerque, que integrou o colegiado de 2007 a 2015, durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

Com os novos nomes, o governo renova três dos oito assentos indicados pela União como acionista controlador. O trio formado por Ferreira, Forman e Cox ocupará as vagas abertas desde a renúncia de Luiz Nelson de Carvalho, ex-presidente do colegiado, e de Francisco Petros Papathanasiadis, no dia 1º de janeiro. Ontem, Durval Soledade também confirmou sua saída.

A estatal disse que manterá o percentual mínimo de 40% de membros independentes no seu conselho

Entre analistas, a indicação do almirante foi recebida com ressalvas. Segundo duas fontes que preferiram manter o anonimato, o impacto sobre as ações da companhia é limitado, por ora, mas o nome de Ferreira lança dúvidas sobre até que ponto o governo - por meio dos militares - terá algum tipo de ascendência sobre a gestão da estatal. Na visão dos especialistas, a indicação sugere, em algum grau, uma influência do ministro de Minas e Energia, o almirante Bento Albuquerque, na Petrobras.

A escolha de um militar para o posto de chairman se dá em meio a um momento sensível envolvendo a relação de independência entre o conselho e o governo. Conforme publicado pelo Valor, o novo comando da estatal estaria pressionando pela saída dos conselheiros Segen Estefen e Durval Soledade Santos, de forma a abrir caminho para que o governo indique novos nomes para o colegiado.

O conselho da Petrobras é estratégico para o novo governo, já que o órgão será responsável por opinar sobre a negociação com a União sobre a revisão do contrato da cessão onerosa. O Valor apurou que, diante da crise fiscal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer reduzir ao máximo o valor a ser pago à estatal.

Quanto ao impacto nas ações, analistas acreditam que as mudanças terão efeito limitado na B3. Ontem, os papéis ordinários da empresa fecharam com queda de 0,35% (R$ 28,40) e as PN recuaram 0,56% (R$ 24,85). Analistas explicam que o rumo das ações da Petrobras é ditado hoje, principalmente, pelo preço do barril. Para Gustavo Allevato, do Santander, as mudanças no conselho só se refletirão negativamente nas ações se houver uma guinada no perfil de gestão independente da empresa.

"Podemos falar de cessão onerosa, de mudança no conselho, de qualquer coisa. No fim das contas, a companhia negocia petróleo e é fundamentalmente isso que irá afetar o preço", afirma Luiz Carvalho, analista do UBS. "É claro que a revisão do contrato da cessão onerosa e a continuidade da governança são importantes, mas isso vem sendo precificado desde 2016. O efeito é menor", completa.

Já o especialista André Hachem, do Itaú BBA, destaca que a venda de ativos é outro importante elemento a ditar a rentabilidade das ações. "Com a esperada continuidade na venda de ativos, temos uma perspectiva bastante favorável para a empresa", afirma.

Historicamente, a Petrobras já viveu momentos em que o governo e a presidência do conselho eram alinhados. Entre 2003 e 2010, Dilma foi presidente do conselho ao mesmo tempo em que chefiava o MME e, posteriormente, a Casa Civil. No fim do governo petista, já na esteira da Operação Lava-Jato, iniciou-se, no entanto, uma tentativa de fortalecer a presença de membros independentes, sem a influência política, no conselho da petroleira. Em 2015, o colegiado foi então renovado. Murilo Ferreira, ex-presidente da Vale, assumiu a presidência do conselho na gestão de Aldemir Bendine, e os membros indicados pela União foram mudando de perfil: no lugar de ex-ministros, conselheiros independentes passaram a ser indicados pelo acionista controlador.

A Petrobras esclareceu que manterá o percentual mínimo de 40% de membros independentes no conselho, como manda o seu estatuto social. A estatal também informou que as indicações serão submetidas aos seus procedimentos de governança corporativa.

A petroleira destacou ainda que Leal Ferreira "foi treinado e teve suas capacidades de liderança, gestão e visão estratégica testadas e aperfeiçoadas ao longo de muitos anos de experiência". O almirante foi Comandante da Marinha do Brasil até a semana passada e tem nível superior por instituições como a Escola Naval, a Escola de Guerra Naval do Brasil e a Academia Naval de Annapolis, dos EUA.

Cox é um nome bem avaliado no mercado. Foi presidente da Claro e conselheiro da Tim, Embraer e Braskem. Já Forman é um geólogo renomado no setor de óleo e gás. Sobre ele pesa uma condenação pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em 2016, ele foi condenado a pagar R$ 338,5 mil, por uso de informação privilegiada, mas até hoje a multa não foi quitada.

O caso envolve a venda de ações da HRT (atual PetroRio) em 2013, quando Forman era conselheiro da empresa. A CVM constatou que ele e Antônio Carlos de Agostini, outro ex-administrador da HRT, negociaram ações da companhia antes da divulgação de fatos relevantes relacionados à exploração na Namíbia. Após recursos em âmbito administrativo, eles entraram na Justiça contra a CVM e a União. O caso ainda será julgado. "O processo [na CVM], que atingiu várias pessoas, foi baseado em informação relevante que nunca existiu, afirmou Forman, ao Valor.

Em nota, a CVM informou que irá "adotar as medidas necessárias para a cobrança do valor devido".

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Na Marinha, avanços com menos recursos 

João Luiz Rosa 

15/01/2019

 

 

Indicado à presidência do conselho da Petrobras, o almirante de esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira, de 66 anos, conduziu ações para modernizar a Marinha durante os quase quatro anos em que comandou a força, entre fevereiro de 2015 e a semana passada, com um orçamento decrescente.

Foi sob o comando de Leal Ferreira que a Marinha lançou ao mar, no mês passado, o "Riachuelo", primeiro dos cinco submarinos previstos sob um acordo firmado com a França em 2008. Os quatro primeiros serão convencionais. O último, ainda sem data para ficar pronto, terá propulsão nuclear.

Casado, pai e avô, Leal Ferreira também fez avançar o programa nuclear da Marinha, que prevê a construção de dois reatores. O primeiro, a ser instalado em Iperó (SP), é o protótipo do sistema que será embarcado no submarino nuclear, o "Álvaro Alberto".

A renovação da frota de guerra foi outra providência. Em setembro do ano passado, em entrevista ao Valor, Leal Ferreira disse que estavam praticamente garantidas as fontes de recursos para construir quatro corvetas. As embarcações, explicou, serão construídas por estaleiros brasileiros. "A ideia é sempre construir no Brasil. Pagamos um preço por isso", disse. "Sai mais barato comprar fora. Mas faz parte do projeto de país ter uma indústria aqui. Isso nos dá uma independência logística muito grande."

O Prosub, de submarinos, reúne 52 companhias de diversas áreas. O programa nuclear ou PNM, mais de uma centena delas.

Historicamente, o setor de defesa estimula a indústria de tecnologia, disse Leal Ferreira. No Brasil, ele citou como exemplos a Embraer, estimulada pela Força Aérea, e a Cobra, de computadores, que recebeu apoio da Marinha. "A própria [criação da] Petrobras foi uma pressão muito grande dos militares", afirmou.

Entre 2013 e 2018, o orçamento anual da Marinha encolheu 55%, para R$ 2,9 bilhões. "Até 2030, a Marinha vai perder 12 mil homens", disse o almirante, como forma de aliviar as despesas. Paralelamente, a Marinha reforçou a contratação de funcionários temporários. Em setembro, a força reunia 80,3 mil militares e mais de 4 mil civis.

Em novembro, a Marinha promoveu a engenheira Luciana Mascarenhas da Costa Marroni ao posto de contra-almirante. Ela é a segunda mulher a integrar o mais alto escalão das Forças Armadas. A primeira, também da Marinha, é a médica Dalva Maria Carvalho Mendes, promovida em 2012.